Loader
60º COngresso Brasileiro de Química

Comparação entre métodos de digestão ácida de incrustações de petróleo para extração de Ra-226 e Ra-228


ÁREA

Química Verde

Autores

Sobreira, T.G.P. (CENTRO REGIONAL DE CIÊNCIAS NUCLEARES DO NORDESTE) ; Amaral, D.S. (CENTRO REGIONAL DE CIÊNCIAS NUCLEARES DO NORDESTE) ; Menezes, F.D. (INSTITUTO FEDERAL DE PERNAMBUCO) ; França, E.J. (CENTRO REGIONAL DE CIÊNCIAS NUCLEARES DO NORDESTE) ; Aquino, K.A.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO)

RESUMO

Na indústria de petróleo são geradas incrustações em equipamentos a partir da precipitação de sais inorgânicos presentes na água de injeção. Junto com esses sais, precipitam-se na forma mineral os radionuclídeos Ra-226 e Ra- 228, cuja presença em altos níveis aumenta a exposição humana à radiação ionizante. Aqui avaliamos a viabilidade de dois métodos de extração destes nuclídeos das incrustações. No método A, utilizou-se solução de HCl e banho ultrassom. No método B, reduziu-se o volume de ácido, seguindo com banho ultrassom e aquecimento em forno digestor. Espectrometria Gama foi utilizada para quantificar os radionuclídeos extraídos. Taxas de contagens semelhantes indicaram a viabilidade dos dois métodos, sendo o método B ambientalmente mais indicado por usar metade do volume de ácido.

Palavras Chaves

Radionuclídeos; Tratamento químico; TENORM

Introdução

Durante a produção e extração de petróleo, existe a produção de água que ocorre a partir da técnica de injeção de água. Sua finalidade é aumentar a capacidade de recuperação de petróleo do poço produtor (GARCIA, 2010; MENGER, 2015). A água de injeção é composta da água do mar, rica em sulfatos (SO42-), enquanto a água do poço produtor, comum às rochas do reservatório, geralmente é rica em cátions metálicos com Ca2+ , Sr2+ e Ba2+ (MONTEIRO; ABDEL-REHIM, 1984; MENGER, 2015; SILVA; BEDRIKOVETSKY, 2007). A incompatibilidade química dessas águas viabiliza a formação de sais, que se precipitam e partir dos processos de nucleação, crescimento dos cristais e adesão, formando depósitos inorgânicos, que seriam as incrustações (DAHER, 2003). As incrustações mais comuns na indústria de petróleo são as de sulfato de cálcio (CaSO4), sulfato de bário (BaSO4), sulfato de estrôncio (SrSO4) e carbonato de cálcio (CaCO3) (MONTEIRO; ABDEL-REHIM, 1984; SILVA; BEDRIKOVETSKY, 2007; GARCIA, 2010; MENGER, 2015). Além disso, as incrustações são encontradas no interior de equipamentos de processos, como tanques de armazenamento, curvas, restrições e tubulações. Elas danificam as instalações e podem resultar em danos permanentes (MONTEIRO; ABDEL-REHIM, 1984; SILVA; BEDRIKOVETSKY, 2007). Juntamente com esses sais inorgânicos, são precipitados radionuclídeos como Ra 226 e Ra-228. A presença de elevadas concentrações e o aumento do potencial à exposição humana e ambiental à radiação ionizante, classificam esses materiais como Technologically Enhanced Naturally Occurring Radioactive Materials (TENORM), ou seja materiais radioativos de ocorrência natural que foram concentrados como resultado de atividades humanas, como manufatura, extração mineral ou processamento de água (USEPA, 2008). As propriedades radiológicas, físicas e químicas dos materiais classificados como TENORM são alteradas por serem processadas, beneficiadas, ou perturbadas de uma forma que aumentam o potencial de exposição humana e/ou ambiental à radiação ionizante (USEPA, 2008). Devido à presença desses radionuclídeos, as incrustações são consideradas uma categoria expressiva de poluente ambiental dada sua toxidade química e radiológica (ALI et al., 2019). Existe grande preocupação quanto ao tratamento adequado e o descarte final desses resíduos (ATTALLAH et al., 2015). Além da relevância radiológica, as variações termodinâmicas e os processos físico-químicos compreendidos durante a formação das incrustações, resultam em incrustações com elevada complexidade da matriz (POGGI, 2016), o que dificulta seu manuseio em atividades de pesquisas e análises laboratoriais. Diante do apresentado, o presente trabalho tem como objetivo comparar e avaliar a viabilidade técnica e ambiental de dois métodos de digestão ácida para extração de Ra-226 e Ra-228, além de determinar a quantidade de matéria orgânica (MO) e carbono orgânico(Corg) das incrustações de petróleo. Para isso, foram utilizados um método de digestão simplificado por ultrassom – método A – e um método seguido de forno digestor micro-ondas método B; e, para a quantificação indireta de carbono, foi realizado o método de calcinação em mufla.

Material e métodos

MÉTODO DE DIGESTÃO SIMPLIFICADO – MÉTODO A O tratamento químico simplificado para extração de Ra-226 e Ra-228 foi adaptado a partir do trabalho de Mendes et al. (2009). O ensaio foi realizado no Centro Regional de Ciências Nucleares do Nordeste (CRCN-NE) e o utilizou-se neste teste o ácido clorídrico (HCl) P.A. (∼37%). Foram utilizadas 20 porções de 1 g das incrustações em tubos de teflon. Adicionou- se às amostras 25 ml de ácido, e realizou-se banho de ultrassom à 80°C durante 60 minutos. A amostras foram resfriadas em temperatura ambiente e filtradas em filtro qualitativo. O material filtrado foi armazenado em placa de Petri de vidro e seco em estufa à 60°C. Por fim, as placas foram seladas e armazenadas por 28 dias – até atingir o equilíbrio secular para a quantificação dos radionuclídeos por Espectrometria Gama de Alta Resolução (EGAR). QUANTIFICAÇÃO INDIRETA DE CARBONO Esta etapa foi realizada a fim de avaliar a viabilidade de aquecimento das incrustações com solução ácida em forno de micro-ondas, modelo MARSXpress, da CEM Corporation®, devido à possibilidade de formação de gases no interior dos tubos (CARMO; SILVA, 2012). Utilizou-se metodologia adaptada de Silva et al. (1999) e Carmo e Silva (2012). Foram avaliadas amostras em triplicata com massas de 2,6 g, que foram calcinadas no Forno Mufla, modelo NA 1262, da Analógica Instrumentação e Controle® utilizando o ciclo de temperatura: 100°C por 1h; 150°C por 2h; 200°C por 3h; 250°C, 300°C, 350°C e 400°C por 2h cada; e 450°C por 8h. A quantidade de matéria orgânica (MO) foi determinada pela Equação 1, em que MO(%) é a porcentagem de matéria orgânica na amostra, P é a massa inicial da amostra e T é a massa após calcinação. MO(%) = 100 [(P – T)÷P] (1) A quantificação de carbono orgânico (CO%) na amostra foi realizada utilizando a Equação 2 (Pribyl, 2010). CO(%) = MO(%)÷2 (2) MÉTODO DE DIGESTÃO EM FORNO DE MICRO-ONDAS – MÉTODO B Neste método foram utilizadas porções de 0,5 g em tubos de teflon e 12,5 ml de ácido clorídrico (HCl) P.A. (∼37%), que também foram imersas em ultrassom durante 60 minutos à temperatura de 80°C e resfriadas em temperatura ambiente. Em seguida, foram levadas ao forno micro-ondas supracitado, aquecidas durante 20 minutos até temperatura de 150°C, permanecendo sob esta temperatura por 15 minutos. As amostras foram resfriadas em temperatura ambiente, filtradas em filtro qualitativo, armazenadas em placa de Petri de vidro e secas em estufa à 60°C. Por fim, foram seladas e armazenadas por 28 dias. AVALIAÇÃO POR EGAR As quantificações de Ra-226 e Ra-228 nas amostras obtidas foram realizadas por EGAR. Cada ensaio foi realizado durante 80.000 segundos. Utilizou-se detectores modelo HPGe GC4019, da Canberra® (40% de eficiência relativa e resolução de 2,1 keV no fotopico do Co-60). A eficiência relativa da digestão foi definida a partir da contagem do Pb-214 (fotopico 351,9 keV), para Ra-226, e Ac-228 (fotopico 911,2 keV), para Ra-228.

Resultado e discussão

QUANTIFICAÇÃO INDIRETA DE CARBONO Na Tabela 1, são exibidas as frações de matéria orgânica (MO) e a quantidade de carbono orgânico (Corg) das incrustações de petróleo, além dos valores médios e o desvio padrão destes parâmetros. A fração máxima de MO foi de 4,66% e o Corg máximo foi de 2,33%, com médias respectivamente de 4,62% e 2,31%. As baixas frações de matéria orgânica encontradas nas incrustações podem estar relacionadas com o mecanismo de formação destas, uma vez que este processo ocorre por supersaturação e precipitação de sais inorgânicos como sulfatos e carbonatos. Os baixos desvios padrão demonstram a pequena variabilidade destes valores entre as triplicatas e, portanto, a similaridade entre elas com relação a estes dois parâmetros (MO e Corg). Cunha et al. (2016) avaliaram em sua pesquisa a fração de matéria orgânica de incrustações de petróleo utilizando um sistema de extração Soxhlet e encontraram valores próximos de 5,6% para a MO, o que corrobora os resultados encontrados. Os baixos valores médios encontrados indicaram a viabilidade da utilização de aquecimento em forno de micro-ondas para a digestão ácida após digestão em banho de ultrassom, como pretendido no método B. COMPARAÇÃO ENTRE OS MÉTODOS DE DIGESTÃO ÁCIDA Os métodos de digestão ácida utilizados no presente trabalho podem ser descritos como: Método A – digestão simplificada por ultrassom; Método B – digestão por ultrassom e forno de micro-ondas. A viabilidade da simplificação do método, excluindo-se a etapa de digestão no forno micro- ondas, foi avaliada a partir da comparação de taxas de contagens nas amostras obtidas pelos dois tratamentos químicos das incrustações, ou seja, se o método simplificado era capaz de extrair das incrustações de petróleo analisadas quantidades semelhantes de Ra-226 e Ra-228. Os resultados obtidos revelaram que as maiores taxas de contagem tanto para o Pb-214 (com o qual estimamos os valores para o Ra-226), quanto para o Ac-228 (com o qual estimamos os valores para o Ac-228) se deram na amostra obtida a partir do método de digestão ácida por ultrassom seguido de aquecimento em forno digestor (método B). Estes valores foram de 575,19 contagens por segundo por quilograma de amostra para o Pb-214 (Ra-226) e de 533,00 contagens por segundo por quilograma de amostra para o Ac-228 (Ra-228). Apesar disso, as taxas de contagens na amostra obtida a partir do método simplificado de extração foram próximas aos valores obtidos por meio do método B. Foram verificadas 533,00 contagens por segundo por quilograma de amostra para o Pb-214 (Ra-226) e 51,42 contagens por segundo por quilograma de amostra para o Ac-228 (Ra-228), o que representa valores apenas 7,34% e 4,64% menores do que os valores obtidos na amostra do método B. Para observar as diferenças obtidas, foi feito o gráfico de comparação (Figura 1), onde estão apresentadas as razões entre as contagens para os fotopicos analisados obtida nas amostras de método de digestão utilizado. A partir do gráfico apresentado, é possível perceber que os valores são semelhantes, o que indica que as eficiências da digestão 1 e 2 são bastante próximas. A partir dos resultados apresentados, as taxas de contagens semelhantes mostram que o método simplificado por ultrassom (método A) é uma alternativa tecnicamente viável para extração de Ra-226 e Ra-228 em incrustações de petróleo. O método permite menor tempo de preparação e menor custo no que se refere à aquisição do equipamento em laboratório. Por outro lado, é possível obter resultados próximos pela digestão ácida em ultrassom seguida de forno digestor (método B), com a vantagem da utilização de quantidades menores de amostras e apenas metade do volume de ácido clorídrico. Esta economia de 50% do volume do ácido utilizado na extração acaba por tornar o método B ambientalmente mais viável, apesar de ser mais complexo e dispender mais tempo. Comparando com trabalhos presentes na literatura, Mendes et al. (2009) utilizaram digestão com ácido clorídrico e banho em ultrassom para caracterização química por ICP-MS (Espectrômetro de Massa com Plasma Indutivamente Acoplado) de cinzas volantes de carvão. Neste estudo, os testes foram feitos utilizando volumes de HF, HCl, e HNO3 nominalmente e proporcionalmente (2 vezes) maiores do que os utilizados no método B no presente estudo. Já no trabalho de Araújo (2005), foi realizada dissolução das incrustações como pré-tratamento para determinação das concentrações de Ra-226 e Pb 210. Nesse estudo, foram utilizados, como parte da metodologia, forno micro-ondas, além de HCl, HNO3, HF e água- régia para abertura das incrustações de petróleo. A utilização de menores volumes e de apenas um ácido (HCl), diferentemente dos estudos encontrados na literatura, demonstram a maior viabilidade ambiental da metodologia aqui utilizada.

Figura 1. Comparação entre os métodos analisados

Fontes: Os Autores

Tabela 1. Fração de matéria orgânica (MO) e carbono (Corg) nas amostra

MO: Quantidade de matéria orgânica em %, Corg: Quantidade de carbono. Fonte: Os autores

Conclusões

Por apresentarem pouca presença de matéria orgânica e baixa quantidade de carbono as incrustações de petróleo revelaram-se adequadas para a digestão utilizando forno micro-ondas. A comparação entre os métodos de digestão demonstrou que as taxas de contagens nas amostras obtidas a partir do método simplificado e do método seguido de forno digestor micro-ondas foram semelhantes, confirmando que o método simplificado é uma opção para extração de Ra-226 e Ra-228 de incrustações de petróleo, com menor consumo de tempo e menores custos para aquisição de equipamento. Por outro lado, o método seguido de forno micro-ondas apresentou-se ambientalmente mais relevante devido à utilização de menores volumes de ácido clorídrico e de amostra para extrações de quantidades semelhantes dos radionuclídeos analisados.

Agradecimentos

Os autores agradecem à CAPES, à CNEN e ao CRCN-NE pelo apoio técnico e auxílio financeiro para realização do presente trabalho.

Referências

ALI, M. M.; ZHAO, H,; LI, Z.; MAGLAS, N. M. Concentrations of TENORMs in the petroleum industry and their environmental and health effects. Royal Society of Chemistry, v. 9, p. 39201-39229, 2019.

ATTALLAH, M. F.; HAMED, M. M.; AFIFI, E. M.; ALY, H.F. Removal of 226Ra and 228Ra from TENORM sludge waste using surfactants solutions. Journal of Environmental Radioactivity, v. 139, p. 78–84, 2015.

ARAÚJO, A. A. Determinação Radioquímica de 210Pb e 226Ra em Borras e Incrustações de Petróleo. Recife: UFPE, 2005, 61 p.

CARMO, D. L.; SILVA, C. A. Métodos de Quantificação de Carbono e Matéria Orgânica em Resíduos Orgânicos. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 36, p. 1211–1220, 2012.

CUNHA, J. D.; SILVA, F. N.; BARBOSA, A. F. F.; SILVA, D. R. Avaliação da Incrustação na Bomba de Fundo em Poços Produtores de Petróleo e Gás: Estudo de Caso. Holos, v. 7, p. 209–210, 2016.

DAHER, J. S. Avaliação de Incrustação de Sais Inorgânicos em Reservatórios Inconsolidados através da Simulação Numérica. Macaé, RJ: UENF, 2003, 188 p.

GARCIA, J. P. C. Análise de Incrustações por Técnicas Atômicas/Nucleares. Rio de Janeiro: UFRJ, 2010, 128 p.

MENDES, B. A. O.; PONTES, F. V. M.; SOUZA, E. M. F.; FERREIRA F. N.; SILVA, L. I. D.; CARNEIRO M. C.; NETO, A. A.; MONTEIRO, M. I. C. Determinação de Elementos em Cinzas Volantes de Carvão Utilizando Digestão Assistida por Ultrassom e Quantificação por ICP-OES. XXIII ENTMME, Gramado, RS, out. 2009.

MENGER, R. K. Síntese e Caracterização de Poli (Ácido Lático-co-Ácido Glutâmico) para Uso como Inibidor de Incrustações Inorgânicas. Porto Alegre: UFRS, 2015, 55 p.

MONTEIRO, M. I. C.; ABDEL-REHIM. Previsão de Incrustações para Projetos de Recuperação Secundária de Petróleo por Injeção de Água. Boletim Técnico da Petrobrás, v. 27, p. 298–310, 1984.

POGGI, C. M. B. Radionuclídeos em Incrustações Formadas por Caldeiras de Instalações Industriais de Pernambuco: Caracterização Química e Radiométrica. Recife: UFPE, 2016, 128 p.

PRIBYL, D. W. A Critical Review of the Conventional SOC to SOM Conversion Factor. Geoderma, v. 146, p. 75–83, 2010.

SILVA, A. C.; TORRADO, P. V.; ABREU, J. S.; Métodos de Quantificação da Matéria Orgânica do Solo. Revista da Universidade de Alfenas, v. 5, p. 21–26, 1999.

SILVA, R. M. P.; BEDRIKOVETSKY, P. G. Previsão da perda da produtividade e de injetividade na Bacia de Campos devido à incrustação de sulfatos. Boletim Técnico da Produção de Petróleo, v. 2, p. 341–271, 2007.

USEPA - UNITED STATES ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY. Technologically Enhanced Naturally Occuring Radioactive Materials From Uranium Mining. Washington, DC: United States Environmental Protection Agency, v. 1, 2008.