Aplicação de um sensor de baixo custo para medidas de volume por alunos com deficiência visual

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Iniciação Científica

Autores

Lima, F.S. (UFMA) ; Sousa, J.K.C. (UFMA) ; Ferreira, M.S. (UFMA) ; Paulo Rogério de Almeida, R. (UFMA)

Resumo

A inclusão de pessoas com deficiência é uma questão relevante. Desta forma, há uma necessidade de preparar a sociedade e as instituições para promover a igualdade de educação para as pessoas com deficiência. Visando diminuir essa exclusão, o presente trabalho consiste na criação de um sistema com sensor óptico para auxiliar na medição do volume em experimentos de Química por alunos com deficiência visual. A aplicação foi testada por voluntários vedados simulando uma situação real de alunos com deficiência visual. Os resultados mostram uma assertividade na medida desejada, sendo que testou-se com analistas com experiência em práticas de laboratórios e sem essa experiência. Os analistas com experiência obtiveram um erro menor. Ambos os grupos diminuíram o erro na segunda tentativa.

Palavras chaves

Volume.; Química Inclusiva; Tecnologia Assistiva

Introdução

As Instituições de Ensino Superior (IES) no Brasil têm recebido um significativo número de estudantes que declaram possuir algum tipo de deficiência, transtornos globais do desenvolvimento ou altas habilidades. De acordo com os dados do Censo da Educação Superior foram mais de 38.000 alunos matriculados em cursos de graduação no ano de 2017 (INEP, 2017). Este fato demanda uma reflexão sobre o assunto, cuja finalidade é a de promover e implementar ações que resultem na inclusão desses estudantes através de ferramentas ou procedimentos pedagógicos que possam atender às necessidades específicas de cada um desses alunos. Legalmente a necessidade do desenvolvimento de um processo de ensino e aprendizagem que contemple as necessidades educacionais especiais, aconteceu de forma mais efetiva em 2008, com o lançamento, pelo Ministério da Educação, da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008), que evidencia que a transversalidade da educação especial no ensino superior deve ocorrer por meio de ações que desencadeiem o acesso, a permanência e a participação dos alunos. Mas apesar desta Política estar em vigência a mais uma década, as IES têm encontrado dificuldades para a concretização de ações eficazes no atendimento a esta Política. De forma especial, as Ciências que são essencialmente experimentais, como é o caso da Química, tem encontrado dificuldades no que diz respeito aos procedimentos didático-pedagógicos para inclusão de alunos que apresentam algum tipo de deficiência. E esse fato contribui para que a concretização da aprendizagem dessa ciência não seja feita de forma positiva no sentido da inclusão e atendimento para uma parcela de estudantes. A dificuldade de trabalhar a Química de forma inclusiva no Ensino Superior está relacionada principalmente a ausência de materiais didáticos e instrumentos adequados disponíveis, a falta de formação docente adequada, de forma a contemplar metodologias de ensino relacionadas ao aluno com deficiência, além da falta de profissionais habilitados para acompanhamento desses alunos. (SOUSA e SILVEIRA, 2011; GONÇALVES et al, 2013; NEPOMUCENO e ZANDER, 2015). Nesse sentido, as dificuldades se tornam mais acentuadas devido à possibilidade de existir numa mesma turma alunos com diferentes necessidades especiais. O Censo da Educação Superior de 2017 indica que dentre os alunos com necessidades especiais matriculados em IES, os que apresentam problemas visuais estão em quantidade significativa, sendo, 10.619 alunos declarantes de deficiência por baixa visão e 2.203 apontaram ter deficiência por cegueira, de acordo com os dados do INEP de 2017. Atividades realizadas nas aulas de Química Experimental, como as medidas volumétricas, exigem um olhar atento de quem executa, pois é determinante para que se obtenham medidas com exatidão e tenham precisão no conjunto de medidas. Incluir alunos que apresentam deficiência visual nessas atividades tem sido um desafio, devido à dificuldade de transpor a necessidade insubstituível da visão por algum sentido que possa conduzir a pessoa com baixa visão ou cegueira a realizar medidas volumétricas. Supalo e colaboradores (2009) afirmam que pessoas com deficiência visual apresentam uma enorme capacidade de aprendizado, sendo necessário apenas criar mecanismos e ferramentas que permitam a possibilidade de inserção dessas pessoas no processo de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, alguns trabalhos, como o de Mól e colaboradores (2011), no qual descrevem ações e estratégias metodológicas que podem ser utilizadas na inclusão do aluno com deficiência visual, assim como os trabalhos de Oliveira (2018) e Nunes et al. (2010), têm sido desenvolvidos no sentido de oferecer alternativas para que alunos com problemas de visão possam participar efetivamente das aulas de química. Embora possamos encontrar alguns trabalhos na literatura, as publicações de que propõem ferramentas de aprendizagem de cunho inclusivo para alunos com deficiência visual em aulas de Química ainda são muito escassas. Considerando esse fato, o presente trabalho tem como objetivo produzir uma ferramenta de aprendizagem para medidas de volume por alunos com deficiência visual através do desenvolvimento de uma tecnologia assistiva, como um instrumento de inclusão dos mesmos.

Material e métodos

O processo de construção e desenvolvimento do sistema consiste, principalmente, na utilização de três sensores óptico reflexivos, nomeadamente Módulo Sensor Óptico TCRT5000. Esse sensor possui um circuito eletrônico que emite um feixe de luz infravermelho, bem como um fototransistor que pode captar a reflexão desse feixe. O fototransistor, sendo um transistor - com coletor, base e emissor - detecta a presença do feixe pela base, fazendo com que a corrente do emissor varie de acordo com a intensidade de luz. A tensão equivalente é usada para informar a proximidade do volume desejado. Para medir essa tensão é utilizado um Arduino Uno R3 que possui entradas analógicas. Esta tensão é convertida para um número dentro do intervalo 0 a 1023 bits (MASSIMO e SHILOH; 2015), uma vez que o Arduino usa 10 bits para conversão analógico-digital. Adicionalmente, um buzzer é utilizado para sinalizar sonoramente o estágio atual do volume. O processo de medição de volume consiste no posicionamento dos três sensores ao lado do balão volumétrico, cada um em uma posição fixa. O balão volumétrico foi escolhido para a realização deste controle de volume por ser uma vidraria calibrada, muito usada para o preparo e diluição de soluções com volumes precisos e pré-fixados (BROWN, 2005). Cada sensor, neste experimento, tem uma posição fixa e altura específica. Logo após ajustada a altura de cada sensor, o sinal de corrente de cada um vai variar na presença do líquido e cada variação será controlada por um programa lógico no Arduino.O Arduino aciona o buzzer que é responsável pela emissão do som (bipe), sendo que cada sensor emite um som específico. O som é acumulativo, ou seja, assim que o líquido passa pelo primeiro sensor será emitido um bipe e ao passar pelo segundo sensor o primeiro bipe é emitido, juntamente com um segundo bipe e assim sucessivamente. Ao final do experimento, ou seja, onde ocorre a passagem do líquido pelos três sensores, três sons distintos são emitidos pelo buzzer. Neste trabalho, apresentam-se os dados iniciais coletados por dez voluntários que realizaram o experimento com os olhos vendados. Neste conjunto de pessoas 50% tinham familiaridade com o procedimento de observar o menisco e encher um balão volumétrico, ou seja, são professores e alunos de química experimental e técnicos de laboratório. Os demais (50%) nunca tiveram contato com o laboratório de química. Ainda assim, todos foram informados de forma idêntica de como o sistema funciona e o objetivo do mesmo. Cada voluntário realizou o procedimento duas vezes.

Resultado e discussão

A Figura 1a mostra a ilustração da posição de cada sensor enquanto que a Figura 1b representa o esquema de montagem do hardware, detalhados na metodologia. A Figura 1c é a imagem real do experimento com os materiais utilizados, indicando o balão de 50mL, a seringa para adição de água (água com corante) e ao lado um balão que foi utilizado como modelo de recipiente e que foi sinalizado o volume de calibração. O balão vazio (Figura 1c), que não é idêntico ao outro, é utilizado pelo voluntário para ter uma noção do volume desejado. O volume desejado (50mL) nesse balão é circulado/indicado com adesivo em relevo para que usuário vendado possa perceber a textura do volume desejado. O experimento inicia-se com a otimização do procedimento para a realização das medidas. A primeira etapa é a obtenção dos pontos exatos dos três sensores colocados ao lado do balão volumétrico (Figura 1c). Após a fixação dos sensores, utilizou-se a água como solvente para obter a informação do quanto varia o volume em relação a cada uma das posições dos sensores. Através da massa e da densidade, a temperatura ambiente (25ºC), realizou-se a medida em triplicata das distâncias Dx e Dy. Posteriormente calculou-se a variação do volume do sistema, que neste caso são os valores da distância Dx e Dy. Como os sensores 01 e 03 são colocados a uma distância semelhante, em relação ao sensor 02, a variação do volume é de aproximadamente 1,73 mL quando se utiliza o balão de 50mL. É importante ressaltar que esta variação de volume foi calculada para o balão de 50mL. No entanto, este mesmo procedimento pode ser utilizado para qualquer volume, visto que dependendo do volume do balão volumétrico o diâmetro em que encontra-se a calibração varia. Neste experimento o volume e sua variação é de 50 ± 1,73 mL. Após o cálculo da variação da medida de volume, optou-se por escolher, para a adição da água ao balão, um material que possuísse uma graduação para ser usado como referência. Tal escolha está relacionada ao fato de que a graduação do material forneceria um dado complementar do quanto seria adicionado de água ao balão volumétrico. Neste caso foi escolhido como material graduado uma seringa de 60mL, com sua graduação variando de 1mL. A escolha da seringa dar-se ao fato também de ser um material em plástico em que se tem o controle de quanto e com qual intensidade a água é adicionada. O mesmo procedimento de calibração do balão realizado anteriormente foi realizado com a seringa comprovando esta medida de variação de 1mL. É importante ressaltar que no processo do líquido passar pelo segundo sensor e a emissão do segundo som é a etapa mais importante deste experimento, visto que o mesmo informa que o volume em que foi calibrado o balão foi alcançado. No entanto, a emissão do som ao líquido passar pelo primeiro sensor é um indicativo de que o volume está próximo do volume calibrado, o que permite que o analista coloque o líquido com menor intensidade, de modo a ficar o mais próximo possível do volume desejado. Do mesmo modo o terceiro sensor indica que o analista colocou mais do que o volume desejado. Como a posição do sensor é fixa é possível calcular o erro Após análise da precisão do sistema e da seringa, iniciou-se as coletas com voluntários que realizaram o experimento com os olhos vendados, observando alguns fatores tais como o desempenho do sistema com voluntários que possuem com o procedimento de observar o menisco e encher um balão volumétrico (A1, A2, A3, A4 e A5) e com voluntários de menisco que não tinham familiaridade com laboratório (A6, A7, A8, A9 e A10). O Gráfico 01 demonstra o resultado da primeira tentativa enquanto o Gráfico 02 o resultado da segunda tentativa. O Gráfico 01 e 02 demonstram que todos os voluntários, mesmo vendados, conseguiram colocar um volume próximo do desejado. Adicionalmente, conforme esperado, os profissionais que têm experiência com práticas laboratoriais obtiveram um erro menor que os demais voluntários. Complementarmente, uma comparação entre o Gráfico 02 e 01 sugere um aprendizado, uma vez que o erro diminuiu.

Figura01

Sistema Proposto

Figura02

Volume para primeira e segunda tentativa

Conclusões

O volume é uma das medida mais realizadas em aulas práticas de química e contribui no desenvolvimento de inúmeros experimentos de química. Neste trabalho desenvolveu-se um sistema para medição do volume de líquido para pessoas com deficiência visual. O sistema consiste na medição de um volume usando um balão volumétrico de 50 mL através do uso de três sensores que captam a diferença que existe de reflectância entre a água que é adicionada e o ar que existe sem a presença da água. A precisão do sistema é de 50 ±1,7 mL. Esse erro pode ser diminuído a medida que seja possível diminuir a distância entre os sensores sem que haja interferência dos dados fornecidos entre os mesmos. O desenvolvimento deste trabalho também realiza testes com voluntários que certificam a eficácia do sistema, com gráficos que demonstram que os voluntários conseguem realizar a tarefa mesmo vendados, os com experiência obtém melhor resultado que os sem, e ambos os grupos obtiveram um erro menor na segunda tentativa, ou seja, aprenderam com o sistema.

Agradecimentos

À UFMA e a FAPEMA pelo apoio financeiro: Processo TIAC-06585/16 e Processo UNIVERSAL-01269/17.

Referências

BANZI, Massimo; SHILOH, Michael. Primeiros Passos com o Arduino. 2. Ed. São Paulo: Novatec, 2015.
BRASIL. Decreto 6.571, de 17 de setembro de 2008. Dispõe sobre o atendimento educacional especializado, regulamenta o parágrafo único do art. 60 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e acrescenta dispositivo ao Decreto. n. 6.253.
GONÇALVES, F. P.; REGIANI, A. M.; AURAS, S. R.; SILVEIRA, T. S.; COELHO, J. C. Coelho e HOBMEIR, A. K. T. . A Educação Inclusiva na Formação de Professores e no Ensino de Química: A Deficiência Visual em Debate. Revista Química Nova Escola .Vol. 35, N° 4, p. 264-271, 2013.
HOCHENBAUM, Arduino Em Ação.1 ed. São Paulo: Novatec, 2013. 424 p.
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INEP. Censo da Educação Superior de 2017. Divulgação dos principais resultados. Brasília-DF. Setembro de 2018. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/docman/setembro-2018-pdf/97041-apresentac-a-o-censo-superior-u-ltimo/file. Acesso em: 24 de agosto de 2019.
MÓL, G.S.; RAPOSO, P.N. e PIRES, R.F.M. Desenvolvimento de estratégias para o ensino de química a alunos com deficiência visual. In: SALLES, S.B.A. e GAUCHE, R. (Orgs.). Educação científica, inclusão social e acessibilidade. Goiânia: Cânone,. p. 127-154, 2011.
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OLIVEIRA, M. A. De . Experimentos em Química para Deficientes Visuais: uma proposta metodológica. Trabalho de Conclusão de Curso. 45 p. Rondônia, 2018.
SOUSA, S. F. S.; SILVEIRA, H. E. S. Terminologias Químicas em Libras: A Utilização de Sinais na Aprendizagem de Alunos Surdos. Revista Química Nova Escola, v. 33, n. 1, p. 37-46, 2011.
SUPALO, C.A; DWYER, E.; EBERHART, H.L; BUNNAG, N.; MALLOUK,T.E. Teacher Training Workshop for Educators of Students Who are Blind or Low Vision. Journal of Science Education dos Students with Disabilities, Spring, p.9 Vol 13. No.1, 2009.

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