EMPREGO DA ENTALPIA NO INFRAVERMELHO TÉRMICO COMO UM MÉTODO VERDE E DE ALTA FREQUÊNCIA ANALÍTICA PARA A DETERMINAÇÃO DO ÍNDICE DE SAPONIFICAÇÃO DE ÓLEOS COMESTÍVEIS

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Alimentos

Autores

Dalla Nora, F.M. (UFSM) ; Oliveira, A.S. (UFSM) ; Ferreira, D.F. (UFSM) ; Lucas, B.N. (UFSM) ; Voss, M. (UFSM) ; Alessio, K.O. (UFSM) ; Schlesner, S.K. (UFSM) ; Duarte, F.A. (UFSM) ; Wagner, R. (UFSM) ; Barin, J.S. (UFSM)

Resumo

O índice de saponificação (IS) é um dos parâmetros utilizados para avaliar a qualidade dos óleos comestíveis e é relacionado com o peso molecular médio dos ácidos graxos livres. É determinado por titulação após aquecimento com KOH. No entanto, este método requer uso de uma grande quantidade de reagente e energia. No presente trabalho, a TIE é proposta como método alternativo para determinação do IS com adequada precisão. O IS de diversos óleos foram determinados pela TIE e a concordância com o método oficial foi entre 97.4 a 102.1%. O método proposto, permitiu um aumento na frequência de análise bem como uma redução no consumo de energia, de amostra e de reagentes em 300, 625, 40 e 15 vezes, respectivamente, apresentando-se como um método de acordo com a química analítica verde.

Palavras chaves

TIE; Óleos vegetais; Química analítica verde

Introdução

Os óleos comestíveis são amplamente utilizados para a alimentação humana, processados ou em sua forma original, sendo que os mesmos são compostos principalmente por triglicerídeos e ácidos graxos livres (AZAM; WARIS; NAHAR, 2005; BOCKISCH, 1998). Diferentes parâmetros analíticos podem ser utilizados para avaliação da qualidade dos óleos, como a acidez, índices de iodo, peróxido e saponificação, que permitem informações sobre as características dos óleos crus e processados (AZAM; WARIS; NAHAR, 2005; SARIKAYA; BILGEN; AKBAŞ, 2016). O IS corresponde a quantidade de KOH necessária para a saponificação de 1 g de óleo, o qual está relacionado diretamente com o peso molecular médio dos ácidos graxos presentes no óleo. Portanto, valores elevados do IS estão relacionados com menor massa molecular de ácidos graxos livres, o que permite que este parâmeto ser empregado para a identificação de fraudes em óleos (AOAC, 2005). De acordo com a AOAC, o IS é determinado convencionalmente, pela titulação da amostras após sua ebulição com KOH por aproximadamente 30 minutos (AOAC, 2005). Outros métodos similares recomendados pela American Oil Chemists’ Society (AOCS) e o Instituto Adolfo Lutz também podem ser utilizados (AOAC, 2013; IAL, 1985). Porém é necessário um longo tempo de análise e um grande quantidade de reagentes químicos, o que vai contra os princípios da química verde (GAŁUSZKA; MIGASZEWSKI; NAMIEŚNIK, 2013). Recentemente, uma nova técnica analítica foi desenvolvida como uma alternativa aos método clássicos de titulação, sendo denominada entalpimetria no infravermelho térmico (TIE). Esta técnica combina a imagem termográfica no infravermelho com análise entalpimétrica e fornece uma análise rápida, simples, barata e de alto rendimento (BARIN ET AL., 2015). A TIE baseia-se na determinação da diferença de temperatura causada pela adição de um excesso estequiométrico de reagentes, permitindo uma determinação precisa de vários analitos (BARIN ET AL. 2015; TISCHER ET AL., 2017). Para isso, utilizam-se microplacas descartáveis e uma pipeta eletrônica multicanal. A variação de temperatura é monitorada por uma câmera infravermelha, que permite a determinação simultânea da temperatura de vários reações sem contato (BARIN ET AL., 2015). Considerando as características apresentadas pela TIE, o presente trabalho propõe o uso da mesma para o desenvolvimento de um método alternativo para a determinação do IS em óleos comestíveis. Um dispositivo especial foi construído para evitar a perda de reagentes durante o aquecimento e a influência da massa da amostra e do tempo de aquecimento foi otimizada durante o preparo da amostra. Parâmetros como velocidade de agitação e velocidade de dispensação foram avaliados quanto à determinação de KOH residual. A avaliação da precisão foi realizada pela comparação dos resultados obtidos pelo método convencional (AOAC 920.160) com o método proposto.

Material e métodos

Para o monitoramento da temperatura reacional pela TIE foi utilizada uma câmera termográfica (modelo E60, FLIR, EUA) e o software Research IR (FLIR, versão 3.5) foi utilizado para avaliação de imagens. As reações foram realizadas em microplacas descartáveis de polipropileno de 24 poços, com volume interno de 3,0 mL em cada poço. Foram utilizadas uma pipeta multicanal para dispensação dos reagentes e um agitador magnético para homogeneização das soluções. O processo de saponificação foi realizado em uma estufa. Para o método convencional foi utilizado um banho termostatizado juntamente com uma chapa de aquecimento e um sistema de condensação para saponificação da amostra (AOAC 920.160). Amostras de óleos de canola, milho, azeitona, arroz, soja e girassol de diferentes fabricantes foram adquiridas em um mercado local (Santa Maria, RS, Brasil). Para a construção da curva de calibração para determinação do IS pela TIE foi utilizada uma solução de hidróxido de potássio, padronizada com uma solução padrão de ácido sulfúrico. Ácido clorídrico foi utilizado para preparo do reagente em excesso estequiométrico pela TIE e também para titulação pelo método convencional. (MORITA & ASSUMPÇÃO, 1995). Foram avaliados os seguintes parâmetros pela TIE: massa de amostra, tempo de aquecimento, velocidade de agitação e dispensação. Para avaliação da velocidade de agitação e dispensação foi utilizada uma solução etanólica 0,71 mol L-1 KOH juntamente com uma solução de HCl 1,5 mol L-1 como reagente em excesso. Todos os resultados foram avaliados considerando o desvio padrão relativo (RSD) das medidas e a precisão do método proposto com base na comparação dos resultados obtidos com o método oficial AOAC 920.160. Para as análises por TIE, as amostras foram pesadas diretamente nos poços das placas. Após, foi adicionado à solução etanólica de KOH (0,7 mol L-1, 1,2 mL) para saponificação da amostra. Um sistema com placas de alumínio foi utilizado para vedação do sistema a fim de evitar perda de reagente por evaporação, após o sistema foi levado a estufa para aquecimento. Após a evaporação, as microplacas ficaram à temperatura ambiente e os resíduos foram dissolvidos em 1,2 mL de etanol seguido da adição de excesso estequiométrico de HCl (1,5 mol L-1, 1,2 mL) para a determinação do hidróxido de sódio restante. A temperatura foi monitorada antes e após a adição da solução de HCl, sendo que a diferença de temperatura foi calculada a partir da equação ΔT = Tf-Ti, onde Tf é a temperatura final e Ti é a temperatura inicial. Os valores de IS foram obtidos com base na quantidade de KOH consumida pela saponificação com base em uma curva de calibração. Para determinação do índice de saponificação pelo método convencional, seguiu-se o procedimento descrito pela AOAC 920.16 (AOAC, 2005).

Resultado e discussão

De acordo com Figura 1A, não foram encontradas diferenças estatísticas significativas entre o método proposto e o método convencional quando foram utilizadas massas distintas. No entanto, obteve-se um menor RSD (1,7%) utilizando uma massa de amostra de 120 mg. Por outro lado, quando a massa da amostra foi maior, houve um maior consumo de quantidades de KOH. Isso resultou em uma diminuição do sinal de reações, que podem influenciar o RSD. Além disso, o aumento na massa de amostras proporcionou maior formação de sabão que pode dificultar a homogeneização durante a dispensação do reagente em excesso, proporcionando um aumento no RSD. Pode ser observado que o uso de uma massa de amostra de 150 mg resultou em um RSD de 3,5%. Como consequência, a massa da amostra foi fixada em 120 mg, que corresponde a uma redução de 40 vezes em relação ao método convencional, de modo a proporcionar uma melhor otimização do tempo de aquecimento com o emprego da TIE. Para a otimização do tempo de aquecimento, o tempo de 5 h proporcionou os melhores valores de RSD (1,3%), pois em tempos mais curtos de aquecimento, a precisão dos resultados foi prejudicada. Pode-se observar na Figura 1B que com 1 h de aquecimento obteve-se um valor de RSD de 6,5%. Por outro lado, quando tempos de aquecimento maiores foram usados, houve uma diminuição dos valores de RSD, uma vez que havia uma maior uniformidade entre repetições. Assim, o tempo de 5 h foi fixado como tempo de aquecimento. A avaliação da velocidade de agitação é muito importante, pois o sinal depende da mistura de soluções e os resultados obtidos podem ser observados na Figura 1C. Para a velocidade de 100 rpm, foi obtido RSD de 7,9%, o que pode ser atribuído à falta de homogeneidade durante o excesso de adição de reagente. Maiores velocidades de agitação proporcionaram valores de RSD mais elevados, principalmente devido a projeção de solução dos poços. Desta forma, foi escolhida como melhor velocidade de agitação 200 rpm, que proporcionou valores RSD adequados (1,3%). Para a otimização da velocidade de dispensação os menores desvios foram obtidos quando a velocidade de 0,57 mL s-1 foi utilizada (Figura 1D). Desta forma, as condições que proporcionaram os menores desvios foram de 120 mg, 5 h, 200 rpm e 0,57 mL s-1 para a massa da amostra, tempo de aquecimento, e velocidade de agitação e dispensação, respectivamente. Estas condições foram escolhidas para posterior determinação de IS em óleos comestíveis. Após a otimização dos parâmetros da TIE, foram determinados o IS em óleos de canola, milho, azeitona, arroz, soja e girassol. O método convencional (AOAC 920.160) foi utilizado para verificar a exatidão do método proposto. A Tabela 1 mostra que não houve diferença significativa entre os método proposto e convencional (Teste t, p> 0,05), obtendo-se uma concordância de 97,4 a 102,1% para determinação de IS. Considerando estes resultados (Tabela 1), é possível observar que os desvios obtidos pela TIE foram ligeiramente superiores em comparação com o método convencional, uma vez que a massa de amostra utilizada foi 40 vezes menor que o método convencional. Este pequeno aumento nos desvios, no entanto, não prejudicou os resultados, uma vez que eles foram inferiores a 2,9%, o que é aceitável em uma análise de rotina. Além disso, a quantidade de reagentes utilizados como KOH, HCl, CaO e etanol diminuíram 41, 2, 14 e 14 vezes, respectivamente, pelo método proposto empregando TIE. A diminuição no uso de reagentes reflete em uma maior segurança do operador, uma vez que há menor contato com grande quantidade de produtos químicos, diminuindo os riscos físicos e de saúde. Cabe destacar, ainda, que a geração de resíduos diminuiu 15 vezes (em média) usando o método proposto. Outro aspecto importante da análise do IS por TIE é a possibilidade de determinar quatro amostras simultaneamente, fornecendo assim uma alta frequência de análise. No método proposto, é possível usar até uma centena de microplacas em uma estufa (considerando o tamanho do equipamento). Assim, mais de 300 amostras podem ser analisadas em uma hora, enquanto que no método convencional apenas uma ou duas amostras podem ser analisadas nesse tempo, mostrando a vantagem do método TIE proposto para a análise de rotina. Neste contexto, os conceitos de química analítica verde podem ser relacionados com o método proposto por TIE. No método proposto, a quantidade de amostra é reduzida, o uso de energia foi minimizado, a segurança do operador foi aumentada, a quantidade de resíduos analíticos foi diminuída e a precisão do método não foi comprometida, tornando a TIE uma ferramenta promissora para aplicação em análise de rotina para óleos comestíveis. (GAŁUSZKA; MIGASZEWSKI; NAMIEŚNIK, 2013; MELCHERT; REIS; ROCHA, 2012).







Conclusões

O método proposto usando a TIE que combina imagens térmicas no infravermelho com análise entalpimétrica permitiu a determinação do IS de óleos comestíveis e mostrou-se como uma alternativa promissora aos métodos convencionais. Os resultados obtidos apresentaram uma concordância adequada (variando de 97,4 a 102,1%) em relação aos métodos convencionais, com emprego de um menor tempo de análise. Além disso, o método convencional permitiu a análise de apenas uma ou duas amostras em 1 h, enquanto que no mesmo período de tempo o método proposto por TIE pode analisar até 300 amostras. Assim, o método proposto apresentou características importantes com relação aos princípios da química analítica verde, podendo ser facilmente empregado em análise de rotina para verificar a qualidade dos óleos.

Agradecimentos

Agradecimentos à CAPES, CNPq, FAPERGS e PETROBRAS pelo suporte neste estudo.

Referências

AZAM, M. M.; WARIS A.; NAHAR, N. M. Prospects and potential of fatty acid methyl esters of some non-traditional seed oils for use as biodiesel in India. Biomass and Bioenergy, v. 29, p. 293-302, 2005.

BOCKISCH, M. Chapter 1 - The Importance of Fats. In: Fats and Oils Handbook. AOCS Press, p.1-52, 1998.

SARIKAYA I, BILGEN S, AKBAŞ H. The production of fuel from, and the thermal stability of, sunflower oil, corn oil, and canola oil. Energy Sources, Part A: Recovery, Utilization, and Environmental Effects, v. 38, p. 3514-3520, 2016.

AOAC - American oil chemists' Society. Saponification number of oils and fars: AOAC 920.160, 2005.

GAŁUSZKA, A.; MIGASZEWSKI, Z.; NAMIEŚNIK, J. The 12 principles of green analytical chemistry and the significance mnemonic of green analytical practices. TrAC Trends in Analytical Chemistry, v. 50, p. 78-84, 2013.

AOCS - American oil chemists' Society. Determination of saponification value: Cd 3-25, USA, 2013.

IAL - Brasil, 1985, Normas Analíticas do Instituto Adolfo Lutz. Métodos químicos e físicos para análise de alimentos. In Instituto Adolfo Lutz (Ed.), vol. 16 (pp. 600–601). São Paulo, 1985.

MELCHERT, W. R.; REIS, B. F.; ROCHA, F. R. P. Green chemistry and the evolution of flow analysis. A review. Analytica Chimica Acta, v. 714, p. 8-19, 2012.

BARIN, J. S.; TISCHER, B.; OLIVEIRA, A. S.; WAGNER, R.; COSTA, A. B.; FLORES, E. M. M. Infrared Thermal Imaging: A Tool for Simple, Simultaneous, and High-Throughput Enthalpimetric Analysis. Analytical Chemistry, v. 87, p. 12065-12070, 2015.

TISCHER, B.; OLIVEIRA, A.S.; FERREIRA, D. F.; MENEZES, C. R.; DUARTE, F. A.; WAGNER, R.; BARIN, J. S. Rapid microplate, green method for high-throughput evaluation of vinegar acidity using thermal infrared enthalpimetry. Food Chemistry. v. 215, p. 17-21, 2017.

MORITA, T., ASSUMPÇÃO, R. M. V. Manual de soluções, reagentes e solventes: padronização, preparação, purificação. Edgard Blücher, 1995.

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