PREPARAÇÃO DE CATALISADOR HETEROGÊNEO ÁCIDO SUPORTADO EM CINZA DE CASCA DE ARROZ PARA APLICAÇÃO NA PRODUÇÃO DE BIODIESEL

ISBN 978-85-85905-23-1

Área

Química Tecnológica

Autores

Costa, B.P.F. (UFPA) ; Gonçalves, M.A. (UFPA) ; Mares, E.K.L. (UFPA) ; Luz, P.T.S. (IFPA) ; Rocha Filho, G.N. (UFPA) ; Zamian, J.R. (UFPA) ; Conceição, L.R.V. (UFPA)

Resumo

Este trabalho tem como objetivo o desenvolvimento de um catalisador heterogêneo ácido baseado em heteropoliácido de tungstênio (H3PW) utilizando como suporte a cinza de casca de arroz (CCA) para aplicação no processo de produção de biodiesel. O método de impregnação incipient-wetness foi utilizado na preparação do catalisador, e a caracterização do mesmo se deu pelas técnicas de Difração de raio-X (DRX), Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV), Espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourier (FT-IR), e Acidez superficial. O catalisador foi avaliado frente ao processo de produção de biodiesel a partir da reação de transesterificação do óleo buriti, em que foram estudados as condições reacionais: temperatura reacional, razão molar álcool:óleo e concentração de catalisador.

Palavras chaves

Cinza de casca de arroz; Catalisador heterogêneo; Biodiesel

Introdução

Atualmente, a busca por fontes de energia em substituição aos combustíveis fósseis tem se tornado de extrema importância, não só sob o aspecto econômico, mas também do ponto de vista ambiental. Neste contexto, o biodiesel é uma evolução na tentativa de substituição do diesel de petróleo por combustíveis oriundos de biomassa, iniciada pela tentativa de aproveitamento de óleos vegetais “in natura” aplicados à motores do ciclo Diesel. Este biocombustível é comumente obtido por reação de transesterificação, a partir de matérias primas, tais como, óleos vegetais e gorduras animais, e um álcool de cadeia curta na presença de um catalisador, que pode ser ácido básico ou enzimático (OLIVEIRA, 2004). A reação de transesterificação pode empregar diversos tipos de álcoois, preferencialmente os de baixo peso molecular, sendo os mais estudados os álcoois metílico e etílico. A utilização do metanol no meio reacional é tecnicamente mais viável do que o etanol. Porém, o etanol pode ser amplamente utilizado desde que seja anidro, ou seja, com teor de água inferior a 2%, visto que a água atuaria como inibidor da reação (OLIVEIRA, 2004). A síntese do biodiesel realizada por catálise heterogênea oferece vantagens técnicas e ambientais em relação à catálise homogênea, pois facilita a purificação dos ésteres, permite a reciclagem do catalisador sólido ao longo de sua vida útil e minimiza a geração de efluentes. Além disso, facilita consideravelmente a recuperação do glicerol. Vários sólidos têm sido propostos como catalisadores em potencial para a síntese do biodiesel. O desempenho destes materiais como catalisadores está naturalmente relacionado com a natureza dos sítios ácidos ou básicos encontrados nestes materiais (CORDEIRO, 2011). Embora a síntese de biodiesel por catálise heterogênea apresente vantagens técnicas e ambientais em relação à homogênea, a busca por materiais de baixo custo ou a reutilização de rejeitos, como a Casca de Arroz (CA), é de suma importância para a minimização de custos no processo de produção do biodiesel. Devido ao fato da CA possuir grande quantidade de sílica, são materiais interessantes e promissores no uso como suportes catalíticos. Além disso, são facilmente comparáveis com o suporte de sílica comercial muito utilizado em indústrias na catálise heterogênea (SANTOS et al, 2014). O uso da cinza da casca de arroz como suporte catalítico possibilita processos com baixo consumo energético, melhor uso dos recursos naturais, redução de subprodutos e eliminação de efluentes como potencial contaminante (ENZWEILER et al, 2013). O aproveitamento deste rejeito propõe-se, ainda, solucionar o problema ambiental, podendo gerar renda extra através da sua utilização como catalisador heterogêneo na síntese de um biocombustível (SOARES et al, 2012; MANIQUE, 2011). Neste contexto, o presente trabalho estuda o processo de produção de biodiesel utilizando como suporte catalítico heterogêneo as cinzas de cascas de arroz impregnadas com ácido fosfotúngstico (H3PW).

Material e métodos

A cinza de casca de arroz foi adquirida em comércio local (Belém). O óleo bruto de buriti utilizado neste estudo foi fornecido pelo AmazonOil. O álcool etílico absoluto (99,8%) foi comprado da NEON. O ácido fosfotúngstico (H3PW12O40) e o Heptadecanoato de metila (99,0%) foram adquiridos da Sigma- Aldrich VETEC®. O catalisador H3PW/CCA foi preparado pelo método de impregnação incipient- wetness, em que a massa de H3PW foi dissolvida em solução alcoólica 70% m/m à temperatura ambiente, transferida para um cadinho contendo o suporte CCA e misturada. O sólido catalítico foi seco à 100 °C por 30 min, seguida de calcinação à 300 °C por 4 h. A eficiência do catalisador foi testada no processo de produção de biodiesel em seis reações de transesterificação com diferentes condições reacionais, conduzidos a partir das variações dos parâmetros: temperatura reacional, razão molar etanol:óleo e concentração de catalisador, como mostrado em detalhes na Tabela 1. Todos os testes catalíticos foram realizados em um reator PARR Series 5500 HPCL Compact Reactors com tempo reacional de 4 h e agitação de 700 rpm. O catalisador foi previamente ativado a 110 °C por 1 h antes do teste catalítico, e ao final foi separado da mistura reacional por centrifugação à 1570x por 15 min. A mistura remanescente foi transferida para um funil de separação e lavada com porções de água destilada aquecida (~80 °C) por 12 h para permitir a separação entre a fase éster e o glicerol. Finalmente, os ésteres etílicos foram secos em estufa à temperatura de 60 °C por 24 h. Os difratogramas de raios-X dos materiais foram coletados pelo método do pó em um difratômetro da PANalytical, modelo EMPYREAN. A radiação empregada e o intervalo de escaneamento foram de Cu Kα (1.541874 Å) à 40 KV e 30 mA e 8°<2θ<70°. A morfologia do catalisador foi realizada por microscopia eletrônica de varredura de alta resolução em um microscópio TESCAN modelo VEJA 3 LMU, operando com tensão de aceleração de 20 KV. Os espectros de infravermelho foram obtidos na faixa de 400 a 4000 cm-1 (resolução de 4 cm-1 com 32 acumulações). As análises foram realizadas em um equipamento FTIR IR Prestige-21 modelo Shimadzu e a amostras foram prensadas em pastilhas de KBr na proporção de 1,0 mg de amostra para 99,0 mg de KBr. Na determinação da acidez superficial foi utilizado o método de titulação ácido-base, em que foram mantidos em agitação por 1 h à temperatura ambiente 0,1 g do catalisador em 20 mL de NaOH (0,1 M). A suspensão foi então centrifugada e 5 mL do sobrenadante foram titulados com HCl (0,1 M). O teor de éster dos biodieseis foi determinado por cromatografia gasosa de acordo com SILVA et al. (2007) utilizando um cromatógrafo Shimadzu GC-2010 equipado com auto injetor e Detector de Ionização de Chama (FID), apresentando as seguintes características: coluna capilar TG-WAX MS com 30 m de comprimento, 0,32 mm de diâmetro interno e 0,25 μm de filme. O gás Hélio foi utilizado como fase móvel na razão de 1,0 mL/min.

Resultado e discussão

O catalisador H3PW/CCA foi sintetizado com impregnação de 20% de H3PW. Uma das propriedades fundamentais nos catalisadores heterogêneos ácidos trata-se da acidez superficial, que para o catalisador H3PW/CCA apresentou valor de 5,20 mmol H+/g, valor elevado quando comparado ao valor de acidez superficial do suporte CCA que foi de 2,10 mmol H+/g, estes dados confirmam a impregnação do H3PW no suporte CCA. Os difratogramas de raios-x do suporte CCA, heteropoliácido H3PW e do catalisador H3PW/CCA são mostrados na Figura 1. A Figura 1(a) mostra que o suporte CCA apresenta um caráter amorfo, caracterizado por um halo amorfo na região entre 15 a 30° (em 2θ). O difratograma do H3PW, Figura 1(b), evidencia caráter altamente cristalino, com distintos planos de difração. Este padrão de difração é complexo devido às várias estruturas existentes no ânion Keggin, bem como às interações devido às formas de protonação deste ácido. Os picos de difração característicos da fase cristalina do H3PW são observados em 2θ à 10°, 20°, 25° e 32° (CALIMAN et al, 2010; LACERDA et al, 2013), tanto na Figura 1(b) referente ao H3PW puro, quanto na Figura 1(c) referente ao catalisador. As micrografias (MEV) do catalisador H3PW/CCA, são mostradas na Figura 1 com magnitudes em: 1(d) 1,0 K, 1(e) 5,0 K, 1(f) 20,0 K e 1(g) 50,0 K. As micrografias indicam que as distribuições dos cristalitos apresentam diversos tamanhos, sendo assim, não uniformes. A Espectroscopia de Infravermelho com Transformada de Fourier (FT-IR) é uma técnica útil para elucidar estruturas Keggin presentes no HPAs. A Figura 1(h) e 1(i) mostram os espectros de FT-IR do suporte CCA e do catalisador H3PW/CCA na região de 4000–400 cm-1, respectivamente. O espectro referente ao suporte CCA, mostra uma banda de absorção a cerca de 3445 cm-1, atribuída a vibração do tipo estiramento da ligação O-H em Si-OH, e da vibração H-OH de moléculas de água adsorvidas na superfície da sílica (CARMONA et al, 2013; COSTA et al, 2017a). A banda de absorção em 1100 cm-1 é atribuída a vibração de estiramento assimétrico da ligação Si-O-Si na estrutura do grupo siloxano (COSTA et al, 2014). A banda de absorção próxima de 750 cm-1 é atribuída ao estiramento simétrico da ligação Si-O, e a banda em 465 cm-1 é atribuída à vibração no modo de distorção angular da ligação Si-O-Si (COSTA et al, 2017b; COSTA et al, 2014). O ânion de Keggin apresenta bandas características na região entre 600 e 1200 cm-1, no infravermelho. Estas bandas estão associadas à existência de quatro tipos de átomos de oxigênio na estrutura: quatro átomos de oxigênio comuns ao tetraedro central MO4 (Oa) e aos três octaedros de um mesmo grupo W3O13; doze átomos de oxigênio (Od) ligados em pontes M-O-M entre duas unidades W3O13 diferentes; doze átomos de oxigênio (Oc) ligados em pontes M- O-M de um mesmo grupo M3O13 e doze átomos de oxigênio (Ob) com ligações duplas M=O terminais. No espectro referente ao catalisador H3PW/CCA, mostrado na Figura 7, a presença do ácido 12-fosfotungstítico (H3PW) é observado nas bandas em: νas(P-O) em 1100 cm-1; νas(W=Ob) em 983cm-1; νas(W- Oc-W) em 797 cm-1 e νas(W-Od-W) em 898 cm-1 (DIAS et al, 2003). A Figura 2 mostra os valores de teor de éster obtidos em cada experimento realizado. A partir da análise deste gráfico, fica evidente que o biodiesel que apresentou o maior valor de teor de éster, ou seja, a maior pureza, foi o biodiesel realizado no Experimento R5, com condições de: temperatura de 220 °C, razão molar de 90:1 e concentração de catalisador de 12,5%. Assim, é notório que dentro das condições estudas nos testes catalíticos, em comparação entre os Experimentos R4, R5 e R6, que a variação da concentração de catalisador é extremamente determinante para a obtenção de teores de ésteres elevados, porém não apresenta uma tendência linear, ou seja, o puro aumento da concentração do catalisador não representa a elevação do teor de éster, uma vez que no Experimento R4 o teor de éster obtido foi de 48,2% e no Experimento R6 o teor de éster obtido foi de 52,2%. Porém, quando a concentração de catalisador é de 12,5%, ou seja, o valor intermediário de concentração de catalisador, que é o caso do Experimento R5, o teor de éster obtido foi de cerca de 88,0%, representando assim o melhor resultado deste estudo.

Figura 1.

DRX: (a) CCA, (b) H3PW, (c) H3PW/ CCA; MEV: H3PW/CCA (d) 1,0 K, (e) 5 K, (f) 20 K, (g) 50 K; FT-IR: (h) H3PW/CCA e (i) CCA.

Figura 2.

Teor de éster dos testes catalíticos.

Conclusões

O presente estudo aborda como tema principal a utilização da cinza de casca de arroz como suporte catalítico na preparação de catalisador heterogêneo ácido. O catalisador à base de impregnação do ácido fosfotúngstico (H3PW) na CCA foi sintetizado satisfatoriamente, o estudo de caracterização realizado confirmou a eficiência do método de síntese do catalisador. O catalisador demonstrou possui atividade catalítica efetiva na síntese de biodiesel por reação de transesterificação. Dentro dos testes realizados neste estudo, verifica-se que o biodiesel sintetizado nas condições reacionais de temperatura de 220 °C, razão molar de 90:1 e concentração de catalisador de 12,5%, apresentou um teor de éster de 88,0%, o que demonstra uma elevada conversão. Outros testes serão realizados a fim de se determinar, dentro das condições de estudo neste trabalho, a melhor condição reacional, e para isso um estudo sobre o planejamento e a otimização das condições reacionais está sendo realizado, o que possivelmente permitirá alcançar valores ainda maiores de teor de éster e conversão dentro do processo de produção deste biodiesel.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Laboratório de Catálise e Oleoquímica-LCO, Laboratório de Pesquisa e Análises de Combustíveis-LAPAC, e à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pes

Referências

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