Avaliação do Desempenho da Lama Vermelha na Purificação do Biodiesel

ISBN 978-85-85905-23-1

Área

Físico-Química

Autores

Coelho, A.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO) ; Santana, S.A.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO)

Resumo

O presente trabalho teve como objetivo a avaliação do uso da lama vermelha, no estado bruto e calcinado, como adsorvente no processo de purificação do biodiesel. Foi constatado que a adsorção usando lama vermelha é mais eficiente no controle do índice de acidez das amostras de biodiesel do que o método tradicional, fazendo-as apresentar valores dentro dos limites estabelecidos pela ANP. A lama calcinada removeu 91 % de sabão do biodiesel, porém o método tradicional é mais eficiente, removendo 100 %. Nenhuma das amostras analisadas apresentaram teor de água dentro dos limites da ANP e somente o método tradicional adequou o teor de metanol dentro desses limites.

Palavras chaves

Adsorção; Biodiesel; Lama Vermelha

Introdução

Os combustíveis fósseis são responsáveis por grande parte do suprimento energético mundial, porém, esses recursos são limitados, pois, levando-se em consideração a grande taxa de consumo desses combustíveis, pode-se afirmar que no futuro suas matérias-primas serão escassas. Com esta constatação, surge a necessidade de buscar fontes de energia renováveis e o biodiesel se mostra uma boa alternativa de substituição do óleo diesel de petróleo usado em motores de ignição por compressão (MEHER et al., 2006). O biodiesel é definido como uma mistura de alquil ésteres de cadeia linear, comumente obtido através da reação de transesterificação entre os triglicerídeos presentes em óleos vegetais ou gorduras animais e álcoois de cadeia curta (LÔBO et al., 2008). Ao fim da reação, a fase rica em glicerol é separada da fase rica em ésteres metílicos por decantação. Mesmo após essa separação, os ésteres metílicos continuarão contendo contaminantes que comprometem a qualidade do combustível e, portanto, precisam ser removidos. Assim, o biodiesel precisa passar por uma etapa de purificação, após a decantação. Tradicionalmente essa purificação é feita através de uma lavagem com água, porém esse método gera um grande volume de efluentes aquosos de difícil tratamento que podem causar impactos ambientais (FACCINI et al., 2011). O método da lavagem com água pode então ser substituído pelo método de lavagem a seco, utilizando adsorventes (FACCINI et al., 2011). Esse método além de não gerar nenhum efluente líquido, ainda apresenta a possibilidade do adsorvente ser reutilizado, dependendo de sua capacidade de adsorção (FACCINI, 2008). A busca por adsorventes de baixo custo e disponíveis, faz com que seja incentivado o uso de resíduos industriais para este fim. A lama vermelha é o resíduo oriundo da etapa de clarificação do processo Bayer que dá origem à alumina (SOUZA, 2013). Considerando que o Brasil é o 3° maior produtor de alumina do mundo e que para cada tonelada de alumina são geradas entre 1 e 2 toneladas de lama vermelha, pode-se notar que há um imenso acúmulo desse resíduo nas indústrias nacionais de alumina (SILVA FILHO et al., 2008), o que incentiva a busca por formas de aproveitamento desse material. Diversos estudos realizados apontam a lama vermelha como um bom adsorvente e aproveitando essa capacidade de adsorção esse resíduo pode ser usado na remoção de corantes presentes em efluentes têxteis, na remediação de solos contaminados com Cádmio (Cd) e Chumbo (Pb) e na remoção de hidrocarbonetos presentes em combustíveis de petróleo (SILVA FILHO et al., 2008; COSTA et al., 2009; SOUZA, 2013). O presente trabalho busca fazer uma avaliação do desempenho da lama vermelha quando usada no processo de purificação do biodiesel, para verificar a possibilidade do uso de um novo adsorvente que faça com que esse biocombustível atenda às especificações da ANP.

Material e métodos

A lama vermelha foi proveniente da empresa Alumar (Consórcio de Alumínio do Maranhão S.A), localizada em São Luís, Maranhão. A lama bruta (LB) foi obtida após secagem da lama vermelha à 100 °C, por 12 horas (ATASOY, 2005), e a lama calcinada (LC) foi obtida a partir da calcinação da LB a 550 °C por 4 horas, seguindo a metodologia de Souza (2013). O biodiesel foi obtido experimentalmente a partir de óleo de soja refinado, metanol e um catalisador básico (KOH). Todos os reagentes utilizados neste trabalho foram de natureza analítica. O cálculo da área superficial específica, volume dos poros e diâmetro médio dos poros foi feito através de uma análise de fisissorção de nitrogênio a -195,797 °C, em um equipamento MICROMERITICS modelo ASAP 2020. Na avaliação da capacidade de hidratação, foi adotada a metodologia de Foster (1953), adaptada por Santos (2012), na qual 0,5 g de lama, bruta e calcinada, foram colocadas em provetas de 10 mL e tiveram seu conteúdo completado com água deionizada. As amostras foram agitadas e deixadas em repouso por 24 horas. O biodiesel, obtido a partir do método adotado por Geris et al. (2007), foi purificado por lavagem tradicional e lavagem a seco. Na lavagem tradicional, seguiu-se o método descrito por Geris et al. (2007). Para a lavagem a seco, 250 mg de adsorvente foram colocados em contato com 50 mL de biodiesel bruto, sob agitação constante de 150 rpm, por 15, 30, 120 e 180 minutos. Filtradas, as amostras de biodiesel foram caracterizadas em função do índice de acidez (norma EN 14104, resolução N° 14 da ANP), teor de sabão (método Cc 17-19 da AOCS), teor de água e de metanol (Instituto Adolfo Lutz, 1985). A quantidade de adsorvato removida em cada instante foi calculada por meio da Equação 1. q=((C0-C).V)/m (1) onde q é a quantidade de adsorvato removida (mg/g); C0 e C são as concentrações iniciais e finais de adsorvato na fase fluida (ppm); V é o volume da solução (L) e m é a massa de adsorvente (g). Todos os ensaios foram feitos em duplicata.

Resultado e discussão

A área superficial da lama bruta calcinada aumentou em 83 % (LB= 9,6781 m²/g; LC= 17,7190 m²/g) e o volume de poros em 34 % (LB= 0,045750 cm³/g; LC= 0,061476 cm³/g) o que se deve à perda de água decorrente do tratamento térmico a 550 °C. O resultado de diâmetro de poros (LB = 18,90887 nm e LC = 13,87812 nm) os classificam como mesoporos. Por meio dos testes de capacidade de hidratação, foi constatado que tanto a LB como a LC sofreram expansão em contato com água deionizada devido à adsorção das moléculas de água nesses materiais, o que pode ser justificado pela presença de sódio na lama vermelha, elemento frequentemente encontrado na composição química desse resíduo (TSAKIRIDIS et al., 2004). Almeida Neto (2011) afirma que a presença do sódio na composição do material permite que este adsorva continuamente várias camadas de moléculas de água, expandindo e aumentando seu volume. Além disso, a LB apresentou uma expansão superior à LC e isso se deve à provável concentração superior de sódio na LB. A diminuição do sódio após a calcinação pode ser devido à decomposição térmica de alguns grupos oxigenados ou grupamentos hidroxila ligados a esse elemento (WANG et al, 2006 apud SOUZA, 2013). A figura 1 mostra o ensaio cinético realizado no biodiesel, relacionando a quantidade removida de sabão em função do tempo de contato entre o biodiesel e a lama vermelha no estado bruto e calcinado. Pode-se observar que a lama vermelha é capaz de remover uma quantidade considerável de sabão (máximos de 557 mg/g para a LB e 616 mg/g para a LC) e que essa remoção ocorreu inicialmente de forma rápida devido à disponibilidade de sítios ativos na superfície dos adsorventes (DURSUN et al., 2013). À medida que esses sítios vão sendo ocupados, a superfície dos adsorventes se torna saturada até que o equilíbrio seja atingido, o que ocorreu aproximadamente após 2 horas de contato. De modo a avaliar a eficiência da lavagem utilizando a lama vermelha frente à lavagem tradicional, selecionaram-se os pontos em que a lama obteve os melhores resultados em relação aos parâmetros investigados (índice de acidez, teor de sabão, teor de água e teor de metanol), comparando-os com os resultados obtidos para o biodiesel bruto e o biodiesel lavado com água. Tais resultados encontram-se na tabela 1 onde, BB representa o biodiesel bruto, BA, biodiesel lavado com água, BLB, biodiesel lavado com lama bruta, BLC, biodiesel lavado com lama calcinada, IA, índice de acidez, TS, teor de sabão, TA, teor de água e TM, teor de metanol. É possível observar um aumento do índice de acidez sofrido pelo biodiesel após este ser submetido aos métodos de purificação utilizados. Para as lavagens utilizando lama vermelha, tal aumento pode ser relacionado à presença de água na superfície de ambos os adsorventes usados, o que favoreceu a reação de hidrólise dos ésteres e dos glicerídeos presentes, convertendo-os em ácidos graxos. O aumento do índice de acidez nas amostras lavadas pelo método tradicional se deve ao uso de uma solução 0,5 % de HCl na primeira lavagem, o que aumenta a concentração de íons hidrônio em tais amostras. Dentre as amostras analisadas, somente aquelas purificadas com a LB e a LC apresentaram índices de acidez dentro dos limites estabelecidos pela ANP. Apesar da lama vermelha apresentar uma boa capacidade de remoção de sabão (82% de remoção no caso da LB e 91% no caso da LC), a lavagem tradicional é superior, por promover a total remoção desse contaminante. Porém não é possível determinar se as amostras analisadas se encontram dentro das normas da ANP, já que esta não estabelece limites para o teor de sabão. Na análise do teor de água, observa-se que a LB apresentou uma capacidade de adsorção superior à da LC por ser esse material mais hidrofílico, como evidenciado no teste de capacidade de hidratação. Porém, nenhuma das amostras geraram resultados satisfatórios, e isso pode ser justificado pela elevada concentração de água no biodiesel bruto que pode ser atribuído ao armazenamento inadequado, como também pela presença de água adsorvida nas amostras de lama. Com relação ao teor de metanol, somente a lavagem tradicional obteve resultados satisfatórios, tendo sua concentração dentro dos padrões da ANP.

Tabela 1

Parâmetros de comparação entre a lavagem tradicional e a lavagem empregando lama vermelha como adsorvente

Figura 1

Ensaio Cinético de remoção de sabão do biodiesel aplicando os adsorventes LB e LC

Conclusões

O tratamento térmico ao qual a lama vermelha foi submetida se mostrou uma forma eficiente para aumentar a capacidade de adsorção desse material, uma vez que sua área superficial específica sofreu um aumento de 83 %. O diâmetro dos poros da lama vermelha a classifica como um material mesoporoso. Ao comparar o desempenho do método proposto com o método tradicional de purificação do biodiesel foi possível notar que a lama vermelha se mostrou superior no que se refere ao índice de acidez, visto que somente as amostras purificadas com esse material se enquadraram nos limites estabelecidos pela ANP para esse parâmetro. Porém a lavagem tradicional foi mais eficiente na diminuição do teor de metanol, de modo que somente as amostras purificadas com água se encaixaram em tais limites. A lama vermelha se mostrou eficiente na remoção de sabão, no entanto é necessário o estabelecimento do limite desse contaminante em biodiesel pelo órgão fiscalizador, e nenhuma das amostras purificadas se apresentaram dentro dos padrões estabelecidos no que diz respeito ao teor de água. A lama vermelha obteve bom desempenho na remoção de alguns contaminantes, sendo necessário, portanto mais testes buscando otimizar as condições experimentais e assim comprovar a viabilidade da substituição da lavagem tradicional pela lavagem a seco, utilizando a lama vermelha.

Agradecimentos

Ao Professor Wener Santos, da UFMA, pelo fornecimento da amostra de lama vermelha utilizada nessa pesquisa.

Referências

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