AVALIAÇÃO DOS EFEITOS DA ADIÇÃO DE RESÍDUOS DE EVA EM MATRIZ DE POLIAMIDA 6

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Materiais

Autores

Milfont, C.H.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE) ; Silva, F.D.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CARIRI) ; Pinto, L.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CARIRI) ; Souza, T.D. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CARIRI)

Resumo

Dentre as formas de se obter materiais com características específicas, as blendas poliméricas têm ganhado destaque, pelo fato de obter melhores propriedades, facilidade de processamento e baixo custo de produção. Nesse cenário, estudos que visam a utilização de elastômeros como fase dispersa em matriz termoplástica principalmente com objetivo de tenacificação têm apresentado notoriedade. O objetivo deste trabalho foi produzir e avaliar as blendas de matriz de poliamida 6, com fase dispersa de micropartículas de resíduos de EVA, produzidas pelo método casting na forma de membranas. Observou-se que a presença do EVA afeta de forma negativa as propriedades térmicas da blenda. Contudo os ensaios mecânicos apontaram que teores de até 10% promoveu uma pequena melhora na resistência à tração.

Palavras chaves

Poliamida 6; EVA; Resíduos

Introdução

Com o crescimento da indústria de polímeros como também do aumento significativo do consumo desses materiais, por apresentar vantagens superiores quando comparado com os metais e cerâmicos, a síntese de novos compostos de alta massa molar para atender exigências específicas de mercado tornou-se inviável economicamente. Desta forma, surgiram desafios no que diz respeito à modificação de polímeros já existentes e a preparação de materiais com base nesses polímeros, como misturas poliméricas, compósitos e compostos com diferentes formas de aditivação (NESTEROV e LEBEDEV, 1989). O desenvolvimento de materiais poliméricos multifásicos com propriedades mecânicas superiores desejadas, normalmente envolve a prática de produção de blendas (PAOLI, 2008). Blendas poliméricas são sistemas poliméricos originários da mistura física de dois ou mais polímeros e/ou copolímeros, sem que haja um elevado grau de reações químicas entre eles (HAGE e PESSAN, 2001). Suas propriedades físicas e químicas podem ser alteradas para uma vasta gama de aplicações, proporcionando desempenho desejável para o produto final. A poliamida 6 (PA6) é um polímero termoplástico de engenharia bastante utilizado em blendas poliméricas, principalmente devido as suas características como a elevada tenacidade acima de sua temperatura de transição vítrea (Tg), boa resistência química em meios orgânicos, boa resistência à abrasão e boas propriedades mecânicas e térmicas (BRYDSON, 1975). Por outro lado, algumas características como sua rápida cristalização e alta absorção de umidade favorecem à retração do moldado e à instabilidade dimensional do material. Além disso, sua sensibilidade à trinca e fragilidade em temperaturas sub-ambientes torna seu uso restrito a algumas aplicações (BRYDSON, 1975). Afim de se contornar problemas encontrados na PA6 como a sensibilidade à trinca e a fragilidade em temperaturas abaixo da sua Tg, a formação de blendas a base de PA6 e materiais elastômeros se torna uma opção atraente para driblar os inconvenientes a esse polímero. Os elastômeros são polímeros que apresentam cadeias altamente flexíveis que, incorporados na forma de uma segunda fase dispersa em uma matriz polimérica, podem melhorar a sua resistência ao impacto, resultando na tenacificação do polímero (KOHAN, 1995; CANEVAROLO, 2013). Dentre os elastômeros utilizados em blendas poliméricas com a finalidade de tenacificação, destacam-se a borracha natura (NR), a borracha de Acrilonitrila butadieno estireno (ABS) e o Copolímero Etileno Acetato de Vinila (EVA) (ROCETTO et al., 2016). Das diversas propriedades interessantes que o EVA possui, está a excelente resistência a ações de intempéries, boa tenacidade a baixas temperaturas e boas propriedades mecânicas (VARGHESE et al., 1995). Outras propriedades específicas como a cristalinidade e flexibilidade, também são alcançadas com a variação do teor de acetato no copolímero. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Calçados -ABICALÇADOS (2018), em 2017 o setor calçadista assinalou números positivos, registrando um crescimento da produção de 1,1% (em pares) em relação ao ano anterior, atingindo a uma marca superior a 900 milhões de pares produzidos no ano, sendo 14% dessa produção, destinada ao exterior, o que representa um valor superior a US$ 1 bilhão arrecadados, o que mostra a importância desse segmento para o país. Ainda segundo ABICALÇADOS (2018), dentre todos os estados do país, o que mais produziu pares em 2017, foi o Ceará, com cerca de 255,7 milhões de pares, o que representa 28,1% da produção total do país. Este fato mostra a importância desse setor para a economia do estado e de regiões emergentes como a de Sobral e a de Juazeiro do Norte, principais polos produtores de calçados no estado e responsáveis por 61,3 e 8,9% respectivamente, da produção total do estado. Devido à enorme utilização desse copolímero, uma grande quantidade de resíduos de EVA é produzida durante os processos produtivos das indústrias calçadistas do país. As alternativas para os resíduos sugerem a utilização na própria linha de produção do EVA utilizando os resíduos como carga, utilização na construção civil e também como modificadores de impacto (BRITO et al., 2011). Neste contexto o presente estudo busca incorporar partículas de resíduo de EVA em matriz de PA6 pelo método casting (evaporação por solvente) de modo a obter blendas com diferentes teores de EVA, e avaliar a interação entre os dois componentes no que diz respeito às propriedades mecânicas e térmicas. Visando uma alternativa ao resíduo produzido na região, bem como melhorar as características da PA6.

Material e métodos

Foram produzidas membranas puras de poliamida-6 (PA6) e poliamida-6/EVA (PA6/EVAn) com concentração de n igual a 5, 10 e 15% (m/m). Os resíduos de EVA foram coletados em uma indústria de fabricação de borrachas e calçados, situada em Juazeiro do Norte, na região do Cariri, sul do Ceará. Posteriormente, os resíduos foram triturados utilizando um triturador da Mondial, modelo MP-03. Em seguida, peneirado para obter partículas com cerca de 250 μm, as quais foram utilizadas como a fase dispersa. A PA6 foi solubilizada em ácido metanóico (85% PA), via agitação magnética, formando uma solução filmogênica numa concentração de 13% (m/v) que, em seguida, foi aplicada sobre um suporte e posteriormente, a solução foi levada para uma estufa para secagem, onde permaneceu em temperaturas entre 90°C e 100°C para a evaporação do solvente e obtenção da membrana polimérica. Para a preparação das membranas das blendas PA-6/EVA, as partículas de EVA foram misturadas à solução polimérica, de forma gradual, seguindo o mesmo procedimento descrito. Os corpos de prova foram obtidos a partir das membranas produzidas, em tamanhos de 80 mm de comprimento e 10 mm de largura. Sendo que o comprimento da região útil foi de 50 mm, seguindo assim, a norma ISO R377, na qual o corpo de prova deve possuir comprimento cinco vezes maior que largura para esses ensaios. Para analisar a interação das partículas de EVA com a matriz de PA6 e a sua influência no comportamento da blenda foram realizadas análises Termogravimétricas (TGA) em equipamento da Shimadzu TGA-50, utilizando uma atmosfera de Nitrogênio, na taxa de 50 mL/min, sob uma taxa de aquecimento de 10ºC/min, partindo da temperatura ambiente e indo até 500°C; Calorimetria Exploratória Diferencial (DSC), por intermédio de um equipamento DSC – 60A Plus, tendo como taxa de aquecimento 10ºC/min, da temperatura ambiente até a temperatura de 600ºC; e Caracterização Mecânica Sob Tração das membranas poliméricas puras e das blendas foram realizadas em triplicata, as quais formas conduzidas sob tração em uma máquina universal de ensaio DL (Digital Line) da EMIC com célula de carga de 200 kgf e garras apropriadas para filmes finos, utilizando uma taxa de deslocamento do travessão de 10 mm/min.

Resultado e discussão

A figura 1 mostra as membranas puras e com a adição de EVA, logo após a sua retirada da placa de suporte. Para a membrana pura notou-se uma boa uniformidade e ausência de poros ou outro tipo de defeito. Já na figura 1b, observa-se alguns pontos em que há uma pequena aglomeração dos particulados de EVA, enquanto que outros há pouca presença das partículas. Uma possível causa deste problema é o fato da não utilização de agente compatibilizante ou modificação da superfície do resíduo de EVA, o que pode ter dificultado a dispersão das partículas na matriz. A figura 2 apresenta as análises termogravimétricas da PA6 e desta com concentrações de 5, 10 e 15% de resíduos de EVA. Observa-se que a PA-6 permanece com um comportamento estável até temperaturas próximas à 400ºC. A partir de então, inicia-se o processo de perda considerável de massa, o qual se estende até temperaturas próximas a 530°C. O valor máximo de perda de massa na curva foi verificado em aproximadamente 467ºC, o que indica que esta é a temperatura de degradação da PA-6. Pramoda et al., (2003) em seus estudos acerca do comportamento térmico da PA6, observou valores de temperatura de degradação próximos aos que foram observados nas análises termogravimétricas. Observa- se que as adições dos resíduos promovem uma considerável alteração na degradação da PA6. Os resultados obtidos mostram que houve um deslocamento da curva termogravimétrica para a esquerda. As maiores alterações estão relacionadas com o início do processo de decomposição dos compostos. Estas alterações foram observadas nas concentrações de 5 e 15% de resíduos. Para ambos os casos, tanto a temperatura de início, máxima e final de decomposição, são bem menores se comparadas a PA6. No caso da blenda com concentração de 10% de resíduos, tem-se uma diminuição a temperatura de início do processo de degradação. Entretanto, as temperaturas máxima e final de decomposição, não foram alteradas de forma significativa, permanecendo próximas à obtidas na PA6. Desta forma, pode-se inferir que os resíduos de EVA agem desestabilizando-a. A curva da variação do fluxo de calor em função da temperatura da PA6 e com adição de EVA está representada na figura 2b. Analisando-se esta curva de DSC, pode-se observar uma variação da capacidade calorífica na temperatura próxima à 45°C. Essa variação representa a Tg da PA6. Também, é possível observar um pico característico na temperatura de 220,66ºC representando o seu ponto de fusão. Em temperaturas próximas a 400°C é possível também observar o início de degradação térmica. Analisando as curvas referentes a adição do EVA, pode-se observar que a presença não alterou de forma significativa a Tg da PA6. É possível também verificar dois picos característicos na curva das blendas. O primeiro, em aproximadamente 100°C representa a temperatura de fusão do EVA. O segundo pico característico, por volta de 220°C representa a temperatura de fusão da PA6. Outro ponto importante está na temperatura de degradação, as blendas possuem uma temperatura de degradação térmica menor se comparadas à PA6. As curvas das blendas permitem evidenciar que com o aumento da concentração de EVA na blenda, ocorre uma breve diminuição da temperatura de fusão. Segundo Bhattacharyya et al., (2001), isto indica que pode existir alguma miscibilidade entre as fases. Os valores de tensão máxima e alongamento percentual obtido após o ensaio mecânico são mostrados na figura 2c. Ao analisar os valores de tensão máxima, pode-se constatar que na primeira adição de EVA, inicialmente, observou-se uma alteração positiva na tensão, seguida de um decaimento considerável. De modo mais amplo, têm-se que para teores de EVA pequenos, inferiores a 5%, há variações positivas nas propriedades mecânicas de resistência à tração da PA6. Os resultados apontaram que, para valores mais altos de carga, a tensão máxima tende a diminuir de forma gradativa, retornando aos valores da PA6 quando um teor de até 10% de EVA está presente e após, este também diminui para valores inferiores ao da matriz pura. Isso pode ocorrer devido à falta de miscibilidade entre as fases, bem como uma provável aglomeração e formação de pontos concentradores de tensão, outro fato importante a ser considerado é que a técnica de produção utilizada para os filmes pode não ter sido eficiente a ponto de promover uma plena dispersão das micropartículas de EVA. Observando os valores de alongamento têm-se que inicialmente, para todas as concentrações, a deformação observada nas membranas das blendas foi menor do que a observada na membrana pura. Este fato não condiz com a expectativa, pois, como o EVA trata-se de um elastômero, ou seja, permite-se deformar de forma significativa até o seu rompimento, era esperado que as membranas das blendas tivessem uma deformação maior que a apresentada pela membrana de PA6.

Figura 1.

a) Membrana de PA6 e b) Membrana de PA6/EVA obtida pela técnica de evaporação de solvente.

Figura 2.

Curvas de a) TG e b) DSC, das membranas PA6 e PA6/EVA 5, 10 e 15%. c) Dados do ensaio de tração.

Conclusões

Os resultados obtidos pelas analises térmicas TGA e DSC demonstram que a adição de resíduos de EVA provoca algumas alterações importantes no comportamento térmico da PA6. Com o aumento do teor na matriz, há uma diminuição considerável da temperatura de degradação térmica. Além disso, ocorre um pequeno deslocamento do pico característico de fusão da PA6 para temperaturas menores à medida que se tem o aumento do teor de EVA. Desta forma, os resíduos funcionam como desestabilizastes térmicos na matriz. Os valores das propriedades mecânicas, indicam que para baixos teores de adição de EVA, de até 5%, ocorre uma melhora considerável na tensão máxima suportada pela blenda, entretanto, teores entre 5% e 10%, a tensão máxima suportada tende a retornar aos patamares da PA6, mas ainda assim, podem ser consideradas positivas. No caso da deformação, a presença dessa fase dispersa provocou uma menor deformação, possivelmente associado a composição do EVA da indústria calçadista, dentre outros componentes, é utilizado uma certa quantidade de carga inorgânica de carbonato de cálcio que tende a enrijecer o EVA proporcionando uma menor capacidade de deformação.

Agradecimentos

Referências

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