Degradação dos fármacos lamivudina e zidovudina empregando processos oxidativos avançados em reator de bancada UV-C

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ambiental

Autores

Lucena, A.L.A. (UFPE) ; Santana, R.M.R. (UNINASSAU) ; Charamba, L.V.C. (UFPE) ; Napoleão, D.C. (UFPE) ; Duarte, M.M.M.B. (UFPE)

Resumo

A biodiversidade e o equilíbrio dos ecossistemas estão diretamente relacionados à qualidade da água, solo e ar. Dentre as substâncias que quando liberadas no meio ambiente tem o potencial de causar efeitos adversos ecológicos e/ou na saúde de seres vivos destacam-se os fármacos. Devido à incapacidade dos tratamentos biológicos e físico-químicos convencionais de removê-los do meio têm-se utilizado tratamentos alternativos como os processos oxidativos avançados (POA). Os POA têm se consolidado como um tratamento capaz de converter poluentes persistentes em CO2 e água. Este trabalho avaliou a eficiência de um processo via POA para degradação dos fármacos lamivudina e zidovudina, empregando reator de bancada UV-C.

Palavras chaves

Lamivudina; Zidovudina; POA

Introdução

Os produtos farmacêuticos constituem um grupo de compostos medicinais humanos e veterinários que são utilizados em todo o mundo (KLAVARIOTI et al., 2009). Devido ao reconhecimento dos seus efeitos adversos, quando presentes no meio ambiente, geram toxicidade aquática, genotoxicidade, perturbação endócrina em animais, seleção de bactérias patogênicas resistentes, entre outros. Além disso, estas substâncias são consideradas poluentes orgânicos persistentes, de difícil degradação, esses compostos têm sido alvo de diferentes grupos de pesquisa ao longo dos anos (CRITTENDEN et al., 2012; AQUINO; BRANDT; CHERNICHARO, 2013). Os fármacos apresentam várias classes, as quais têm sido estudadas em maior ou menor escala, estando diretamente ligado ao fato de apresentarem um maior ou menor consumo pela população. Dentre as classes mais prescritas estão as de antipiréticos, anti-inflamatórios e analgésicos. Nos últimos anos, tem-se buscado realizar estudo sobre a persistência de outras classes de fármacos, como os antipsicóticos antirretrovirais, objeto de estudo deste trabalho. Dentre os antirretrovirais encontram-se a lamivudina e a zidovudina, compostos indicados para o tratamento do vírus HIV (CORBETT, 2010). A preocupação ambiental aumenta quando se verifica a presença de compostos como os fármacos em redes de coleta de esgoto por meio de lançamento de águas cinzas (derivadas dos chuveiros, lavatórios e lavanderias), águas negras (excretadas por indivíduos que podem conter medicamentos de uso oral e hormônios naturais) e descarte, nas instalações sanitárias, de medicamentos não usados ou com prazos de validade expirados. Para promover o tratamento das matrizes aquáticas, as estações de tratamento de efluentes (ETE) normalmente empregam processos biológicos e físico-químicos como principal tecnologia e, em poucos casos, utilizam técnicas complementares de tratamento. Dessa forma, as unidades de ETE são projetadas para reduzir a carga de poluentes orgânicos e, eventualmente, nutrientes e microrganismos patogênicos, não objetivando especificamente a remoção de fármacos presentes no esgoto sanitário, bem como de outros compostos refratários (USEPA, 2009). Nesse contexto faz-se necessário estudar, avaliar e propor tratamentos que sejam eficientes em promover a degradação desses compostos. Dentre os tratamentos empregados estão os processos oxidativos avançados (POA) que tem se mostrado como uma tecnologia capaz de remover micropoluentes do solo e da água, convertendo-os a dióxido de carbono e água. Essa técnica se consolidou, uma vez que os processos apresentam como vantagem a capacidade de degradar o contaminante frente à realização de reações químicas oxidando compostos orgânicos complexos, tornando-os moléculas simples ou mineralizadas (USEPA, 2001 apud NAPOLEÃO, 2011). Os diferentes POA, tais como, fotólise, Fenton, foto-Fenton, fotocatálise heterogênea e UV/H2O2¬ são tecnologias eficazes na remoção de poluentes no tratamento de água potável ou de outros sistemas aquosos (ZAFRA-GÓMEZ et al., 2008). Para avaliar a eficiência destes processos faz-se necessário dispor de técnicas analíticas capazes de identificar e quantificar os compostos de interesse. Dentre as técnicas empregadas está a espectrofotometria de ultravioleta-visível (UV/VIS), na qual os compostos são observados de acordo com o comprimento de onda de máxima absorbância. Na Farmacopeia Americana, o UV/VIS é responsável pela maioria dos procedimentos espectrofotométricos. Quantificando essa afirmação tem-se o fato que existem mais de duzentas monografias específicas contendo medições UV/VIS na versão de 2013 (THOMAS et al., 2014). César et al. (2008) fez uso da espectrofotometria de ultravioleta-visível para identificar e quantificar a lumefrantina, fármaco utilizado no tratamento de malária. Tal técnica mostrou-se eficiente justificando a sua utilização voltada para a identificação de fármacos. Sabendo-se disso o presente trabalho teve por objetivo avaliar a aplicação dos POA foto-Fenton e UV/H2O2 na degradação de solução aquosa contendo os fármacos lamivudina e zidovudina.

Material e métodos

Preparação da solução estoque: foi preparada uma solução contendo 1000 mg⋅L-1 dos fármacos lamivudina e zidovudina em uma mistura de água destilada/metanol (9:1). Inicialmente, esta solução foi analisada qualitativamente (scan) em espectrofotômetro de UV/VIS (THERMOSCIENTIFIC) de modo a verificar os comprimentos de onda de máxima absorbância. Construção da curva analítica: uma vez verificado o comprimento de onda (λ) de maior absorbância para os compostos analisados, foram construídas quatro curvas analíticas (duas para cada λ). Essas curvas foram construídas em duas faixas de concentração de 0,1 a 10 mg⋅L-1 e de 10 a 100 mg⋅L-1 para quantificação dos compostos antes e após processo de degradação. Degradação dos fármacos empregando processos oxidativos avançados: esta etapa foi iniciada com a realização de um estudo preliminar que tinha por objetivo verificar dentre os POA foto-Fenton e UV/H2O2 qual apresentava maior eficiência na degradação dos compostos estudados. Para tal foram utilizados 50 mL de solução aquosa contendo os dois fármacos (30 mg⋅L-1, cada) em reator de bancada com radiação UV-C. O reator é composto por 3 lâmpadas (30 W, cada) dispostas em paralelo, revestido com folha de papel alumínio, com dimensões de 93,5 cm x 22 cm x 18,5 cm. A emissão de fótons foi realizada com radiômetro (Emporionet). Para verificar a melhor condição para emprego do processo UV/H2O2, procedeu- se com a irradiação, por um período de 1 hora, da solução aquosa sob duas condições diferentes, mantendo-se constante a concentração de peróxido de hidrogênio [H2O2] em 120 mg⋅L-1 e variando o pH: A) entre 3 e 4 e B) entre 5 e 6. De forma concomitante avaliou-se o processo foto-Fenton, utilizando uma [H2O2] igual a 120 mg⋅L-1, [Ferro] = 5 mg⋅L-1 e mantendo-se o pH entre 3-4. Uma vez observado o processo e a condição que se mostrou mais eficiente, foram realizados experimentos para avaliar a influência da concentração do H2O2 na degradação dos fármacos, também por um período de 1 hora. Em seguida, de posse da concentração de H2O2 ideal, realizou-se um acompanhamento cinético da degradação por 3 horas, sendo retiradas alíquotas nos tempos de: 0, 60, 90, 120, 150 e 180 min. Neste ensaio o H2O2 foi adicionado em seis tempos: 0, 10, 20, 30, 40 e 50 min.

Resultado e discussão

Inicialmente os fármacos em estudo, lamivudina e zidovudina, foram analisados via espectrofotometria de UV/VIS, sendo observados nos comprimentos de onda de 271nm e 267 nm, respectivamente. A partir desses dados foi possível construir as duas curvas analíticas para quantificação dos compostos antes e após a degradação via POA. As curvas analíticas apresentaram-se linear com valores de coeficiente de correlação superiores a 0,90, conforme exigência do Instituto Nacional de Metrologia (INMETRO, 2011). Sendo os valores obtidos: 0,986 para ambas curvas de 10 a 100 mg⋅L-1 e 0,999 para as duas curvas com faixa de concentração de 0,1 a 10 mg⋅L-1. De posse de metodologia capaz de detectar e quantificar os fármacos, passou- se a etapa de degradação empregando processos oxidativos avançados. O estudo preliminar constatou que o processo UV/H2O2 apresentou uma maior eficiência de degradação para um valor de pH entre 5-6, no qual foi possível degradar 11,28% da lamivudina e 11,05% da zidovudina. Nesse estudo, ao manter o pH entre 3 e 4, observou-se uma degradação inferior da lamivudina (4,78%) e semelhante para a zidovudina (11,47%). Já o processo foto-Fenton conseguiu degradar 8,46% da lamivudina e 13,27% da zidovudina (AZT). Ao observar os resultados do estudo preliminar, optou-se por trabalhar com o processo UV/H2O2, uma vez que este apresentou uma maior degradação para um dos fármacos em estudo (lamivudina) e análoga para o AZT. Esse processo é ainda menos custoso quando aplicado em larga escala, já que não necessita de adição de ferro. Sendo assim, passou-se a segunda etapa do estudo da degradação via POA, no reator de bancada UV-C com emissão de fótons de 1,98 µW/cm2. A avaliação realizada sob a variação da [H2O2] contou com o emprego de diferentes valores deste parâmetro, sendo eles: 200, 300, 400, 500 e 600 mg⋅L-1. Os valores foram fracionados (metade da concentração total) e adicionados em 2 tempos (0 e 15min). Os resultados obtidos em percentagem de degradação, para cada um dos comprimentos de onda, estão dispostos na Tabela 1. De posse dos resultados apresentados na Tabela 1, verificou-se que a concentração de H2O2 de 600 mg⋅L-1 mostrou- se como ideal para conseguir um maior % de degradação dos fármacos. Contudo, não foi atingido níveis superiores a 38%. Sendo assim, fixou-se o H2O2 nesta concentração e passou- se a terceira etapa do estudo da degradação, que consistiu em monitorar os percentuais de degradação dos compostos no tempo. Nesse caso, a concentração total de peróxido de hidrogênio foi fracionada nos tempos de 0, 10, 20, 30, 40 e 50 min. Em cada um desses adicionou-se 100 mg⋅L-1 de H2O2, conforme observações feitas por Tiburtius et al. (2009), que constatou que este reagente é consumido em pequenos intervalos de tempo, não sendo aconselhável a adição total da concentração a ser trabalhada. Os resultados desta etapa do estudo estão apresentados na Tabela 2. De acordo com os dados dispostos na Tabela 2, pode-se constatar que após um período de 180 min foram atingidos percentuais de degradação próximos a 90% para os dois fármacos analisados. Isto demonstra a eficiência do processo UV/H2O2 ao empregar reator de bancada com radiação UV- C.

Tabela 1

Descrição dos resultados do processo UV/H2O2 variando a concentração de peróxido de hidrogênio

Tabela 2

Percentuais de degradação dos fármacos empregando UV/H2O2 em diferentes tempos.

Conclusões

Com o presente trabalho pôde-se verificar a eficiência do processo UV/H2O2 frente a degradação dos fármacos lamivudina e zidovudina em solução aquosa, com níveis de remediação próximos a 90% para ambos os compostos. Tal resultado foi obtido quando a solução em seu pH natural (5-6) foi exposta a radiação UV- C, fazendo uso de peróxido de hidrogênio em uma concentração de 600 mg⋅L-1, por um período de 3 horas. Também foi permitido constatar que ao realizar estudo preliminar comparativo entre a ação UV/H2O2 e o processo foto-Fenton, este apresentou menor eficiência no tratamento, sendo então preterido.

Agradecimentos

Ao NUQAAPE/FACEPE e a CAPES.

Referências

AQUINO, S. F. de; BRANDT, E. M. F.; CHERNICHARO, C. A. de L. Remoção de fármacos e desreguladores endócrinos em estações de tratamento de esgoto: revisão da literatura. Engenharia Sanitária Ambiental, Rio de Janeiro, v. 18, n. 3, p. 187-204, 2013.
CÉSAR, I. da C.; NOGUEIRA, F. H. A.; PIANETTI, G. A.; Comparison of HPLC, UV spectrophotometry and potentiometric titration methods for the determination of lumefantrine in pharmaceutical products. Journal of Pharmaceutical and Biomedical Analysis, Rio de Janeiro, v. 48, p. 223-236, 2008.
CORBETT, M. A brief history of AZT. National Museum of American History. 2010.
CRITTENDEN, J. C.; TRUSSEL, R. R.; HAND, D. W.; HOWE, K. J.; TCHOBANOGLOUS, G. MWH’s Water Treatment: Principles and Design. 3th ed. p. 1066. Jonh Wiley & Sons, Inc. 2012.
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KLAVARIOTI, M.; MANTZAVINOS, D.; KASSINOS, D. Removal of residual pharmaceuticals from aqueous systems by advanced oxidation processes. Environment International, Rio de Janeiro, v. 35, p. 402-417, 2009.
NAPOLEÃO, D. C. Avaliação e Tratamento dos Contaminantes Emergentes (Ácido Acetilsalicílico, Diclofenaco e Paracetamol) utilizando Processos Oxidativos Avançados. 2011. 107 f. Dissertação (Mestrado em Engenharia Química) - Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2011.
THOMAS, L. The Use of Spectrophotometry in the Pharmaceutical Industry. In: ALBERT, C. P.; KENNETH, B.; HAMMOND, J. P. Spectrophotometry - Accurate Measurement of Optical Properties of Materials, 2014. cap. 11, p. 409-456.
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UNITED STATES ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY – (USEPA). Occurrence of Contaminants of Emerging Concern in Wastewater from Nine Publicly Owned Treatment Works. 2009.
ZAFRA-GÓMEZ, A., BALLESTEROS, O. NAVALÓN, A., VÍLCHEZ, J. L.; Determination of some endocrine disrupter chemicals in urban wastewater samples using liquid chromatography-mass spectrometry. Microchemical Journal, Rio de Janeiro, v. 88, p. 87-94, 2008.

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