A MÚSICA COMO POSSIBILIDADE DE AVALIAÇÃO FORMATIVA NO ENSINO DE QUÍMICA

ISBN 978-85-85905-21-7

Área

Ensino de Química

Autores

Guimarães, M.B. (IFRJ) ; Gomes, S.F.G. (IFRJ) ; Marcelino, V.S. (IF FLUMINENSE) ; Castro, D.L. (IFRJ)

Resumo

O presente trabalho propõe que a música seja adotada como um recurso avaliativo no ensino de química, visando à avaliação formativa. Para isso, após uma aula teórica e prática sobre as ligações químicas e a condutividade elétrica de substâncias, solicitou-se que os alunos de uma turma de primeiro ano do ensino médio, apresentassem uma produção musical sobre ligações químicas. Dentre as produções, o fragmento de uma música original que explana sobre as ligações metálicas foi avaliado. Os resultados sugerem que, a música expressa potencialidade para o ensino-aprendizagem por ser um recurso que motiva os jovens a pensar o conteúdo científico, organizá-lo, sistematizá-lo e expressá-lo com criatividade.

Palavras chaves

Ensino de Química; Música; Avaliação Formativa

Introdução

Avaliar é um ato comum, rotineiro e que qualquer pessoa está habituada a realizar seja de forma consciente ou inconsciente. No entanto, quando se trata do contexto escolar a avaliação é imbuída de variáveis complexas, estas que deveriam consoar com uma formação cidadã.Todavia, a realidade escolar ainda está imersa em um sistema educacional de caráter classificatório, pontual e excludente em que a resposta certa está no centro da relação, negligenciando todo o percurso trilhado pelos estudantes no processo de ensino-aprendizagem (GOMES et al., 2016). Tendo em vista que cada pessoa é diferente e que cada percurso é realizado no seu tempo, convém refletir sobre uma avaliação comprometida com o aprendizado dos estudantes de forma mais abrangente. Objetivando um ato avaliativo capaz de dar a oportunidade de conhecer o processo ensino-aprendizagem desenvolvido, bem como o êxito ou não das ações docentes desempenhadas, existe a avaliação formativa como alternativa ao exame tradicional. A avaliação formativa “pode ser entendida como uma prática de avaliação contínua que objetiva desenvolver as aprendizagens” (CASEIRO; GEBRAN, 2008, p. 143). Este tipo de avaliação identifica as possíveis causas das dificuldades encontradas pelos alunos, almejando uma qualificação da avaliação e não estritamente uma quantificação. Nessa perspectiva, atenta-se para possíveis instrumentos que possam auxiliar em uma avaliação formativa no ensino de química, a fim de despertar a aprendizagem, e se distanciar da memorização dos conteúdos trabalhados em sala de aula. De acordo com Silveira e Kiouranis (2008) um instrumento a ser considerado, é a utilização da música, por ser uma estratégia que explora além da sensibilidade e da criatividade as relações entre o conteúdo musical e o conhecimento científico. A música é um recurso pedagógico simples e dinâmico que vem sendo adotado frequentemente no âmbito escolar. Dentre as diversas vantagens, destaca-se ser uma ferramenta lúdica de baixo custo, sendo veículo de expressão do assunto a ser estudado. A música pode aproximar os conteúdos científicos da realidade dos jovens, quando é contextualizada auxilia na popularização da ciência, sendo uma via que aproxima a arte e a ciência (BARROS; ZANELLA; ARAÚJO-JORGE, 2013). O professor que busca dinamizar suas aulas e adotar uma alternativa que seja prazerosa para grande parte dos alunos, pode usufruir da música, uma vez que esta é facilmente assimilada pelas pessoas e está presente no nosso cotidiano (BARROS; ZANELLA; ARAÚJO-JORGE, 2013). Tendo em vista o exposto, a presente pesquisa se ocupa em investigar se existe potencialidade no uso da música como recurso avaliativo sob um viés formativo, no interior da disciplina de química, em especial, na abordagem do conteúdo de ligações metálicas.

Material e métodos

A pesquisa de cunho qualitativo foi desenvolvida em uma turma do 1º ano do ensino médio integrado de uma instituição pública federal do norte do estado do Rio de Janeiro. Inicialmente, uma aula prática experimental foi planejada e desenvolvida juntamente com os alunos no laboratório de química. O tema central foi ligação química, e para a abordagem deste assunto foi realizado um teste de condutividade elétrica de algumas substâncias químicas e materiais. As substâncias e materiais escolhidos foram: vinagre, cloreto de sódio sólido e dissolvido em água, açúcar sólido e dissolvido em água, solução aquosa de ácido clorídrico, uma colher metálica e uma barra de cobre. Foi utilizado um sistema teste constituído de uma lâmpada conectada a fios metálicos ligados a uma corrente alternada (127 V) e os eletrodos disponíveis para entrar em contato com tais substâncias e materiais. Questionamentos foram sendo feitos ao passo que eram testadas as espécies químicas. Os alunos tentavam identificar a substância química capaz de fechar o circuito, caso fechasse, acenderia a lâmpada para ser classificada como um agente condutor, caso não fechasse, não acenderia a lâmpada e, por conseguinte, classificada como agente isolante ou má condutora. Ao encerrar as discussões e a experimentação, solicitou-se, como recurso avaliativo, que os alunos expressassem os conhecimentos obtidos sobre as ligações químicas por intermédio de uma produção musical. Diversos grupos foram formados para compor uma letra exclusiva, que abordasse o conteúdo visto de modo claro, coeso e objetivo podendo inseri-la em uma melodia conhecida popularmente. A produção da letra teve por fonte conceitual o livro didático da disciplina de Química, Ser Protagonista, editado por Murilo Antunes em 2013, que foi distribuído gratuitamente na Instituição aos alunos que cursam o ensino médio.

Resultado e discussão

Dentre diversas produções elaboradas, houve o destaque de uma produção musical, exibida na forma de vídeo, a qual os alunos se destacaram por se empenharem desde a escolha da melodia, elaboração da letra e caracterização para a gravação do vídeo. A produção musical deste grupo selecionado abordava conceitos sobre as três ligações químicas: iônica, covalente e metálica. O fragmento da música avaliada explana sobre as ligações metálicas. O grupo conseguiu versar os conceitos abordados em aula com criatividade e originalidade. O Quadro 1 ilustra o trecho selecionado para análise. Analisando-se a produção musical, que aborda o tema ligação metálica, foram destacados, em negrito, os termos ou ideias que os alunos inseriram em sua composição. Para as próximas discussões, teve-se por base um trabalho que avalia a concepção de alunos sobre modelo de ligação metálica (CARVALHO; JUSTI, 2005). Na primeira estrofe que inicia a música o grupo se propõe a “incrementar sua massa encefálica” como uma forma de chamar atenção sobre a informação que estão prestes a oferecer. Em seguida, a informação que querem introduzir é revelada: a ligação metálica. Para então problematizar para o ouvinte se ele “tem ideia do que é isso?”, pedindo para que ele pegue objetos do cotidiano que possuem propriedades metálicas, como “faca, garfo e colher”, constituídas por ligas metálicas. Ou seja, somente nessa estrofe o aluno já: traz o objetivo da música, problematiza este objetivo, e relaciona-o com o cotidiano. A segunda estrofe é iniciada com uma característica importante na ligação metálica, que é a combinação “metal com metal”. Para então, no verso seguinte, ressaltar a condutividade elétrica como uma propriedade fundamental nesse tipo de ligação, complementando posteriormente no quarto verso, que esse princípio ocorre pelo modelo do “mar de elétrons”. Segundo Carvalho e Justi (2005) há uma dificuldade dos alunos conseguirem relacionar a ideia de mar de elétrons com o conceito de condutividade elétrica, sem que haja uma discussão em sala de aula. Nesse sentido, salienta-se a relevância da realização de experimentos que propiciem discussões com os alunos sobre as propriedades das ligações químicas como, por exemplo, a condutividade elétrica dos materiais. No primeiro e segundo versos da terceira estrofe, os alunos destacaram que nesta ligação “ninguém quer ficar com elétrons livres e por isso se unem mais forte”. Nesse trecho identifica-se um erro conceitual referente à ligação metálica, ao afirmarem que os elétrons não ficam livres na ligação. Tendo por base o livro didático que os alunos acessaram como fonte (ANTUNES, 2013), identifica-se que o modelo da ligação metálica consiste em cátions metálicos dispersos em um retículo cristalino e os elétrons circulam livremente entre eles. Desse modo, a expressão utilizada pelos alunos não condiz com a explicação citada no referencial. No que diz respeito à afirmação dos alunos em caracterizar a ligação metálica como uma forte união entre os átomos, considerando o elevado ponto de fusão de certos metais, pode ter conduzido os alunos afirmarem que a ligação metálica é forte pela necessidade de absorver muito calor para a transformação do estado sólido para o líquido. Os autores entendem que esta concepção dos alunos pode ter relação entre a visualização de metais do cotidiano, como uma colher, faca e garfo, que apresentam uma alta resistência em sua estrutura, com a forte união dos átomos na ligação metálica. Aprofundando a discussão conceitual sobre a força da ligação metálica, destaca- se que o modelo de mar de elétrons não é capaz de esclarecer uma tendência que ocorre com a força da ligação metálica. De acordo com o modelo de mar de elétrons, a força da ligação deveria aumentar na proporção que o número de elétrons da camada de valência aumenta, resultando em um aumento nos pontos de fusão dos átomos metálicos que se encontram no mesmo período na tabela periódica. No entanto, os metais que se encontram no centro dos metais de transição, como o cromo (Cr), molibdênio (Mo) e tungstênio (W), que são metais do grupo 6B, possuem os pontos de fusão mais altos em seus respectivos períodos. Considerando as famílias na tabela periódica, há um aumento no ponto de fusão e ebulição de cima para baixo, exceto nas famílias 1A e 2 A, que aumentam esses valores de baixo para cima. Em relação aos períodos, esse aumento ocorre das laterais para o centro da tabela até o tungstênio, implicando que a força da ligação metálica inicialmente aumenta com o aumento do número de elétrons de valência e depois diminui. (BROWN, 2005). A Figura 1 exibe claramente a tendência do ponto de fusão e ebulição dos metais. Para compreender melhor essa tendência, era necessário discutir sobre a teoria do orbital molecular aplicada aos metais, que geralmente não é discutido no ensino médio. No terceiro e quarto verso da terceira estrofe, o grupo ressalta que tem “que aquecer, muito essas estruturas para derrete”,ou seja, a percepção do grupo nessa estrofe é que todas as estruturas metálicas possuem alto ponto de fusão e por isso para o derretimento, é preciso aquecer muito. Possuir elevado ponto de fusão é uma propriedade característica de muitos metais, entretanto, destaca-se que há metais que possuem baixo ponto de fusão, como o mercúrio, que na temperatura ambiente se encontra no estado líquido (ANTUNES, 2013).

Quadro 1

Trecho de uma produção musical elaborado por um grupo de alunos

Figura 1

Tendência do PF e PE na tabela periódica

Conclusões

Considerando os resultados obtidos, é possível, neste ponto, destacar que o uso da música pode ser um recurso valioso para externalizar os conhecimentos dos alunos, sejam eles adequados ou inadequados. Vislumbrando refletir sobre os vestígios de progresso ou obstáculo no processo ensino-aprendizado de forma criativa e dialogada em sala de aula. Identificou-se que a música como recurso avaliativo expressa potencialidade devido ser uma ferramenta que motiva os jovens a pensar o conteúdo científico, organizá-lo, sistematizá-lo e expressá-lo com criatividade em uma produção musical singular. A produção musical não é solução para uma avaliação perfeita, mas sim, uma alternativa possível frente a outros instrumentos avaliativos que objetivam uma avaliação formativa, além de possibilitar ao docente diversificar as suas avaliações com esse mesmo caráter. Se tratando do assunto específico, ligação metálica, ressalta-se que é um assunto ainda complexo para ser abordado com os estudantes do ensino médio, uma vez que para melhor compreensão de diversificadas propriedades e tendências dos metais, o modelo de mar de elétrons, não é suficiente para esclarecê-lo, necessitando de conhecimentos mais aprofundados, que são discutidos no ensino superior na disciplina de química. Destarte, se faz necessário o repensar do conteúdo específico, concernente a ligações metálicas, para aprimorar o ensino-aprendizagem desse assunto no ensino médio.

Agradecimentos

Ao IFRJ, ao IF Fluminense e aos alunos participantes da pesquisa.

Referências

ANTUNES, M. T. (Ed.) Ser protagonista: química, 1° ano: ensino médio, 2ª ed. São Paulo: Edições SM, 2013.

BARROS, M. D. M.; ZANELLA, P. G. ; ARAÚJO-JORGE, T. C. A música pode ser uma estratégia para o ensino de Ciências Naturais? Analisando concepções de professores da educação básica. Ensaio: Pesquisa em Educação em Ciências (Impresso), v. 15, p. 81, 2013.
BROWN, T.; LEMAY, H. E.; BURSTEN, B. E. Química: a ciência central. 9 ed. Prentice-Hall, 2005.

CARVALHO, N. B.; JUSTI, R. S. Papel da analogia do “mar de elétrons” na compreensão do modelo de ligação metálica. Enseñanza de las Ciencias, 2005. Número extra VII Congresso, 2005.

CASEIRO, C. C. F.; GEBRAN, R. A.. Avaliação formativa: concepção, práticas e dificuldades. Nuances: estudos sobre Educação. Presidente Prudente, SP, ano XIV, v. 15, n. 16, p. 141-161, 2008.

GOMES, S. F.; MOTA, N. S.; SILVA, L. G.; BARRETO, K. G. Percepção dos alunos sobre a avaliação da aprendizagem. In: SINECT, 5., 2016, Ponta Grossa. Anais... Ponta Grossa: UTFPR, 2016.

SILVEIRA, M. P.; KIOURANIS, N. M. M. A música e o ensino de química. Química nova na escola. São Paulo, n.28, p.28-31, 2008.

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