Biocompósito condutor de eletricidade PGS/PPy: síntese e caracterização

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Materiais

Autores

Sander, M.M. (UFRGS) ; Ferreira, C.A. (UFRGS)

Resumo

O poli (sebacato de glicerol) (PGS) é um polímero obtido de fonte renovável, derivado do óleo de mamona, com características elastoméricas quando curado. Já o polipirrol (PPy) é um polímero com a especial característica de conduzir eletricidade quando no estado oxidado, porém não apresenta boas propriedades mecânicas e de processabilidade. A mistura de ambos forma um biocompósito, que resulta em um filme flexível, maleável e capaz de conduzir eletricidade. Como ambos os polímeros são biocompatíveis e a condutividade obtida nos filmes é compatível com a condutividade do tecido cardíaco, é possível que ele seja um biomaterial para uso em aplicações médicas.

Palavras chaves

PGS; PPy; Biocompósito

Introdução

É crescente o estudo de materiais que podem ser utilizados em aplicações médicas, como, por exemplo, na reposição ou preenchimento de tecidos, dentes e ossos, em adesivos e na fabricação de fios de sutura. Dentre a gama de biomateriais, os polímeros e suas misturas se destacam. A chave para o sucesso desta aplicação é a biocompatibilidade, ou seja, o material, ou os produtos da sua decomposição, não podem provocar inflamação nos tecidos onde foram aplicados (NAIR; LAURENCIN,p. 762, 2007). O poli (sebacato de glicerol) – PGS – é um polímero biodegradável que vem sendo utilizado cada vez mais em aplicações biomédicas. Esse poliéster é preparado pela condensação de ácido sebácico e glicerol, ambos derivados do óleo de mamona. O PGS exibe biocompatbilidade e biodegradabilidade, características extremamente relevantes em aplicações biomédicas. Em função da natureza elastomérica e flexível do PGS, a aplicação biomédica encontra campo na substituição de tecidos moles, como em tecidos cardíacos, nervos, cartilagens e retina ( RAI et al.,p.1051, 2012). A possibilidade de variação na composição relativa dos monômeros e no processo de fabricação proporciona diversas possibilidades de aplicação, bem como o uso deste material como matriz em compósitos ou blendas poliméricas. Em algumas aplicações biomédicas, como em músculos cardíacos, por exemplo, é interessante que o material apresente características de condução de eletricidade. Estudos tem mostrado que o uso de materiais condutores na reparação de tecidos cardíacos melhoram a conexão de proteínas específicas das células responsáveis pelo sincronismo dos batimentos cardíacos. ( QAZI; RAI; BOCCACCINI, p.9068, 2014). Blendas poliméricas de PGS com polímeros condutores, como o polipirrol (PPy), por exemplo, mostram potencial aplicação neste campo. O PPy, por sua vez, pode ser obtido por síntese química ou eletroquímica. A polimerização química se dá pela oxidação do monômero pirrol com forte agente oxidante, como o cloreto férrico (FeCl3), em meio aquoso. A melhor relação rendimento e condutividade na polimerização é obtida em temperaturas baixas. O PPy também apresenta características de biocompatibilidade e estudos mostram aplicação em tecidos que respondem a estímulos elétricos, como no coração e em nervos (SHI et al., p.2477, 2004). Sendo assim, o objetivo deste estudo é desenvolver um compósito polimérico de PPy com matriz de PGS e caracterizá- lo quanto as propriedades térmicas, elétricas e de biodegradabilidade in- vitro.

Material e métodos

O PPy foi fabricado a 0 °C, numa solução aquosa contendo 0,06 mol de pirrol e 0,11 mol de cloreto férrico, sob agitação durante 6 h. Após lavagem e filtração, foi seco em estufa por 24 h. O PGS foi produzido pela reação equimolar do ácido sebácico e glicerol, em agitação magnética por 24 h a 130 °C, sob fluxo de nitrogênio nas primeiras 5 h. Os filmes foram confeccionados pela adição do PPy, na forma de pó fino, ao PGS (líquido viscoso a 130 °C) nas proporções de 1, 3 e 5%. Os sistemas foram mantidos em agitação por mais 1h. As misturas foram, então, vertidas em formas de silicone e curadas em estufa a vácuo, a 130 °C por 48h. Os filmes produzidos, nomeados PGS (controle), PGS/PPy 1%, PGS/PPy 3% e PGS/PPy 5%, foram caracterizados por calorimetria exploratória diferencial (DSC – calorímetro Q20 da TA Instruments) e termogravimetria (TA Instruments TGA- 50). Para avaliar a condutividade elétrica utilizou-se o método de 4-pontas, o qual é baseado na aplicação de corrente elétrica nas ponteiras externas, e a voltagem medida entre as ponteiras internas (Cascade Microtech CS 4-64, associado a uma fonte Keithley 2040). A degradação in-vitro foi realizada para verificar a perda de massa dos filmes de biocompósito e a mudança no pH das soluções de PBS nas quais os corpos de prova foram incubados. Foi utilizada solução tampão fosfato (PBS pH = 7,16) por 20 dias, sob agitação leve e temperatura de 37 °C. A pesagem dos corpos de prova (n = 2) foi feita nos dias 1, 7, 15 e 20, após secagem em estufa até peso constante.

Resultado e discussão

Os biocompósitos PGS/PPy formaram filmes pretos, muito flexíveis e pegajosos no contato com a pele, devido aos grupos carboxílicos não reagidos do glicerol que ficam livres na superfície do filme. O ensaio de DSC, representado pelo termograma na Figura 1, mostra um pronunciado pico endotérmico em torno de 3 °C, na rampa de aquecimento, tanto para o PGS puro, quanto para os biocompósitos. Este pico é associado a fusão da fase cristalina (T. HATAKEYAMA; F.X. QUINN, 2000), porém a rede elastomérica mantém-se sólida a temperatura ambiente pela formação das ligações éster cruzadas, dos grupos carboxílicos do ácido sebácico . Pelo mesmo termograma observa-se em torno de -25 °C uma transição de primeira ordem compatível com o sinal de transição vítrea (Tg). Esta transição não fica evidente no termograma, porém por análise dinâmico mecânica (não mostrada neste trabalho) é possível verificar que não há mudança no valor da temperatura da Tg da matriz PGS quando o PPy é incorporado, indicando que os polímeros são compatíveis. Não há uma mudança significativa no padrão térmico dos biocompósitos quando comparados com o PGS puro. Verifica-se, dessa forma, que a adição do PPy não teve influência nas transições térmicas dos biocompósitos, possivelmente por se tratar de um polímero amorfo. Pela análise termogravimétrica foi possível identificar que os biocompósitos são estáveis até 400 °C, sendo sua decomposição um evento único, a partir de 420 °C. O PPy sintetizado apresentou condutividade de 4,6x10-2 S/cm. Já os biocompósitos apresentaram condutividade na ordem de 10-5 S/cm, sendo o melhor resultado para a amostra com 3% PPy incorporado. Este valor é compatível com aplicações médicas que necessitam de condutividade elétrica, como em tecidos cardíacos, por exemplo. A condutividade do miocárdio varia de 1,6x10-4 S/cm (longitudinal) a 5x10-5 S/cm (transversal às fibras do músculo) (ROBERTS-THOMSON et al., p. 587, 2009). Diversos autores mostraram em seus trabalhos que tanto o PGS quanto o PPy são biocompatíveis (GEORGE et al., p. 3511, 2005; RAI et al., p. 1051, 2012). Dessa forma, é possível que os biocompósitos PGS/PPy tenham potencial aplicação na área médica. É objeto futuro deste estudo verificar a viabilidade técnica da utilização como biomaterial. Os valores das porcentagens de perda de massa e a variação do pH verificados no ensaio de degradação in-vitro são mostrados na Figura 2. Em comparação com o PGS puro, verifica-se que a adição de PPy aumenta a perda de massa dos biocompósitos, embora a relação de quantidade de PPy na mistura com a porcentagem de perda de massa não seja linear. Ao final de 20 dias de incubação o filme com 3% de PPy perdeu 13,7% de massa, enquanto a mistura contendo 5% perdeu 22,6% de massa. Em comparação com o PGS puro, que perdeu 12,6% de massa no mesmo período, o aumento da perda para PGS/PPy 3% é pouco expressivo. Foi mensurado o pH das soluções de PBS no início do período de incubação (dia 1) e ao final (dia 20). Todas as amostras apresentaram redução do valor de pH, tornando o meio mais ácido. Porém as amostras com PPy tiveram uma redução menor de pH que do PGS puro. É possível que monômeros não reagidos, principalmente de ácido sebácico, estejam presente nas amostras e acabam migrando para as soluções de PBS, baixando o pH dos meios. Este fator pode interferir na biocompatibilidade do material, pois as células são sensíveis às mudanças mínimas de pH, devendo ser revisto os processos de lavagem e purificação dos filmes biocompósitos.

Figura 1

Termograma obtido por DSC para as amostras de PGS (controle) e biocompósitos

Figura 2

Resultados do ensaio de degradação in-vitro

Conclusões

A mistura do PGS com o PPy formou filmes sólidos a temperatura ambiente e com boa compatibilidade. São estáveis até 400 °C e apresentam perda de massa em torno de 13% em PBS por 20 dias. A condutividade elétrica dos biocompósitos tem magnitude compatível com tecidos cardíacos. Como ambos os polímeros são biocompatíveis, aplicações na área médica são vislumbradas para este material, devendo ser analisados nos próximos passos desta pesquisa.

Agradecimentos

Referências

GEORGE, P. M. et al. Fabrication and biocompatibility of polypyrrole implants suitable for neural prosthetics. Biomaterials, 2005. v. 26, n. 17, p. 3511–3519.
NAIR, L. S.; LAURENCIN, C. T. Biodegradable polymers as biomaterials. Progress in Polymer Science (Oxford). 2007. v. 32, n. 8-9, p. 762-798
QAZI, T. H.; RAI, R.; BOCCACCINI, A. R. Tissue engineering of electrically responsive tissues using polyaniline based polymers: A review. Biomaterials, 2014. v. 35, n. 33, p. 9068–9086.
RAI, R. et al. Synthesis, properties and biomedical applications of poly(glycerol sebacate) (PGS): A review. Progress in Polymer Science, 2012. v. 37, n. 8, p. 1051–1078.
ROBERTS-THOMSON, K. C. et al. Fractionated atrial electrograms during sinus rhythm: Relationship to age, voltage, and conduction velocity. Heart Rhythm, 2009. v. 6, n. 5, p. 587–591.
SHI, G. et al. A novel electrically conductive and biodegradable composite made of polypyrrole nanoparticles and polylactide. Biomaterials, 2004. v. 25, n. 13, p. 2477–2488.
T. HATAKEYAMA; F.X. QUINN. Thermal Analysis — Fundamentals and Applications to Polymer Science, 2nd Edition,. London: John Wiley & Sons, Inc., 2000.

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