USO DE MODELOS MOLECULARES NA PERSPECTIVA INCLUSIVA: RELATOS DE EXPERIÊNCIAS DE UMA OFICINA VOLTADA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ensino de Química

Autores

Alves, D.F.S. (UFRJ) ; Mendes, C.F.P. (IFRJ) ; Ferreira, I.J. (IFRJ)

Resumo

Este trabalho visa relatar experiências de uma oficina de perspectiva inclusiva em química, que ocorreu no I Fórum sobre Inclusão em Centros e Museus de Ciência e Tecnologia, realizado no auditório do Horto Botânico do Museu Nacional - RJ. Na oficina referida, os participantes foram vendados e manipularam diversos modelos concretos de células unitárias de sólidos cristalinos e receberam explanações breves sobre conceitos importantes acerca de tais sólidos. A conclusão foi que professores de ciências da natureza precisam ter atenção à necessidade de ampliarem suas objetivações e seus enfoques em sala de aula, no sentido de utilizarem recursos que promovam um ensino e uma aprendizagem inclusivos e transformem suas salas de aula em ambientes mais atraentes a alunos videntes e não videntes.

Palavras chaves

Educação inclusiva; Modelos Moleculares; Sólidos Cristalinos

Introdução

O ensino de ciências por muitas vezes pode ser prazeroso aos docentes, mas muitos não conseguem identificar se a aprendizagem pelos alunos está sendo agradável também. Muitos estudos mostram que algumas barreiras que se estabeleceram entre alunos e a aprendizagem de ciências diversas vezes se dá pela forma como os professores lecionam em sala de aula. No ensino de Química, diversos conteúdos e/ou temas requerem uma atenção especial por parte dos professores, uma vez que podem trazer consigo conceitos que, se ensinados de maneira errada ou equivocada, podem levar o aluno a uma construção errônea de conhecimentos importantes. Para Lima e Lima-Neto (1999), a maneira como estruturas químicas e outros conceitos são lecionados levam os alunos a taxarem a Química como uma ciência dispensável e que não faça parte de seu cotidiano. Mediante tais fatos, há uma crescente mudança nas grades curriculares de instituições de ensino que formam professores de Química, de modo que ampliem o olhar do docente e tornem o mesmo capaz de atuar em diferentes ambientes de aula e faça uso de diversos recursos que possibilitem um melhor ensino e aprendizagem pelos alunos (VASCONCELOS; ARROIO, 2013). Muitos autores citam a possibilidade do uso de experimentações em disciplinas de química por parte dos professores como sendo uma forma de tornar as aulas mais atraentes aos alunos e fazer com que a construção de inúmeros conceitos seja mais eficiente. Porém, há também autores que citam a utilização de modelos concretos (moleculares ou não) como uma ferramenta importante capaz de proporcionar um ensino efetivo de muitos conceitos, sobretudo de estruturas químicas, pois eles permitem que tanto alunos como professores transitem por dimensões de conhecimento microscópicas, macroscópicas e simbólicas (ALVES, 2016). Assim como afirmam outros autores, Alves (2016) aponta que a utilização de ferramentas facilitadoras devem ser mais discutidas e estudadas por professores de química para que haja uma transformação na maneira como diversos conteúdos são classicamente ensinados e devem facilitar o processo de aprendizagem por parte dos alunos. Ele afirma ainda que as dificuldades de aprendizado de muitos alunos podem estar relacionadas a percalços e/ou resistências apresentadas pelos docentes quanto ao uso de novos recursos e metodologias, que podem em diversas vezes colaborar como uma ferramenta auxiliadora do processo de aprendizagem. Nesse sentido, modelos concretos podem ser indicados como ferramentas que requerem uma atenção especial por parte dos docentes, uma vez que podem proporcionar resultados muito positivos no ensino de Química. Muitos autores definem os modelos em geral, mas a definição Ferreira e Justi (2005) os melhor conceituam, pois eles dizem que os modelos são “representações parciais de objetos, ideias ou fenômenos e são, por muitas vezes, produzidos e/ou construídos com objetivos específicos dentro do processo de ensino e aprendizado” (ALVES, 2016). Além da possibilidade de se fazer um ensino efetivo com tais ferramentas, os modelos concretos também podem ser feitos a partir de materiais de baixo custo, o que confere uma vantagem a eles. Além disso, modelos concretos podem atuar como ferramentas inclusivas, aliados a permissão de um desenvolvimento cognitivo e um estímulo sensorial dos alunos por conta da manipulação dos mesmos (Orlando et al., 2009). Os materiais utilizados na construção dos modelos concretos podem auxiliar na inserção de alunos não videntes nas aulas de Química e promover um ensino de diversos conteúdos que, talvez sem o auxílio deles, não seria possível. Além disso, tal instrumento pode colaborar para o desenvolvimento de outras habilidades em alunos videntes, como noções de tridimensionalidade, intuições espaciais e a criatividade na resolução de problemas e construção de conceitos. Por isso, Alves (2016) defende a utilização de materiais com cores, texturas, tamanhos e formatos variados, de modo que alunos videntes e não videntes sejam estimulados sensorialmente e consigam identificar por meio da visão e/ou do tato diferenças entre as moléculas, átomos ou íons representados. Ele ainda diz que tal ferramenta pode ser utilizada em diversos níveis de ensino, ou seja, pode ser utilizado no ensino fundamental, médio e superior. Nesse sentido, promover oficinas e outros eventos que estimulem os professores a conhecerem e utilizarem ferramentas facilitadoras e inclusivas torna-se primordial no ensino de Química.

Material e métodos

A oficina referida ocorreu no I Fórum sobre Inclusão em Centros e Museus de Ciência e Tecnologia, realizada no auditório do Horto Botânico do Museu Nacional, localizado na Quinta da Boa Vista - São Cristóvão, Rio de Janeiro. O qual foi organizado e realizado pela Seção de Assistência ao Ensino do Museu Nacional/UFRJ e pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro (IFRJ) em julho de 2016. Na oficina, foi verificada a presença de 11 participantes, de ambos os sexos, com idades entre 20 e 60 anos, dentre os quais havia profissionais do ramo da educação, de Química, áreas afins e outras, sendo todos voluntários em suas participações. Por conta de uma alteração na grade horária do evento, as pessoas com deficiência visual convidadas a participar da oficina não puderam estar, fazendo com que esta fosse ministrada apenas para profissionais da área de educação. Cada participante foi vendado, de modo que simulasse a realidade das condições visuais de alunos não videntes. O participante recebia em mãos um modelo concreto de uma célula unitária de um sólido cristalino e era orientado a manusear e identificar características dos modelos. Tais características eram direcionadas para explicações que corroborassem na identificação das particularidades das representações das substâncias referidas e dos objetos utilizados na construção do modelo, de modo que o participante compreendesse a estrutura que o modelo representava. Após isso, cada participante teve sua venda de tecido retirada e foi posto frente a 8 modelos concretos de células unitárias para identificar qual estrutura foi manuseada por ele. Os participantes recebiam outras explanações sobre as diferentes estruturas presentes na mesa, de modo que se assemelhasse a uma aula expositiva para alunos videntes e não videntes em um mesmo ambiente de aula. Feito isso, eles puderam fazer suas considerações a respeito da oficina, da metodologia utilizada, da construção dos modelos e observações gerais sobre o panorama de ensino inclusivo no Brasil e da importância do uso de novas ferramentas inclusivas no ensino de Química. Os modelos utilizados na oficina foram construídos com materiais acessíveis, de baixo custo e suas produções foram inteiramente artesanais. Para representar as espécies (átomos ou íons) das substâncias, utilizaram-se bolas de isopor de tamanhos entre 35 e 50 mm que foram pintadas com tintas acrílicas e para presentar as ligações químicas foram utilizados palitos de churrasco, como mostra a figura 1. Os modelos concretos utilizados representavam as seguintes substâncias (figura 1): cloreto de sódio, cloreto de césio, sulfeto de zinco, ferro metálico (CCC) e ferro metálico (CFC). Os outros três modelos representavam células unitárias de sólidos cristalinos genéricos com as seguintes estruturas: Ortorrômbico, Cúbico simples e Hexagonal simples. Algumas imagens da participação dos voluntários também são apresentadas na figura 2.

Resultado e discussão

Os resultados apresentados na oficina foram registrados em imagens e vídeos autorizados pelos participantes. Cada um deles teve a oportunidade de expressar ideias, participar de discussões feitas durante a realização da oficina sobre os caminhos que a educação no Brasil tem tomado e como ferramentas facilitadoras podem ser inseridas num contexto educacional de modo que insiram alunos não videntes em aulas regulares com alunos videntes. Também foram registradas algumas limitações e sugestões de melhorias dos modelos concretos pelos participantes. Com relação a melhorias nos modelos, 5 participantes corroboraram com Alves (2016) ao indicarem que a possibilidade da utilização de texturas na construção dos modelos colaboraria para um melhor aprendizado de alunos não videntes, uma vez que estes conseguiriam diferenciar melhor espécies químicas de raios atômicos ou iônicos aproximados representados por bolinhas de isopor do mesmo tamanho. Esse apontamento poderia ser aplicado no modelo da célula unitária do cloreto de césio (CsCl), pois este apresenta espécies cloreto e espécies césio (I) de raios muito aproximados. A representação da célula unitária deste composto foi feita num modelo concreto utilizando esferas de isopor de 50 mm, que foram diferenciadas apenas pela coloração. Neste caso, os alunos com deficiência visual poderiam apresentar dificuldades na diferenciação entre as espécies cloreto e césio (I). Os participantes foram unânimes em duas colocações importantes: o uso de modelos concretos durante aulas de estruturas químicas se faz necessário e deve ser mais trabalhado nos cursos de licenciatura em química; os modelos concretos utilizados na oficina apresentavam uma característica atrativa tanto para alunos videntes quanto não videntes. A primeira colocação vai ao encontro a observações feitas por Lima e Lima-Neto (1999) e por Vasconcelos e Arroio (2013). Sabe-se que o ensino de Química sofreu muitos atrasados no que diz respeito à utilização de novas técnicas, metodologias e mecanismos que colaborassem para um aprendizado mais efetivo e um abandono da simples memorização de termos para que os alunos fizessem mais associações entre os conceitos vistos em sala de aula e situações cotidianas vividas por eles. A maneira tradicionalista como muitos professores atuam em sala de aula, colaborou por muitos anos para que a Química fosse reputada como uma matéria de pouca serventia pelos alunos, sobretudo alunos do ensino médio. Frente a tamanhas discussões e propostas de melhorias da forma como o ensino da disciplina em questão se deu ao longo dos anos, cabe aos profissionais de educação buscar novas ferramentas, novas metodologias e novos “olhares” sobre o mesmo. Com relação a segunda colocação de que “os modelos concretos utilizados na oficina apresentavam uma característica atrativa tanto para alunos videntes quanto não videntes”, foi-se observado um bom envolvimentos dos participantes na oficina, motivado pelo contato com os modelos e possibilidade de manipulação dos mesmos, o que não pode ser feito com as tradicionais figuras registradas nos livros didáticos. Muitos dos participantes eram profissionais de Química e, mesmo vendados, rapidamente identificavam o tipo de estruturas que estavam manipulando, principalmente os modelos de sistemas cúbicos. Ao retirarem a venda, os participantes mostravam satisfação na manipulação e visualização dos modelos, por conta das cores utilizadas e do tamanho das bolinhas de isopor utilizadas. Isso colaborou para que eles afirmassem que os modelos seriam atrativos tanto para alunos videntes quanto para alunos não videntes. Dentre eles, 3 participantes relataram ter apresentado dificuldades na compreensão de conceitos envolvendo estruturas de células unitárias durante a graduação em Química e disseram que teriam realizado um aprendizado melhor se tivessem contato com modelos concretos ao estudarem tal tema. Uma participante, que informou ser da área de pedagogia, salientou a importância da publicação de artigos e outras obras científicas que auxiliem os professores na construção de modelos concretos e na utilização dos mesmos em sala de aula. Por isso, fazem-se necessários estudos e divulgações de trabalhos que envolvam a utilização de tais instrumentos, assim como direcionem os professores a uma utilização correta dos mesmos.







Conclusões

Cada vez mais se torna necessária a utilização de recursos que permitam um ensino voltado à inclusão de pessoas com deficiência visual nas aulas de Química nos diversos níveis de ensino.

Agradecimentos

Agradecemos aos participantes da oficina, aos professores do IFRJ que participaram da idealização e realização do evento e a toda equipe que promoveu o Fórum.

Referências

ALVES, D. F. S. Os modelos concretos e suas colaborações no estudo de sólidos inorgânicos. 2016. 55 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Licenciatura em Química) – Instituto Federal de Educação Ciência e Tecnologia do Rio de Janeiro, Nilópolis, 2016.

FERREIRA, P. F. M.; JUSTI, R. S. Atividades de construção de modelos e ações envolvidas. In: V Encontro Nacional de Pesquisa em Ensino de Ciências, 5, 2005, Bauru. Atas do V ENPEC. Bauru: ABRAPEC, 2005. p. 1-12.

LIMA, M. B.; LIMA-NETO, P. Construção de modelos para ilustração de estruturas moleculares em aulas de Química. Química Nova, São Paulo, vol. 22, n.6, p. 903-906, 1999.

VASCONCELOS, F. C. G. C.; ARROIO, A. Explorando as percepções de professores em serviço sobre as visualizações no ensino de química. Química Nova, São Paulo, vol. 36, n. 8, p. 1242-1247, 2013.

ORLANDO, T. C.; LIMA, A. R.; SILVA, A. M.; FUZISSAKI, C. N.; RAMOS, C. L.; MACHADO, D.; FERNANDES, F. F.; LORENZI, J. C. C.; LIMA, M. A.; GARDIM, S.; BARBOSA, V. C.; TRÉZ, T. A. Planejamento, montagem e aplicação de modelos didáticos para abordagem de biologia celular e molecular no ensino médio por graduandos de ciências biológicas. Revista Brasileira de Ensino de Bioquímica e Biologia Molecular, vol. 1, fev. 2009.

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