11º Simpósio Brasileiro de Educação Química
Realizado em Teresina/PI, de 28 a 30 de Julho de 2013.
ISBN: 978-85-85905-05-7

TÍTULO: LIMITES E DESAFIOS NA ARTICULAÇÃO DOS CONHECIMENTOS CIENTÍFICOS EM UMA AULA PARA ESTUDANTES SURDOS: O ENSINO DO CONCEITO DE DENSIDADE

AUTORES: Gomes, E.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA) ; Rubinger, M.M.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA) ; Souza, V.C.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA)

RESUMO: Nesse trabalho, discute-se a construção do conceito de Densidade em uma turma com três alunos surdos, a partir de um Estudo de Caso com a descrição detalhada das atividades experimentais realizadas em sala de aula. Durante a aula, constatou-se que a comunicação em LIBRAS possui limitações no modo de expressar os sinais de algumas palavras que são polissêmicas. Isso foi verificado ao abordar os aspectos quantitativos do conceito de Densidade. Dessa maneira, foi necessário o professor intervir junto aos alunos, mediando a reformulação conceitual nos sentidos atribuídos inicialmente às grandezas massa e volume. Por fim, em uma sala de aula com alunos surdos, é importante que o professor favoreça uma construção dialógica de sentidos, através da LIBRAS, para os conceitos científicos estudados.

PALAVRAS CHAVES: Conhecimento científico; Densidade; Educação dos surdos

INTRODUÇÃO: O presente trabalho busca discutir as dinâmicas de construção do conhecimento científico estabelecidas durante uma aula de Ciências em que foi ensinado o conceito de Densidade a estudantes surdos. De acordo com a proposta de Perfil Conceitual apresentada por Mortimer (1996), um mesmo conceito pode assumir sentidos distintos quando utilizado em contextos diferentes. No caso da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS), existe uma restrição relacionada à abrangência conceitual que algumas palavras assumem quando são apresentadas sem a identificação do contexto no qual se inserem. Isto porque a LIBRAS é uma língua espaço-visual em que, na maioria dos casos, os sinais não são polissêmicos (não apresentam sentidos distintos em outros contextos). Segundo Mortimer e Scott (2003), o significado de algum conceito é considerado polissêmico, sendo criado nas dinâmicas interativas estabelecidas em sala de aula e, somente então, internalizado pelos alunos. De acordo com Vygotsky (2001) e Sacks (2010), a linguagem é o meio que possibilita o pensamento, sendo desenvolvida através da negociação com o outro, de modo a assumir uma importante função social (interação) e intelectual (internalização). Dessa forma, é desejável que o professor fomente interações em LIBRAS na sala de aula, favorecendo assim o processo de construção social do conhecimento científico. Considerando os pressupostos discutidos anteriormente, foi desenvolvida uma aula para uma turma de alunos surdos sobre o conceito de Densidade, de modo a contemplar nessa proposta os aspectos visuais e dialógicos durante as atividades realizadas. Para isso, utilizaram-se materiais concretos, experimentos e imagens que favorecessem uma melhor abstração dos conceitos discutidos em sala de aula com as atividades propostas.

MATERIAL E MÉTODOS: A presente pesquisa busca analisar as limitações conceituais inerentes a LIBRAS, que foram identificadas durante uma aula de Química para alunos surdos, nos permitindo discutir a seguinte questão: Como seria possível mediar a construção do conhecimento científico relacionado ao conceito de Densidade, considerando as limitações linguísticas que se apresentam no trabalho com alunos surdos? Dessa forma, foi realizado um trabalho com três estudantes surdos de escolas públicas na cidade de Viçosa, Minas Gerais. Esses estudantes cursam o 8°e 9° anos do Ensino Fundamental e a 1ª série do Ensino Médio. Todos estão fora da faixa etária normal de escolarização. Além disso, apenas dois deles são acompanhados regularmente por intérpretes na escola. Os dados analisados foram coletados durante uma aula em que se discutiu o conceito de Densidade, considerando os aspectos qualitativos e quantitativos. Para a análise dos resultados utilizaram-se notas de campo, que foram discutidas após a aula entre o professor da turma e o pesquisador que acompanhou as atividades em sala. Em seguida, elaborou-se um Estudo de Caso com a descrição detalhada das atividades experimentais que foram realizadas em sala de aula, além das discussões estabelecidas entre os alunos e o professor da turma. Cabe ressaltar que essas aulas são de apoio pedagógico extra turno, que ocorre em um espaço destinado a projetos de Extensão da Universidade Federal de Viçosa, conhecido como Ciência em Ação. Semanalmente, os estudantes vão a esse espaço para terem 2 horas de aula de Ciências/Química com um professor intérprete, que é licenciando em Química da UFV e também atua no PIBID.

RESULTADOS E DISCUSSÃO: Na referida aula, uma das atividades realizadas foi a determinação da densidade de uma moeda, que foi colocada em uma proveta com 50 mL de água. Para que fosse possível encontrar o valor da densidade, era necessário descobrir o volume da moeda, que seria o mesmo volume deslocado do líquido na proveta. A massa, por sua vez, foi medida com o uso de uma balança. Após a realização e discussão da parte prática, a equação de densidade foi apresentada aos alunos, tentando estabelecer assim uma relação quantitativa entre a massa e o volume do material investigado. Entretanto, ao escrever no quadro a palavra massa, um dos alunos logo associou a alimentos, tais como macarrão e pizza. Quando a palavra volume foi apresentada, outro estudante apontou para o aparelho auditivo que utilizava e para a caixa de som do computador, se referindo ao ato de aumentar e diminuir o volume do som. Diante dessa situação, constatou-se uma restrição quanto à abrangência conceitual da LIBRAS, sobretudo por essa língua não apresentar, na maioria das vezes, sinais que sejam polissêmicos. Para mediar essa questão, foi necessária a intervenção do professor discutindo com os alunos que as palavras massa e volume naquele contexto assumiam um sentido diferente daqueles atribuídos inicialmente por eles. Isso favoreceu a discussão e esclarecimento do sentido dessas palavras nesse contexto de estudo, de modo a ser possível determinar o valor da Densidade da referida moeda a partir da relação estabelecida entre as grandezas massa e volume.

CONCLUSÕES: Com esse trabalho, concluímos que é fundamental a atuação do professor como mediador no processo de construção do conhecimento científico, de modo a favorecer uma aprendizagem efetiva junto aos alunos surdos. Para que isso se concretize, é importante que o professor tenha fluência na LIBRAS, de modo a estabelecer dinâmicas interativas e dialógicas em sala de aula. Isso permitiria que os alunos surdos tivessem a oportunidade de compartilhar as suas percepções sobre o conetúdo, expressando na língua de sinais o que eles conseguiram abstrair, a partir das ideias científicas discutidas em sala.

AGRADECIMENTOS: A CAPES, por meio do PIBID-UFV, ao MEC-PROEXT e aos estudantes surdos que participaram dessa pesquisa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA: MORTIMER, E. F. (1996). Construtivismo, mudança conceitual e ensino de Ciências: para onde vamos? Investigações em Ensino de Ciências, 1: 20-39.

MORTIMER, E. F., & SCOTT, P. H. (2003). Meaning making in secondary science classrooms. Maidenhead: Open University Press/McGraw Hill.

SACKS, O. (2010). Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. Trad. Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras.

VYGOTSKY, L. S. (2001). A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes.