Cinética da desidratação de glicose a 5-hidroximetilfurfural utilizando ácido de nióbio como catalisador

ISBN 978-85-85905-25-5

Área

Química Tecnológica

Autores

Jesus, M.M.J. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA) ; Borges, E. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA) ; Fernandes, S.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA) ; Rodrigues, F. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA)

Resumo

O presente trabalho tem como objetivo estimar os valores dos parâmetros cinéticos da produção de HMF a partir de um solução aquosa de glicose, utilizando o ácido de nióbio (HNb) como catalisador em um reator Parr nas temperaturas de 125 °C e 135 °C. Uma conversão de 44 % e 53 % e uma seletividade para o HMF de 41 % e 33 % foram obtidas para a temperatura de 125 °C e 135°C respectivamente. O catalisador HNb apresentou um potencial para a produção de HMF e, além disso, o ajuste do modelo matemático revelou que para obter uma maior robustez do modelo será necessário avaliar a quantidade dos diferentes sítios presentes no catalisador, ou o modelo pode ser sensível ao efeito de incertezas nos parâmetros e condições iniciais na solução das equações diferenciais ordinárias.

Palavras chaves

5-Hidroximetilfurfural; Catálise Heterogênea ; Cinética

Introdução

A crescente dependência global por recursos não renováveis e o reflexo do impacto ambiental gerado pelo uso descontrolado desses têm incentivado várias pesquisas com o objetivo de desenvolver processos sustentáveis para a conversão de biomassa em compostos de plataforma química e combustíveis renováveis. O potencial dessa matéria-prima está nas diferentes fontes de obtenção, por exemplo, resíduos de culturas agrícolas, como casca de arroz, palha de trigo, bagaço de cana-de-açúcar e sabugo de milho, subprodutos florestais, como álamo, madeira de pinheiro e serragem e biomassa de algas (ZHANG et al., 2015). Dentre os possíveis compostos que podem ser obtidos a partir da utilização da biomassa, destaca-se o 5-hidroximetilfurfural (HMF). Este composto é descrito como uma importante plataforma química, uma vez que a partir dele podem ser obtidos biopolímeros, biocombustíveis, compostos químicos, produtos farmacêuticos, entre outros (WU et al., 2017). A rota para obtenção do HMF ocorre pela desidratação de hexoses (carboidratos com seis carbonos), sobre catálise ácida. Quando utilizados monossacarídeos simples, como a frutose, elevados rendimentos são obtidos em diferentes sistemas catalíticos (TANG; SU, 2019). No entanto, a utilização desse carboidrato encarece o processo, uma vez que, além de ser utilizado no ramo alimentício possui alto valor agregado. Assim, para obter uma produção industrial viável, tanto no ponto de vista econômico quanto de sustentabilidade, o mais indicado é a utilização de polissacarídeos, neste caso específico, os contidos nas biomassas lignocelulósicas (MUKHERJEE; DUMONT; RAGHAVAN, 2015). A desidratação direta de biomassa lignocelulósica a HMF é um sistema complexo que engloba sistemas de pré-tratamentos para isolar o polissacarídeo (celulose), seguido da despolimerização da celulose a monômeros de glicose, que posteriormente sofrem desidratação até a formação do HMF. Durante esse processo, há a possibilidade de reações laterais com à formação de co-produtos indesejáveis (MUKHERJEE; DUMONT; RAGHAVAN, 2015). Diante dessa matriz complexa, ao tentar converter diretamente a biomassa lignocelulósica a HMF, algumas pesquisas preferem inicialmente realizar os experimentos com uma matriz mais simples, utilizando carboidratos como a glicose(CANDU et al., 2019) ou a frutose (LI; YANG, 2014) para a produção de HMF. Ao utilizar a frutose, a mesma pode ser diretamente desidratada para a formação do HMF. Já na formação de HMF a partir da glicose, podem ocorrer duas situações. Na primeira ocorre isomerização da glicose a frutose e, em seguida, a frutose sofre três etapas de desidratação para a formação do HMF. Na segunda situação ocorre apenas a condensação da glicose levando a formação de huminas, não havendo produção de HMF (WANG; NOLTE; SHANKS, 2014). Os catalisadores utilizados na reação podem ser os ácidos homogêneos ou sólidos ácidos heterogêneos. Os ácidos homogêneos normalmente proporcionam elevados rendimentos, mas, em contrapartida, apresentam problemas de reciclagem e no tratamento dos resíduos. Já os catalisadores ácidos heterogêneos geralmente levam a menores rendimentos, porém permitem trabalhar com temperaturas mais elevadas, além de serem facilmente separados e reutilizados, contudo são mais propensos a problemas com incrustações, o que reduz sua atividade(MUKHERJEE; DUMONT; RAGHAVAN, 2015). Catalisadores ácidos contendo sítios de Lewis, possuem a propriedade de isomerizar a glicose a frutose, enquanto que os catalisadores contendo sítios de Bronsted exercem um efeito negativo na isomerização, no entanto são responsáveis pela desidratação da frutose a HMF (CATRINCK et al., 2017; ZHANG et al., 2015). Poucos catalisadores ácidos heterogêneos, utilizados em sistemas reacionais em meio aquoso mantém sua atividade e estabilidade sem a desativação dos seus sítios ácidos (CARNITI et al., 2006). Dentre eles destacam-se os catalisadores heterogêneo ácidos à base de nióbio, devido a suas fortes propriedades ácidas, como o ácido de nióbio (HNb), que contém 0,214 µmol de sítios de Lewis e 0,185 µmol de sítios de Bronsted por miligrama de catalisador. Além disso, contém uma função de acidez (H°) definida por Hammet e Deyrup de (H≤-5,6) (CATRINCK et al., 2017). Com base no exposto acima, o objetivo do presente trabalho foi determinar os parâmetros cinéticos da reação de desidratação da glicose em HMF.

Material e métodos

As reações foram realizadas no reator Parr 5500 Series Compact de 300 mL com controle de temperatura e agitação utilizando solução aquosa a 2% (m/v) de D- (+) Glucose (pureza ≥ 99.5%), adquirida da empresa Sigma-Aldrich, e o catalisador HNb, fornecido pela Companhia Brasileira de Metais e Metalurgia (CBMM) (MG). A relação mássica de glicose/catalisador utilizada foi (3:1) sendo 4,5 g de glicose para 1,5 g de catalisador. Inicialmente foi adicionado ao reator o volume de 220 mL de água destilada, a massa de glicose e de catalisador. Em seguida o reator é fechado e acomodado na base de aquecimento. Para obter um meio reacional inerte, a mistura reacional foi purgada por 10 min com gás nitrogênio antes do início da reação. As reações foram conduzidas a uma velocidade de agitação de 500 rpm, a 125 °C e 135 °C, durante 180 min, sendo retirada alíquotas a cada 30 min. O início da reação foi estabelecido como o momento em que a temperatura do reator atingisse a temperatura de reação pela primeira vez. As alíquotas tomadas foram resfriadas por imersão em banho de gelo, para cessar a reação e, em seguida, foram filtradas por meio de filtro seringa de 13 mm de diâmetro com poros de 0,22 µm e transferida para vials de 1,5 mL, que foram armazenadas em um geladeira até análise. Para a quantificação dos produtos e reagentes, foi realizada pela técnica de cromatografia líquida de alto desempenho (CLAE) com índice de refração (RID20A), com intuito de quantificar a glicose, frutose e HMF. Todos os componentes foram separados na coluna Aminex HPX-87H, 300 mm × 7,8 mm, com tamanho de partícula de 8 µm, tendo como fase móvel uma solução aquosa de ácido sulfúrico 5 mmol/L, com um fluxo de 0,6 mL/min aquecida a 60 °C. Para quantificação dos produtos e reagentes foi construída uma curva de calibração para cada composto a partir das áreas obtidas nos cromatogramas das misturas dos componentes nas concentrações de 3, 5, 10, 15, 20, 25, 30, 40, 50 e 120 mmol/L. Os reagentes utilizados para a curva de calibração foram a D-(+)- Glucose (pureza ≥ 99,5%), D-(+)-Frutose (pureza ≥ 99,0%), HMF (pureza ≥ 99,0%) adquiridos da empresa Sigma-Aldrich. Após quantificados os produtos e os reagentes, a conversão, rendimento e seletividade foram calculadas a partir das equações 1, 2 e 3, (Figura 1:A). A malha reacional proposta (Figura 1:C) consiste na isomerização da glicose em frutose. Além disso, ela pode sofre condensação gerando um polímero, denominado humina (Z1). A frutose formada é desidratada para a formação de HMF. A partir da malha, foi possível determinar as equações 4, 5, 6 e 7 (Figura 1:B) necessárias para a implementação e otimização do modelo cinético no programa computacional Matlab®. Para determinar as constantes cinéticas, o programa utiliza o método Runge-Kutta de quarta ordem, para integrar as equações do modelo, e a função lsqnonlin, para aplicar o algoritmo Levengerg-Marquardt na resolução de problemas de mínimos quadráticos.

Resultado e discussão

Inicialmente foram construídas as curvas de calibração e determinados os respectivos coeficiente de regressão linear (Figura 2:D). Para verificarmos o potencial do ácido nióbio como catalisador na reação de conversão de glicose em HMF foi realizado um experimento a 125 °C sendo observado a conversão de 44 % de glicose, obtendo-se rendimento e seletividade para o HMF de 18 % e 41 %, respectivamente. Já para temperatura de 135 °C a conversão da glicose foi de 53 % com 18 % de rendimento e 33 % de seletividade para o HMF. Valores semelhantes de conversão e seletividade foram reportados por Catrinck et al, 2017 e Zhang et al, 2015, na qual estudaram a utilização de catalisadores a base de nióbio para conversão de carboidratos a HMF. A atividade catalítica do ácido de nióbio resulta da presença de sítios ácidos de Lewis e Bronsted na superfície deste catalisador. Os sítios de Lewis são responsáveis pela isomerização da glicose em frutose, enquanto que os sítios de Bronsted são responsáveis pela desidratação da frutose em HMF. Na Figura 2:E, são apresentados os resultados em termos de conversão de glicose e a seletividade para o HMF. Os valores dos parâmetro cinéticos obtidos como resposta, após a otimização, estão apresentados na Figura 2:G. O aumento da temperatura e maiores tempos de reação levaram a um efeito favorável para o rendimentos de HMF, atingindo uma concentração máxima de 2,26 g/L a 125°C e 3,73 g/L a 135 °C. Nota-se que a 125 °C a seletividade para o HMF é crescente, atingindo um máximo de 41 % em 180 min. Já na temperatura de 135 °C, a seletividade atinge um máximo de 56,0 % em 30 min, e após esse tempo sofre flutuações, atingindo uma seletividade de 33 % em 180 min. Isso pode ser justificado pela possível hidratação do HMF para formação de compostos húmicos, ácido levulínico e fórmico, compostos esses que não foram detectados através da análise de CLAE. Tendo como base os gráficos apresentados na Figura 2:F, observa-se que houve um bom ajuste do modelo para a temperatura de 125 °C, levando em consideração os dados experimentais e o erro quadrático médio, em contrapartida, para a temperatura de 135 °C obteve-se ajuste moderado, quando comparado com o ajuste a 125 °C. Esse efeito pode ser explicado pela possível influência da quantidade de sítios ácidos de Lewis e de Bronsted, que não foi levada em consideração na modelagem matemática para determinação dos valores dos parâmetros cinéticos. Ao se elevar a temperatura reacional, obtém- se maiores taxas reacionais e maior conversão de glicose a 135°C quando comparado a 125°C, como pode ser observado na Figura 2:E. Este efeito pode aumentar a saturação dos sítios ácidos, intensificando a influência da quantidade dos sítios no modelo proposto. Outra possibilidade é a do modelo ser sensível ao efeito de incertezas nos parâmetros e condições iniciais na solução das equações diferenciais ordinárias.

Figura 1:Descrição dos Cálculos e Malha Reacional



Figura 2: Resultados Obtidos



Conclusões

A utilização do catalisador ácido de nióbio tem um efeito positivo para conversão da glicose a HMF. Tanto a temperatura quanto o tempo reacional têm efeitos na conversão da glicose e na formação do HMF. O modelo cinético de primeira ordem mostrou uma boa correlação entre os valores preditos e os dados experimentais para a temperatura de 125 °C e, além disso, revelou ser sensível ao aumento da temperatura. Outra característica que deve ser levada em consideração para ajustar o modelo é a quantidade de sítios ácidos de Lewis e de Bronsted do catalisador visando aumentar a robustez do modelo. Os resultados obtidos neste estudo são úteis para o desenvolvimento de futuros modelos cinéticos mais complexos para a reação de desidratação da glicose a HMF utilizando ácido de nióbio como catalisador, devendo-se para isto, levar-se em consideração a natureza dos sítios presentes no catalisador.

Agradecimentos

Ao professor Luciano Gomes Fieto pela colaboração pelas análises de CLAE, a CAPES pela concessão de bolsa e a CBMM pelo fornecimento do ácido de nióbio.

Referências

CANDU, N. et al. Efficient glucose dehydration to HMF onto Nb-BEA catalysts. Catalysis Today, v. 325, p. 109–116, 15 mar. 2019.

CARNITI, P. et al. Niobic acid and niobium phosphate as highly acidic viable catalysts in aqueous medium: Fructose dehydration reaction. Catalysis Today, v. 118, n. 3- 4 SPEC. ISS., p. 373–378, 15 dez. 2006.

CATRINCK, M. N. et al. Direct conversion of glucose to 5-hydroxymethylfurfural using a mixture of niobic acid and niobium phosphate as a solid acid catalyst. Fuel, v. 210, p. 67–74, 15 dez. 2017.

LI, H.; YANG, S. Catalytic transformation of fructose and sucrose to HMF with proline-derived ionic liquids under mild conditions. International Journal of Chemical Engineering, 2014.

MUKHERJEE, A.; DUMONT, M. J.; RAGHAVAN, V. Review: Sustainable production of hydroxymethylfurfural and levulinic acid: Challenges and opportunities. Biomass and Bioenergy. [S.l.]: Elsevier Ltd. , 1 jan. 2015

TANG, Z.; SU, J. Direct conversion of cellulose to 5-hydroxymethylfurfural (HMF) using an efficient and inexpensive boehmite catalyst. Carbohydrate Research, v. 481, p. 52–59, 15 jul. 2019.

WANG, Tianfu; NOLTE, Michael W.; SHANKS, Brent H. Catalytic dehydration of C6 carbohydrates for the production of hydroxymethylfurfural (HMF) as a versatile platform chemical. Green Chemistry, fev. 2014. , v. 16, n. 2, p. 548–572.

WU, H. et al. Co-production of HMF and gluconic acid from sucrose by chemo-enzymatic method. Chemical Engineering Journal, v. 327, p. 228–234, 2017.
ZHANG, Y. et al. Direct conversion of biomass-derived carbohydrates to 5-hydroxymethylfurural over water-tolerant niobium-based catalysts. Fuel, v. 139, p. 301–307, 1 jan. 2015.

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