Autores

Razzoto, E. (PUC/PR) ; Raimondi, A.C. (PUC/PR) ; Stocco, G.B. (PUC/PR)

Resumo

As atividades prática na disciplina de Química Geral nos anos iniciais de engenharia exercem um papel fundamental para a aplicação de conceitos básicos que não foram experienciados durante o ensino médio. No presente trabalho, foi inserido uma proposta inovadora de aprendizagem para uma turma de segundo período de Engenharia Química, da PUC/PR. Foi aplicada uma atividade utilizando-se de um PBL (Problem Basead Learning), aprendizagem baseada em problemas, com cinco temas diferentes, abordando três conteúdos distintos, que fazem parte da ementa da disciplina de Química Geral II. De posse da situação-problema, os estudantes desenvolveram meios de solucioná- lo, propondo e executando um método experimental, e ao final apresentaram os resultados em forma de seminário.

Palavras chaves

Metodologias Ativas; Ensino de Química ; PBL

Introdução

O processo de ensino-aprendizagem nas escolas brasileiras tem sido questionado nos últimos anos, principalmente por conta de estar predominantemente alicerçado a metodologias tradicionais, que fazem do aluno um mero expectador durante as aulas. Neste contexto, o conhecimento está centrado no professor, que o transmite para o estudante de uma forma fragmentada e pouco eficiente. Porém, o ensino promovido desta forma não dá a oportunidade do aluno participar ativamente de seu processo de aprendizagem, ficando numa posição passiva de recepção de conteúdos organizados e direcionados exclusivamente pelo professor. (ROSA et al., 2013). Buscando reverter esta realidade, tem-se buscado nos últimos anos uso de metodologias que ofereçam alternativas que invertam o foco do processo e permitam maior autonomia dos estudantes. Com este objetivo, a “Aprendizagem Baseada em Problemas” ou, do inglês, PBL (Problem Based Learning) consiste em uma metodologia de ensino que auxilia no desenvolvimento de habilidades importantes, como autonomia, postura investigativa e criticidade dos estudantes. (POZO, 1998). Segundo Delisle (2001), o processo consiste basicamente das seguintes fases: apresentação do problema e estratégia para resolvê-lo. Apresentação do problema: etapa iniciada com textos problematizadores ou um tema em voga na mídia, para originar posicionamento crítico, com duração de, em média, 2 horas aula, para que possa ser discutido de forma satisfatória. Estratégia para resolver o problema: fase que divide-se em 4 partes, como apresentado no Quadro 1: Quadro 1: Estratégias para resolver o problema - adaptado de Delisle (2001). O que você sabe sobre o assunto? Ideias para solucionar o problema O que preciso saber sobre o assunto? Plano de ação Listagem de todas as informações sobre a questão levantada. Nessa etapa se valoriza o conhecimento prévio dos estudantes. Aqui deverá haver um levantamento de conhecimentos que precisam ser adquiridos para solucionar o problema. - onde buscar as informações (livros, artigos, internet). - é necessário realizar análises? Quais? - analisar resultados Fonte: adaptado de Delisle (2001). De acordo com Lopes et al, (2011, p. 1276), o ciclo de aprendizagem pelo método PBL deve ser realimentado sempre que houver a necessidade e em qualquer etapa do processo. Escolher uma temática interessante ao perfil e faixa etária adequados é crucial para que a sensibilização e a pré- disposição para realizar a atividade ocorram a contento. A estratégia de PBL aplicada ao ensino de Química mostra um grande potencial para a promoção da aprendizagem de conteúdos considerados abstratos e complexos, quando inseridos em um contexto em que ajudarão o aluno a entender uma questão ligada a conhecimentos técnicos relacionados a situações observadas no seu cotidiano. Para Grasselli & Colasurdo (2012, p.7) alguns itens que estimulem o pensamento científico são de extrema importância para caracterizar um PBL no contexto de sala de aula: a. Limitação do problema: embora a abordagem seja ampla é necessário limitar ou focar o problema a fim de reunir estratégias de resolução; b. Formulação de hipóteses: a hipótese é um dos pilares da criação do pensamento científico, assim, várias hipóteses devem ser levantadas antes que sejam discutidas quais delas realmente merecem atenção e precisarão ser testadas, para se obter algumas respostas para o problema em questão; c. Organização das informações: e os dados (se houverem) do mais para menos relevante baseadas obviamente nas hipóteses levantadas; d. Questionamento dos resultados obtidos: confrontando os resultados com a coerência dos questionamentos levantados nas hipóteses, procurando olhar sob outros ângulos para confirmar as respostas obtidas, ou se será necessário reformular as hipóteses iniciais e consequentemente as estratégias adotadas. É importante destacar, entretanto, que o uso de uma nova metodologia não é garantia de sucesso na sua adoção em sala de aula, sendo o conhecimento formal e a mediação do professor variáveis essenciais para o seu êxito. O presente estudo visou avaliar a aplicação de PBL nas aulas práticas de Química para uma turma de 2º período do curso de Engenharia Química, da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.

Material e métodos

Para a realização desse trabalho, foi escolhida a turma de 2o período do Curso de Engenharia Química da PUC/PR Campus Curitiba. Essa turma possui trinta e seis alunos e foi escolhida por já ter cursado um semestre de química, tanto teórica quanto prática. No início do semestre letivo, foi proposto aos estudantes que se dividissem em equipes de no máximo 5 (cinco) discentes, onde foi distribuída uma situação problema para cada equipe. Foram cinco situações diferentes, cada uma delas abordando conteúdos dentro da área de química: CASO 1: “Casos de Câncer e Anencefalia Assutam Curitibanos”; CASO 2: “Explosão na Caldeira”; CASO 3: “AAS: Parece Inofencivo Mas Pode Matar”; CASO 4: “Solo Infértil Desafia Pesquisadores” e CASO 5: “Mineradora: Culpada ou Inocente?”. As denominações de cada caso, foram elaboradas de forma a despertar a curiosidade dos discentes. A partir desse momento, cada grupo, deveria identificar o problema, e após a validação do professor, foram, então, orientados, que, deveriam buscar na literatura, procedimentos laboratoriais para desenvolver sua proposta de pesquisa. Toda a pesquisa foi desenvolvida extraclasse e os alunos deveriam cumprir algumas etapas pré determinadas com prazos estipulados, que consistiram basicamente em: envio de uma proposta de trabalho, contendo todo material necessário, reagentes, vidrarias , equipamentos que seriam utilizados e a metodologia proposta. A execução do projeto ocorreu durante a aula prática com duração máxima de noventa minutos, a equipe que não atingiu seus objetivos, tiveram uma nova oportunidade prevista no calendário da disciplina. No dia da aula-teste, toda a parte de reagentes e vidrarias já estavam previamente separadas em cima da bancada, facilitando o trabalho. Na execução das atividades práticas, foi orientado aos alunos que registrassem todas as informações possíveis a fim de facilitar a a montagem dos slides para a apresentação dos resultados. Para as apresentações, foi disponibilizado pelo professor um roteiro contendo as rubricas com os critérios de correção, como um protocolo a ser seguido. A etapa de avaliação das apresentações baseou-se nos seguintes critérios: a qualidade dos slides apresentados, apresentação individual de cada estudante e ainda a pertinência das respostas diante dos questionamentos propostos. Ao final da atividade foi aplicado um questionário de avaliação, com quinze assertivas em escala de Likert com cinco níveis, que abrangeu três dimensões: afetividade, cognição e habilidade).Sendo: 1. Discordo totalmente; 2. Discordo em parte; 3. Não tenho opinião formada; 4. Concordo em parte; 5. Concordo totalmente Das dimensões citadas, a dimensão Afetividade está relacionada ao quanto o aluno se sentiu envolvido com a atividade proposta. A dimensão Cognitiva, refere- se ao processo de aquisição de conhecimento e a última dimensão a ser considerada diz respeito ao desenvolvimento de Habilidades, tanto para o trabalho em equipe quanto para comunicação

Resultado e discussão

Dos cinco estudos disponibilizados, foram abordados três conteúdos da área de Química Geral, a saber: estequiometria, titulometria de soluções, teorias ácido/base, além de desenvolvimento de habilidades laboratoriais. Percebeu-se que mesmo sendo solicitado desde o início para que se organizassem, no sentido de procurar uma maneira de resolver o caso e propor um roteiro prático, apenas poucos grupos demonstraram interesse em esclarecer dúvidas com antecedência, o que comprometeu a qualidade do trabalho de algumas equipes. Alguns grupos de alunos não obtiveram resultados satisfatórios na primeira aula- teste sendo necessário utilizar uma segunda aula para refazer o experimento. Fato marcante ocorrido foi que, durante todo o processo, nenhum grupo enviou dúvidas ao professor (via e-mail) ou mesmo procurou em horários alternativos para discussão do problema. Após a etapa de realização da parte experimental, iniciou a etapa de apresentação e discussão do projeto. Todos grupos cumpriram os requisitos solicitados quanto ao teor dos slides da apresentação, porém, algumas equipes não incluíram resultados importantes, como equações e cálculos que fundamentariam a elucidação da situação problema, mesmo sendo enfatizado durante as aulas e ser solicitado no roteiro disponibilizado ao aluno. Quanto às apresentações, no geral, foram de boa qualidade, uma vez que já apresentaram seminários da disciplina no período anterior. Após a explanação, algumas perguntas relacionadas ao trabalho, foram feitas aos estudantes a fim de analisar se houve uma verdadeira compreensão daquilo que executaram e ainda se foi absorvido o conceito químico envolvido, que seria o objetivo final do projeto aplicado. Os grupos que realmente se envolveram na resolução do problema, a resposta foi positiva com bons argumentos as perguntas feitas. Foi possível perceber, que os grupos que apresentaram o seminário de forma superficial, claramente não dedicaram tempo suficiente para analisar de forma criteriosa os resultados gerados, reforçando a cultura já enraizada dos estudantes em preparar trabalhos as vésperas dos prazos finais de apresentação ou entrega. Avaliação do PBL Na disciplina de Química Geral II, os estudantes eram avaliados apenas por provas teórico-práticas e relatórios técnicos. No entanto, com a inserção do projeto como uma proposta de aula, nesse bimestre, foi incluída a avaliação do projeto fez parte da composição de nota, contribuindo com 20% da média bimestral da disciplina. O critério de avaliação abrangeu tanto a parte do procedimento prático, incluindo postura em laboratório de acordo com as normas de segurança, envolvimento e planejamento dessa etapa (fluxograma do procedimento e fichas de solicitação de materiais e reagentes) e a apresentação do seminário. Destaca-se que durante as apresentações das equipes de seminário, cada grupo recebeu uma ficha avaliativa para que pudessem analisar as apresentações dos colegas, como por exemplo:“ Você entendeu a metodologia proposta pelo grupo para resolver o problema”, pontuações estas que vieram a compor a média final do seminário. Ao final da atividade foi aplicado um questionário com 6 questões, sendo duas delas tratando de dimensão afetiva ligadas ao projeto, duas de habilidade e duas de dimensão cognitiva, ao todo todos os 36 (trinta e seis) estudantes que participaram do projeto, responderam a pesquisa. Os resultados estão apresentados nos gráficos agrupado a seguir, na Figura 01, foram levantados os seguintes questionamentos: O projeto superou minhas expectativas; NÃO gostaria de continuar com esse estudo no segundo semestre; todos estes quesitos dentro da dimensão afetiva. Pode-se observar pela percepção dos alunos, com os questionamentos da dimensão afetiva, que náo houve uma polarização de respostas, haja visto que a estratégia já havia sido trabalhada no 1oP, porém, em menor proporção, quanto que para a segunda pergunta, apenas 30% dos alunos, náo manifestou interesse em continuar com o projeto durante sua vida acadêmica. Quanto a dimensão cognitiva, podemos observar na figura 2, que houve uma percepção clara dos alunos, que essa atividade contribuiu para que tivessem uma visão mais ampla da disciplina e não de maneira fragmentada o que é bastante comum entre os estudantes. Quanto a questão que versava sobre o reconhecimento de conceitos já vistos, foi nítido que a maioria absoluta, cerca de 93% dos alunos, conseguiram resgatar conceitos importantes para elucidar o problema proposto. Da a última dimensão avaliada, que trata da percepção dos alunos, quanto as habilidades adquiridas, percebeu-se que 73% dos estudantes assumiram terem melhorado sua capacidade de comunicação, haja vista, que a etapa de apresentação e arguição, era individual e avaliativa. Embora a pergunta tenha sido muito ampla, pois essa capacidade envolve vários níveis de aprofundamento o que será adquirido e aperfeiçoado ao longo da sua vida acadêmica e profissional, houve uma percepção dos alunos em relação a sistemática de resolução de problemas dessa natureza .

Conclusões

A adoção de um método diferente para as aulas, baseado nos conceitos de aprendizagem ativa, em que o estudante precisa ser protagonista na construção do seu conhecimento, apresentou bons resultados tanto na percepção dos alunos quanto dos professores que aplicaram a metodologia. Tal estratégia apresentou-se como um método inovador para as aulas de Química Geral no Ensino Superior, com resultados satisfatórios. Foi possível ainda, despertar nos estudantes certa autonomia na busca do conhecimento e uma introdução de como se é construído uma metodologia para resolução de problemas científicos. Ainda há muito a ser aprimorado, mas o fundamental é iniciar uma nova maneira de ensinar e uma nova forma de aprender, envolvendo muito mais os estudantes e descentralizando o conhecimento da figura do professor, na busca constante em melhorar a qualidade do ensino.

Agradecimentos

Os autores agradecem a Pontifícia Universidade Católica do Paraná pela oportunidade de realização do projeto.

Referências

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DELISLE, R. Como realizar a aprendizagem baseada em problemas, 1ª ed, ed. ASA: Lisboa, 2001.

GRASSELLI, M. C.; COLASURDO, V. Reacciones químicas: un enfoque integrado. Como se experimenta, 2001.

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ROSA, M. F. da; Silva, P. S. da; Galvan, F. De B.; Ciência Forense no Ensino de Química por Meio da Experimentação, Química Nova na Escola, Vol. 37, N° 1, p. 35-43, 2015.