O PROCESSO DE PREPARAÇÃO DA BEBIDA INDÍGENA TARUBÁ COMO TEMA GERADOR PARA O ENSINO DE QUÍMICA

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ensino de Química

Autores

Cardoso, A.M.C. (UEPA) ; Lobo-santos, V. (UNESP/UEPA) ; Coelho, A.C.S. (UEPA) ; Ayres, J.L. (UNESP/UEPA) ; Martins, M.M.M. (UNESP/UEPA)

Resumo

O trabalho realizou-se na Escola Indígena da Aldeia dos Arapyun, oeste do Pará, com o objetivo de utilizar conhecimentos sobre a preparação da bebida indígena Tarubá como ancoragem social dos conteúdos de Química, na forma de tema gerador, numa turma de 1º ano/ensino médio. Primeiramente, houve uma pesquisa exploratória, para conhecer as tradições do povo indígena Arapyun com relação às bebidas tradicionais. Após, houve a construção e aplicação, junto aos alunos, de um material didático, na forma de cartilha, sobre o processo de preparação do Tarubá, relacionado aos conteúdos de Química. Finalmente, percebeu-se a importância do material elaborado pelo interesse e participação dos alunos nas atividades desenvolvidas, ampliando os saberes ancestrais e a construção dos conhecimentos químicos.

Palavras chaves

ENSINO DE QUÍMICA; EDUCAÇÃO ESCOLAR INDÍGENA; BEBIDA INDÍGENA TARUBÁ

Introdução

A educação escolar indígena é diferenciada, por lei, das demais escolas dos sistemas de ensino no país. Com o apoio da Constituição de 1988, a LDB (Lei 9.394/96), criou a educação escolar específica, diferenciada, intercultural e bilíngue, com o devido respeito ao conhecimento tradicional, aos processos próprios de ensino e aprendizagem, onde possam contextualizar a teoria com as práticas indígenas, lhes assegurando a elaboração e publicação de material didático específico e diferenciado para as escolas indígenas (GRUPIONI, 2002). Nesta perspectiva, utilizou-se a bebida indígena Tarubá, que é obtida a partir do processo de fermentação da mandioca, como tema gerador de Química, e elaborou-se uma cartilha educativa, destacando o passo a passo do preparo da bebida, relacionando com os conteúdos, como as misturas homogêneas e heterogêneas, os processos de separação de mistura e o processo de fermentação, com o intuito de ser utilizado como material didático nas escolas indígenas. A este processo, que relaciona os conteúdos curriculares às experiências culturais dos estudantes e ao mundo concreto, chama-se ancoragem social dos conteúdos, segundo Candau & Moreira (2007). Adotou-se a bebida como um Tema Gerador, conforme Freire (1993), favorecendo a problematização dos conhecimentos e da realidade. Para o autor, a investigação da realidade deve ocorrer pela Investigação Temática, com base no diálogo e no contexto sociocultural. Delizoicov e Angotti (1991), sob esta mesma base, recomendam que o trabalho com os conteúdos curriculares se dê em três momentos: problematização, organização e aplicação do conhecimento. Busca-se, com isso, que os alunos indígenas compreendam como a Química está presente em seu cotidiano, associando a teoria às práticas culturais de sua realidade.

Material e métodos

Desenvolveu-se uma proposta pedagógica, de abordagem qualitativa, em uma turma de 10 alunos, de 1º ano do ensino médio, da escola indígena Arapyun, na aldeia de Vila Franca-PA, a partir de uma pesquisa exploratória na comunidade sobre os costumes tradicionais, no que se referem ao preparo do Tarubá. Durante a pesquisa, foram entrevistados os moradores mais velhos da comunidade, e alguns jovens, sobre os saberes do processo de preparação do Tarubá, a frequência e as ocasiões em que a bebida é consumida, além de informações sobre o conhecimento e percepções do ensino do preparo dessas bebidas na escola. Assim, foram identificados possíveis conteúdos de Química que poderiam estar relacionados com a preparação do Tarubá, como misturas, separação de misturas e processos de fermentação. O processo de preparação da bebida feita da mandioca ralada, envolve a separação da mistura entre o sólido da massa da mandioca e o líquido do tucupi, feito através do processo de filtração com o tipiti, instrumento tradicional indígena. A massa é peneirada, assada e colocada em repouso por três dias, quando ocorre o processo de fermentação, em que o açúcar, contido na mandioca, é processado pelos microrganismos e transformado em outras substâncias, como álcool e gases. Após esse período, se adicionam água e açúcar à massa coada, estando a bebida pronta para ser consumida. Esse longo processo foi realizado com os alunos na escola, analisando as etapas de preparação da bebida à luz dos conceitos de Química, promovendo a participação ativa dos estudantes durante a aula, durante a elaboração do material didático, aumentando o nível de socialização, desempenho e compreensão dos conceitos científicos, ampliando sua visão da ciência, sua aplicação na vida e a valorização de suas heranças culturais.

Resultado e discussão

Como resultado da pesquisa, foi elaborado, juntamente com os alunos, um material didático, na forma de cartilha, que apresenta os costumes culturais tradicionais do povo Arapyun, mostrando por meio de imagens e textos os instrumentos utilizados em todas as etapas do longo e complexo processo de preparação do Tarubá, contextualizando os conceitos químicos curriculares, com base nos pressupostos teórico-metodológicos da área de ensino de Ciências. A cartilha relaciona os processos envolvidos na preparação da bebida ao conteúdo de Química, com sugestões de atividades didáticas para o trabalho com os alunos da escola indígena. O processo avaliativo foi contínuo e levou em consideração as percepções e aprendizados dos alunos na direção da aproximação dos conhecimentos tradicionais e científicos no contexto cultural, como contribuição ao fortalecimento da cultura tradicional indígena. A partir dos resultados obtidos, pode-se perceber que o conhecimento da preparação do Tarubá é repassado entre as gerações da comunidade, porém os moradores mais jovens estão perdendo o interesse no preparo da bebida, principalmente pela facilidade no consumo de bebidas industrializadas. Conforme Zanotto (2016), cabe ao professor destacar esses saberes culturais e suas relações com os saberes formais, com base em um aprofundamento progressivo da racionalização. Candau & Moreira (2007) propõem que se evidenciem, no currículo, a construção social e os rumos subsequentes dos conhecimentos, cujas raízes históricas e culturais tendem a ser usualmente “esquecidas”. Nesse sentido, urge que se discutam os rumos dos conhecimentos ancestrais, problematizando a tensão entre os diferentes tipos de saberes, tradicionalmente dicotomizados, na perspectiva do empoderamento e valorização.

Conclusões

A contribuição da comunidade, professores e alunos neste trabalho se deu no sentido de promover a contextualização dos conteúdos de Química no cotidiano da aldeia, principalmente em relação ao preparo e conservação de suas bebidas. Durante a construção da cartilha, foi possível perceber o grande interesse e a participação dos alunos nas atividades desenvolvidas, respeitando as especificidades das escolas indígenas, visto que a Educação Escolar Indígena deve ser conduzida pela comunidade indígena, reconhecendo a diversidade cultural e valorizando os costumes e tradições dos povos indígenas.

Agradecimentos

Universidade do Estado do Pará – UEPA, através do DINTER – UNESP/Bauru, São Paulo, Brasil Portaria MEC Nº 1077, 03/09/12. Aos Professores do DINTER.

Referências

BRASIL. Câmara dos Deputados. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional: Lei n° 9.394, de 20 de dezembro de 1996. 11. Ed. – Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2015. – (Série legislação; n.159).
CANDAU, Vera Maria & MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa. Indagações sobre Currículo: currículo, conhecimento e cultura; organização do documento Jeanete Beauchamp, Sandra Denise Pagel, Aricélia Ribeiro do Nascimento. – Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2007.
DELIZOICOV, D.; ANGOTTI, J.A. Metodologia do Ensino de Ciências. São Paulo: Cortez, 1991.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paz e terra, 1993.
GRUPIONI, Luís Donisete Benzi. Legislação Escolar Indígena, in MARFAN, Marilda Almeida (org). Congresso Brasileiro de Qualidade na Educação: formação de professores: educação indígena. Vol. 4. Brasília: MEC, SEF, 2002.
ZANOTTO, R. L., SILVEIRA, R. M. C. F. e SAUER, E. Ensino de conceitos químicos em um enfoque CTS a partir de saberes populares. Ciência Educação, Bauru, v. 22, n. 3, p. 727-740, 2016.

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