Programa de Tutoria em Química Geral e Analítica para o Bacharelado em Ciências Agrárias

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ensino de Química

Autores

Botelho, L.B. (UNIV. FED. DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI) ; Fróes, V.R.N.J.F. (UNIV. FED. DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI) ; Camargos, A.P.V. (UNIV. FED. DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI) ; Rosa, V.H.S. (ESCOLA ESTADUAL VIRGÍLIO DE MELO FRANCO) ; Santos, M.G.M. (ESCOLA ESTADUAL VIRGÍLIO DE MELO FRANCO) ; Pereira, M.S.C. (UNIV. FED. DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI)

Resumo

Neste trabalho foi analisado a eficiência da tutoria como recurso didático para a aprendizagem de conteúdos da disciplina de Química Geral e Analítica no Bacharelado em Ciências Agrárias (BCA)/UFVJM/Campus Unaí. Foram aplicados questionários iniciais no início de cada semestre letivo com intuito de verificar o interesse dos alunos pela disciplina e pela tutoria. Durante o semestre, os tutores deram suporte aos alunos com relação ao conteúdo de química. Ao final do semestre, com o objetivo de verificar o impacto que a tutoria causou e se o aprendizado dos alunos foi significativo, foram aplicados questionários finais. Nesta pesquisa, os resultados apontaram que a tutoria foi eficaz para reduzir a retenção na disciplina e que este programa deve permanecer no BCA.

Palavras chaves

Tutoria em Química; Ciências Agrárias; Recurso Didático

Introdução

De acordo com Gadotti (2000), o processo ensino–aprendizagem impõe uma nova forma de saber-fazer. Pensando neste tema, o curso de Bacharelado em Ciências Agrárias (BCA) do Instituto de Ciências Agrárias (ICA) da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) concebe a função do ensino superior numa perspectiva de construção do conhecimento a partir do saber-fazer, associando teoria e prática como agente estimulante da investigação e reflexão crítica sobre os problemas da realidade. Gasparim (2007) ressalta que o papel do professor é ser provocador, facilitador e orientador, assumindo a responsabilidade social com relação à construção do conhecimento científico dos alunos. É dever do professor estimular a capacidade cognitiva do aluno conforme os quatro pilares do conhecimento: aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver e aprender a ser (DÉLORS, 2001). Vários autores sugerem que para se ter um aprendizado efetivo, deve-se substituir a metodologia de ensino baseada no método tradicional de ensino, estereotipado, por situações que estimulem o trabalho participativo, atividades de aprendizagem interativas e com trocas de experiências (FONTANIVE; KLEIN, 2010). Nos últimos anos tem-se observado um aumento da preocupação com relação à diversificação das metodologias empregadas no ensino de química. A utilização de estratégias inovadoras tem sido observada tanto na Educação Básica quanto no Ensino Superior (SANTOS Jr. et al., 2016; VALDERRAMA et al., 2016). O Curso de Ciências Agrárias do ICA, visando a execução do Projeto Pedagógico, viabiliza por meio do currículo, a articulação entre o ensino e a prática em ciências agrárias. O foco concentra-se no cenário local e regional, levando-se em conta as características do meio sociocultural onde esse processo se desenvolve. Nessa perspectiva, o significado de cada disciplina que compõe o Projeto Pedagógico não pode resultar de uma apreciação isolada de seu conteúdo, mas do modo como se articulam em seu conjunto. Segundo Augusto et al. (2004), é preciso pensar a educação de forma interdisciplinar, superando a abordagem disciplinar tradicionalmente fragmentária. Desde a década de 70 os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) contribuem para propagar esta ideia e ressaltam a importância de, continuamente, ligar o conhecimento científico com a complexidade do mundo, superando a dicotomia entre teoria e prática. Desta forma, a interdisciplinaridade deve ser prioridade no curso de Ciências Agrárias e a implantação de um programa de Tutoria é peça fundamental na construção deste processo.

Material e métodos

O referido programa de tutoria conta com tutores discentes veteranos responsáveis pelo acompanhamento de um grupo de estudantes calouros, que são os tutorandos, ou seja, alunos ingressantes no Curso de Ciências Agrárias. O docente tutor e os discentes tutores inicialmente realizam um diagnóstico junto aos calouros, identificando as principais carências para, em conjunto, criarem alternativas que minimizem as retenções e o baixo rendimento na disciplina de Química Geral e Analítica. O Tutor Docente tem a responsabilidade de acompanhar, avaliar e incentivar os tutores. O Tutor Discente tem a função de ser o elo entre calouros e docente, identificar junto aos calouros as principais carências, apoiar os calouros para uma melhor adaptação ao ambiente universitário, indicar atividades extracurriculares e apoiar os calouros no que diz respeito ao conhecimento dos auxílios e bolsas existentes na Universidade.

Resultado e discussão

Durante o 1º semestre de 2016 foi aplicado um questionário online no início do semestre para 197 alunos, onde apenas 92 alunos responderam, correspondendo a aproximadamente 47% do total da turma. Com relação ao segundo semestre de 2016 aplicou-se, inicialmente, um questionário impresso a 116 alunos, uma vez que o questionário online teve pouca adesão. Os dados serão analisados de forma cronológica, conforme consta a seguir: 1) Análise dos dados referentes ao 1º semestre/2016. Um questionário semelhante ao da Tabela 1 foi aplicado para 197 alunos que constavam matriculados na disciplina Química Geral e Analítica durante o 1º semestre/2016. Esse questionário foi aplicado usando a plataforma online SurveyMonkey, que possibilita enviar o link da página com os questionários por várias plataformas. O acesso ficou disponível durante um mês para que os alunos pudessem responder ao questionário online e somente 92 alunos responderam o mesmo, totalizando apenas 47% dos alunos matriculados na disciplina de Química Geral e Analítica. Observou-se que a maioria dos alunos, cerca de 74% gostam da disciplina. A segunda questão refere-se à importância da Química para o curso de Bacharelado em Ciências Agrárias (BCA), onde a maioria (96%) dos alunos considera que a disciplina tem grande importância no curso. Tal percentual ficou bem semelhante quando comparado com as respostas dadas pelos alunos do 2º semestre de 2015 a este mesmo questionamento. Cerca de 56,5% dos discentes informaram que tiveram dificuldades moderadas com a matéria de química no Ensino Médio. Tal resultado está de acordo com Cordeiro e Oliveira (2011), os quais afirmam sobre a dificuldade encontrada pelos alunos na área da química. O ensino de química no nível médio tem se tornado cansativo e complicado do ponto de vista do alunado, estando tal fato relacionado à forma como a disciplina é ministrada, ou seja, o docente apresenta o conteúdo e os alunos ouvem e memorizam (PEREIRA, 2014). A quarta questão indaga sobre o interesse dos alunos em procurar pela tutoria durante o semestre, onde 76% dos discentes afirmaram ter a intenção de procurar por essa ajuda nos estudos. A intenção da quinta pergunta foi verificar o quanto os alunos conseguem perceber os conceitos químicos no cotidiano. Tal fato é importante porque auxilia o indivíduo a interpretar os fenômenos diários e realizar intervenções objetivas. Observou-se que 64% dos alunos percebem a interação da química com o dia-a-dia e 36% veem esta interação de forma menos corriqueira. Um ponto positivo é que nenhum discente informou que a química não está presente no cotidiano de todos nós. De acordo com Santos e Mortimer (1999), usar exemplos do cotidiano e materiais alternativos influenciam e contribuem para o bom aprendizado do discente. Observou-se que a grande maioria, ou seja, 92% dos discentes, afirmou que as aulas de laboratório facilitam a aprendizagem da química. Já a questão 8 (oito) procura identificar se o interesse dos alunos pela química aumentará com as aulas práticas. Cerca de 92% dos discentes afirmam aumentar o interesse pelo estudo da química com a inserção das aulas laboratoriais. Este dado reforça o observado na sexta questão, onde também 92% dos discentes afirmaram que as aulas práticas facilitam a aprendizagem da disciplina. Estes resultados estão de acordo com o que ressalta Francisco (2008), o qual afirma que as atividades experimentais estimulam o interesse dos alunos em sala de aula e o engajamento em atividades subsequentes, compreendendo melhor o meio que os cerca. A última questão (Tabela 1) demonstrou que aproximadamente 89% dos alunos consideram a disciplina de química como sendo muito importante para a área de formação. A Tabela 2 demonstra a distribuição das turmas por períodos, com suas respectivas quantidades de alunos matriculados e aprovados. Conforme pode-se observar, não houve aumento no índice de aprovação na disciplina de Química do 1º semestre/2015 para o 2º semestre/2015. Com a implantação do programa de tutoria no 2º semestre/2015, esperava-se um aumento no índice de aprovação. Entretanto, como já mencionado anteriormente, devido o programa de tutoria ter sido implantado no 2º semestre/2015, os alunos deste período estavam passando por um período de adaptação a este tipo de auxílio nos estudos. Esta realidade apresentou-se de forma positiva no 1º semestre/2016, onde houve um aumento de 6% no índice de aprovação com relação ao semestre anterior (Tabela 2). Espera-se que este índice de aprovação seja sempre crescente, sabendo que a tutoria é apenas um item dentre os diversos existentes dentro da dinâmica de uma disciplina. Após as análises dos questionários, pôde-se concluir que a maioria dos alunos reconhece a importância do tutor no processo de aprendizagem, entretanto não busca auxílio do mesmo durante o semestre. Um dos objetivos da tutoria é auxiliar na redução dos índices de evasão e retenção. Até o presente momento, devido à baixa procura pela tutoria, esta análise não será tão representativa. 2) Análise dos dados referentes ao 2º semestre/2016. Aproximadamente 93% dos alunos consideram a Química importante para o curso entretanto, 59% dos alunos afirmaram que tiveram dificuldade na aprendizagem da Química durante o ensino médio. Sendo assim, entende-se que a base para o Ensino Superior está defasada. Com o intuito de avaliar o interesse dos discentes em sanar suas dúvidas com relação à Química, foi questionado se pretendiam procurar auxílio da tutoria durante o semestre. O resultado foi bastante favorável, haja vista que 84,5% dos alunos responderam que sim. Esses números demonstram a importância do programa de tutoria, uma vez que, quando é oferecida a oportunidade os alunos pretendem aproveitá-la ao máximo. De acordo com o proposto por Posner et al. (1982) e Hewson (1981), a eficácia de um programa de tutoria pode ser bem explicada pelo modelo de aprendizagem como um processo de mudanças conceituais. A quinta questão analisa a expectativa dos alunos frente ao programa de tutoria. Cerca de 90% dos discentes afirmaram que o programa pode facilitar o aprendizado da disciplina. Esse resultado serve de estímulo à professora coordenadora do projeto e ao tutor, já que a maioria acredita no projeto e acha que o mesmo é relevante. De acordo com Braathen (1987), um programa de tutoria em Química é extremamente eficiente em atenuar o problema de conhecimento prévio insuficiente. A metodologia adotada para a disciplina de Química durante o semestre, alternando teoria/exercícios/seminários é bem aceita por cerca de 64% dos alunos, de acordo com as respostas obtidas para a questão 6 (seis). Para Trevisan e Martins (2008), conciliar as aulas teóricas com as aulas práticas em laboratório é de fundamental importância pois fortalece a aprendizagem do aluno. De acordo com a questão 7 (sete), observa-se que apenas 46,5% dos discentes veem interação da Química com o cotidiano. Tal fato demonstra que os alunos precisam de mais exemplos práticos na formação básica para aumentar o interesse deles, facilitando a aprendizagem e a assimilação da Química de forma interdisciplinar. De acordo com Hackmayer e Bohadana (2014) “docente é o professor que concebe, que cria, que é capaz de gerir o sistema” e, sendo assim, cabe ao mesmo facilitar a aprendizagem dos alunos, explorando de forma mais intensa os exemplos práticos da área da química. O tutor também é um docente (HACKMAYER; BOHADANA, 2014), entretanto este papel principal é do docente tutor. Por fim, a última questão objetiva indagou sobre a importância da Química para a própria formação profissional dos alunos, onde 85% dos mesmos afirmaram que a Química era muito importante, em uma escala de 0 a 5, onde 5 era muito importante e 0 era nada importante. O percentual das notas 4 e 5 somaram 85% dos resultados.

Tabela 1. Questionário inicial aplicado aos alunos que cursaram a disciplina Química Geral e Analítica durante o 1º Semestre/2016.


Tabela 2. Distribuição das turmas por períodos, com suas respectivas quantidades de alunos matriculados e aprovados.

Conclusões

Após a análise destes questionários, observa-se que o programa de tutoria é fundamental para auxiliar aos calouros em seus primeiros passos na Universidade. A tutoria objetiva minimizar as dificuldades que os alunos possuem ao sair do ensino médio, além de auxiliar na interação dos mesmos com o ensino superior. O tutor também aprende enquanto ensina. Este discente tutor estabelece vínculo com os alunos devido a sua responsabilidade em acompanhar o desenvolvimento do processo de ensino e aprendizagem (DEMARCO; HONORATO, 2013). Portanto, o programa de tutoria soma, iguala e aumenta a autoestima dos alunos e tutores, preparando-os para que, firmados na sua capacidade, até então desconhecida, sigam preparados para a vida acadêmica e profissional.

Agradecimentos

À PROGRAD e à PRPPG da UFVJM pela concessão de bolsas institucionais ao PROAE e ao PIBIC-Jr/FAPEMIG, respectivamente.

Referências

BRAATHEN, P.C. A case study of prior knowledge, learning approach and conceptual change in an introductory chemistry tutorial program. Tese de Doutorado, University of Wisconsin, 1987.

CORDEIRO, A.S.; OLIVEIRA, B.P. de. Monitoria acadêmica: a importância para o aluno de licenciatura em química. Itapipoca, 2011.

DÉLORS, J. Educação: um tesouro a descobrir: Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. 6.ed. São Paulo: Cortez, 2001.

DEMARCO, S. R. S.; HONORATO, H. G. A educação a distância e a tutoria: alguns olhares. In: V Seminário Internacional de Educação a Distância. Belo Horizonte/MG, 2013.

FONTANIVE, N.S.; KLEIN, R. O efeito da capacitação docente no desempenho dos alunos: uma contribuição para a formulação de novas políticas públicas de melhoria da qualidade da educação básica. Revista Iberoamericana de Evaluación Educativa. 2010, v.3, n. 3.

FRANCISCO Jr., W. Uma abordagem problematizadora para o ensino de interações intermoleculares e conceitos afins. Química Nova na Escola, n.29, p.20-23, 2008.

GADOTTI, Moacir. Perspectivas atuais da educação. Porto Alegre: Ed. Artes Médicas, 2000.

HACKMAYER, M. B.; BOHADANA, E. Professor ou tutor: uma linha tênue na docência em EaD. Revista Iberoamericana de Educación a Distancia, v. 17, n. 2, p. 223-240, 2014.

HEWSON, P. W. A conceptual change approach to Learning Science. European Journal of Science Education 3(4), p 383-396, 1981.

PEREIRA, J. T. A inserção de jogos didáticos na formação de graduandos em Química da UEPB-Campos de Patos. 2014, 69f. Trabalho de conclusão de curso- (graduação em Química)- Universidade Estadual da Paraíba, 2014. 17 p.

POSNER, G. J.; STRIKE, K.A; HEWSON, P.W & GERTZOG, W.A. Accommodation of a scientific conception: toward a theory of conceptual change. Science Education 66(2) p 211-222, 1982.

SANTOS Jr., J. B. et al. Um estudo comparativo entre a atividade experimental e a simulação por computador na aprendizagem de eletroquímica. Revista Electrónica de Enseñanza de las Ciencias v. 15, nº 2, p. 312-330, 2016.

SANTOS, W.L.P. e MORTIMER, E.F. Concepções de professores sobre contextualização social do ensino de química e ciências. In: Reunião Anual Da Sociedade Brasileira De Química, 22, 1999. Anais... Poços de Caldas: Sociedade Brasileira de Química, 1999.

TREVISAN, T.S.; MARTINS, P.L.O. O professor de química e as aulas práticas. In: Congresso Nacional de Educação – EDUCERE, 8, 2008, Curitiba. Anais... Curitiba, 2008. p. 4733-4745.

VALDERRAMA, L. et al. Proposta experimental didática para o ensino de análise de componentes principais. Química Nova, v. 39, nº. 2, p. 245-249, 2016.