11º Simpósio Brasileiro de Educação Química
Realizado em Teresina/PI, de 28 a 30 de Julho de 2013.
ISBN: 978-85-85905-05-7

TÍTULO: INTERRELAÇÃO ENTRE OS SABERES POPULARES E SABERES FORMAIS NO ENSINO DE QUÍMICA

AUTORES: Nagashima, L.A. (UNESPAR/FAFIPA)

RESUMO: O trabalho analisa o espaço escolar em suas relações com o saber popular e o científico buscando a inserção do conhecimento popular na geração do saber formal. A escola constrói o suporte do aluno para reorganizar o conhecimento popular com a contribuição dos saberes científicos. Nesse sentido é possível uma aliança entre o conhecimento formal e a valorização do saber popular, e é com tal perspectiva que o trabalho foi desenvolvido. Discutiu-se um tema muito questionado pelos filhos de agricultores: como as descargas elétricas favorecem o desenvolvimento de uma produção agrícola ou segundo a linguagem popular: "ano que troveja é ano bom para agricultura". Com este tema discutiu-se o ciclo do nitrogênio e as reações químicas que transformam o nitrogênio atmosférico na formação de nitrato.

PALAVRAS CHAVES: Função da escola ; Saber não formal; Material para-didático

INTRODUÇÃO: A química, enquanto área do conhecimento, está muito mais presente no cotidiano das pessoas do que se imagina. No entanto, em sala de aula o questionamento sobre o tema: “por que temos que aprender coisas que nunca vamos usar...” ou ainda, segundo o depoimento de alguns alunos, frutos de uma pesquisa realizada por Lunkes e Rocha Filho (2011) há outras revelações culminando na rejeição do estudo das áreas científicas: o estudo da Química se resume a fórmulas compostas por “letras, números e riscos” que não sabe “onde nem como aplicar”, que a “Física mais parece a Matemática”, e que a Biologia o “obriga a decorar nomes” que ele esquece, com “alegria, instantes após as provas”. Essa manifestação faz refletir o papel dessas disciplinas e como alternativa buscar cada vez mais um estudo contextualizado, familiarizando os conhecimentos do dia a dia do aluno com o que é visto na escola em sala de aula. Os pesquisadores Leal e Moita Neto (2012) afirmam que a vinculação entre ciência e saberes populares é efetiva no que se refere ao processo de ensino-aprendizagem, isso pode ser verificado pela experiência relatada nos inúmeros trabalhos recentemente publicados nos periódicos da área de Ensino de Química. Exemplos que discutem a cultura popular da tecelagem mineira (Gondin e Mól, 2008); processo de fabricação da goma e cola artesanal (Leal e Moita Neto, 2012) e produção de pão artesanal (Venquiaruto et al., 2011) são alguns dos trabalhos que foram publicados na revista Química Nova na Escola. O presente trabalho discute a valorização do saber popular relacionado com as descargas elétricas na atmosfera que provocam a transformação do nitrogênio atmosférico em compostos nitrogenados que são arrastados pelas chuvas e atingem o solo, de onde podem ser aproveitados pelas plantas.

MATERIAL E MÉTODOS: O relato aqui apresentado foi desenvolvido em duas turmas do Ensino Médio de uma escola pública localizada na cidade de Paranavaí, Estado do Paraná. O tema discutido surgiu a partir do questionamento realizado por um grupo de alunos, filhos de agricultores: “o ano que troveja é ano bom para agricultura?” A partir desse episódio, as salas foram divididas em grupos e passou-se a pesquisar a relação entre as descargas elétricas e a agricultura. Nessa perspectiva, foi desenvolvida uma pesquisa envolvendo a valorização da cultura popular, investigando os saberes de um determinado grupo social (agricultores) com o objetivo de utilizá-los para a construção de saberes escolares por intermédio de pesquisas bibliográficas. À medida que a pesquisa se desenvolvia, as equipes observaram que o estudo envolvia a interrelação entre as diversas áreas do conhecimento, notadamente a Química, Física e Biologia. Diante dessas constatações, foi definida e delimitada que a pesquisa envolveria o estudo dos seguintes conteúdos: descargas elétricas; transformação do nitrogênio atmosférico em compostos nitrogenados; ciclo do nitrogênio; fertilizantes e estudo da solubilidade dos sais. Diante dos desafios de explicar a transformação do nitrogênio molecular em nitrato, material a ser absorvido pelas plantas, a pesquisa foi realizada com o auxílio de profissionais de diversas áreas: professores de Química, Física, Biologia e engenheiro agrônomo e elétrico. A interação dos diversos profissionais e seus esforços concentraram-se no sentido de que os alunos consigam transferir e utilizar satisfatoriamente, fora do espaço da sala de aula, seus conhecimentos populares e estejam capacitados a analisar situações novas do cotidiano e tomar decisões ponderadas em sua vida cotidiana.

RESULTADOS E DISCUSSÃO: O trabalho resultou no estudo de vários conteúdos efetuado de forma interdisciplinar pelas equipes: 1. Descargas atmosféricas: envolveu uma discussão sobre o que são descargas atmosféricas e como ocorrem, descargas nuvem-solo, líder escalonado e líder contínuo, a descarga de retorno, raios múltiplos e raios de polaridade positiva. 2. Átomos de nitrogênio nas plantas: a pesquisa permitiu uma discussão sobre a formação dos compostos nitrogenados que fazem parte de todas as células. Nesta etapa, já com os conhecimentos consolidados sobre as descargas atmosféricas, seguiu-se o estudo da transformação do nitrogênio atmosférico em compostos nitrogenados pelas descargas elétricas. N2 + O2 → 2NO; NO + ½ O2 → NO2; 3NO2 + H2O → 2HNO3 + NO. Após sua formação, esses compostos são arrastados pela chuva, atingindo o solo, de onde podem ser aproveitados pelas plantas, o que possibilitou a discussão da solubilidade do nitrato em água. Fez-se ainda, o estudo das bactérias fixadoras de nitrogênio que combinado com o hidrogênio, formam amônia que por sua vez, dá origem aos íons amônio (NH4+) e nitrato (NO3-) absorvido pelas plantas. Na parte aérea, o nitrato (NO3-) é reduzido à amônia (NH3), que é incorporado em composto de carbono, proveniente da fotossíntese, originando aminoácidos, que por sua vez, formarão as proteínas. Dessa forma, a atividade mostrou o caminho da transformação do N atmosférico em nitrato, material fundamental para o desenvolvimento das plantas e consequentemente da agricultura. Além disso, com essa atividade foi possível promover uma discussão sobre os tipos de reações químicas e também o estudo dos fertilizantes na agricultura.

CONCLUSÕES: Entender todo o processo de formação dos compostos nitrogenados favorecidos pelas descargas atmosféricas não é uma tarefa simples, porém um aspecto considerado positivo nessa experiência foi o estabelecimento de valorização de um contexto popular e aplicação dos saberes científicos em sua interpretação. Assim, ao transpor o muro do saber popular e explicar os princípios, há inúmeros benefícios como a motivação e a participação ativa dos alunos nas aulas, o elevado nível de socialização, a ampliação da visão de ciência e a valorização das heranças culturais pelos alunos (RESENDE et al., 2010).

AGRADECIMENTOS: À Fundação Araucária e Fundação de Apoio à FAFIPA pelo auxílio financeiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: GONDIN, M.S.C.; MÓL, G.S. Saberes populares e Ensino de Ciências: possibilidades para um trabalho interdisciplinar. Química Nova na Escola. n. 30, nov. 2008. p. 3-9.

LEAL, R.C.; MOITA NETO, J.M. Amido: entre a Ciência e a Cultura. Química Nova na Escola. v. 34, n. 4, nov. 2012. p. 1-4.

LUNKES, M.J.; ROCHA FILHO, J.B. The shortage of physic’s teachers in Brazil: origins of the decreasing search for a degree course in Physics from the students’ testimony of the public secondary education in the Western inhabitant of Santa Catarina. Ciência & Educação. v.17, n. 1, p. 21-34, 2011.

RESENDE, D.R.; CASTRO, R.A.; PINHEIRO, P.C. O saber popular nas aulas de Química: relato de experiência envolvendo a produção do vinho de laranja e sua interpretação no Ensino Médio. Química Nova na Escola. v. 32, n. 3, agosto/2010, p. 151-160.

VENQUIARUTO, L.D.; DALLAGO, R.M.; VANZETO, J.; DEL PINO, J.C. Saberes populares fazendo-se saberes escolares: um estudo envolvendo a produção artesanal do pão. Química Nova na Escola. v. 33, n. 3, agosto/2011, p. 135-141.