Autores

Gonçalves, A.C.S. (UFRJ) ; Rocha, A.S. (UERJ) ; Sousa, C. (UFRJ) ; Martinhon, P.T. (UFRJ)

Resumo

Esse trabalho é fruto de debates sobre a realidade escolar, não só diretamente, por meio dos resultados de pesquisas do PISA 2015, mas também indiretamente, pelas diretrizes sugeridas pelo PCN. Ambos preveem o desenvolvimento de habilidades e competências, tanto discentes quanto docentes. Os argumentos que nutriram essas rodas de conversas dialogaram com referenciais teóricos epistemológicos previamente escolhidos. Em suma, trata-se de um relato de experiência discente-docente, de natureza qualitativa, com delineamento bibliográfico, que, a partir de uma temática específica, no caso o ensino de química, buscou uma contextualização político-econômica para embasar o processo de empoderamento de competências e habilidades docentes, não somente aquelas que o PCN orienta.

Palavras chaves

PISA; PCN; Empoderamento Discente

Introdução

Atualmente o Brasil possui muitas escolas, porém como se observa, quantidade não é sinônimo de qualidade. As escolas não estão devidamente estruturadas de modo a fornecer aos alunos um ensino de qualidade. Os problemas começam nas primeiras séries do Ensino Básico e se propagam até o Ensino Superior. No ensino de química, como qualquer campo das ciências naturais, há um consenso entre os docentes de que é importante ir além de conceitos e definições puramente expositivas. Nesse viés, a química - assim como tantas outras disciplinas - deve ser direcionada como forma de educar para a vida (SANTOS & SCHNETZLER, 2003). Até por que, a educação sempre foi um caminho de formação e transformação da sociedade. Para isso, se vislumbra um ensino que contribua realmente na formação do cidadão ativo, consciente de seus deveres e de sua responsabilidade social, características e qualidades que estão enquadrados nas recomendações tanto do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA - do inglês, Programme for International Student Assessment), quanto dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Contudo, afim de se alcançar o letramento científico, surge a necessidade de contextualizar o estudo das ciências naturais, buscando uma reflexão do papel do homem na sociedade e sua interação com o meio. De acordo com Dewey, filósofo norte-americano, a escola deveria proporcionar práticas conjuntas e promover situações de cooperação, em vez de lidar com o aluno de forma isolada. Dewey insistia na necessidade de se estreitar a relação entre teoria e prática, principalmente se estivessem relacionadas ao cotidiano, pois ele acreditava que as hipóteses teóricas só tinham sentido no dia a dia. Seus trabalhos sobre educação tinham por finalidade, sobretudo, estudar as consequências da instrumentalização pedagógica e sua validação mediante a experimentação. No concernente à educação, o Brasil tem adotado e participado do PISA, que é coordenado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP). Segundo esse instituto, a avaliação do PISA tem o objetivo de produzir indicadores que contribuam para a discussão da qualidade da educação nos países participantes, de modo a subsidiar políticas de melhoria do ensino básico. Assim, essa avaliação procura verificar até que ponto as escolas de cada país partícipe estão preparando seus jovens para exercer o papel de cidadãos na sociedade contemporânea. Mas como alcançar os objetivos previstos tanto no PISA, quanto no PCN? Como promover isso nas escolas? A quem docentes e discentes devem/podem recorrer? As avaliações do PISA acontecem a cada três anos e abrangem três áreas do conhecimento havendo, a cada edição do programa, maior ênfase em cada uma dessas áreas. Em 2000, o foco foi em leitura; em 2003, matemática; e em 2006, ciências. O PISA 2009 iniciou um novo ciclo do programa, com a ênfase novamente recaindo sobre o domínio da leitura; em 2012, o foco em matemática; e em 2015, novamente em ciências. Esse programa não só estabelece o que os alunos podem reproduzir a respeito do conhecimento, mas também examina quão bem eles podem extrapolar o que têm apreendido e aplicar o conhecimento em situações não familiares, no contexto escolar ou não. Essa perspectiva reflete o fato de economias modernas valorizarem indivíduos não pelo que sabem, mas pelo que podem fazer com o que sabem (OCDE,2016). Devido a isso, é necessário que as escolas desenvolvam uma prática contextualizada. Além de observar as competências dos estudantes em leitura, matemática e ciências, o PISA coleta informações para a elaboração de indicadores contextuais, os quais possibilitam relacionar o desempenho dos alunos a variáveis demográficas, socioeconômicas e educacionais. Essas informações são coletadas por meio da aplicação de questionários específicos aos alunos, aos professores e aos dirigentes das escolas (BRASIL/INEP, 2015). A análise exploratória do desempenho dos estudantes brasileiros nos inúmeros itens desse relatório visa a fornecer aos gestores, aos professores e à sociedade uma ferramenta que contribua para o entendimento mais aprofundado sobre o PISA no contexto do Brasil. Em 2015, o foco da avaliação do PISA foi na área de ciências da natureza, com o objetivo de mensurar o letramento científico. Para tal, desde 2006 utiliza-se uma escala de proficiência desenvolvida pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) (MASSUNAGA et al., 2015). Em 2016, o INEP, em parceria com o Ministério da Educação (MEC) e com a Diretoria de Avaliação Básica (DAEB), divulgou o Sumário Executivo Brasil no PISA 2015 (BRASIL/ INEP, 2016). Para fins da avaliação, o letramento científico no PISA 2015 foi constituído de quatro componentes envolvendo contextos; competências; atitudes e conhecimento. Sem dúvida a teoria é bem interessante, mas quais seriam os possíveis interesses políticos e econômicos por trás de uma importação de índices e critérios normativos de avaliação?

Material e métodos

O trabalho consiste em um relato de experiência vivenciado durante a disciplina eletiva Métodos Eletroquímicos, oferecida aos graduandos em Química, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Por ser uma disciplina eletiva, a diversidade dos inscritos é significativa. Estes podem ser alunos de química com atribuição tecnológica (QAT), bacharelado e licenciatura, tanto da modalidade presencial, quanto da modalidade semipresencial. Apesar das discrepâncias individuais dos objetivos frente aos diferentes sujeitos - ora no papel de coordenador, ora no de colaborador - e das limitações técnicas encontradas, a inclusão de diferentes perfis agregou aptidões subjetivas, entre as quais o relato de experiência aqui apresentado. A metodologia pedagógica utilizada foi argumentativa, na qual o professor responsável pela turma, após o mapeamento dos interesses pessoais, dos conhecimentos prévios e das expectativas de cada aluno, assumiu o papel de facilitador e intermediador transdisciplinar do projeto tema. Para tal, no decorrer da disciplina foram aplicados questionários abertos e fechados. Todos os resultados foram analisados e cuidadosamente discutidos durante as aulas teóricas e experimentais, até o momento em que a equipe atingia um consenso. A ideia central consistia em que o aluno conseguisse expor seu ponto de vista, defender sua percepção e questionar sempre que discordasse de um dos colaboradores/coordenador. Entre as atividades desenvolvidas estão as rodas de conversa, cujo intuito foi o de construir condições favoráveis para o desenvolvimento do senso crítico e reflexivo dos discentes, contribuindo para a formação de um profissional, não apenas voltado para os aspectos técnicos e tecnológicos da disciplina, mas, sobretudo, para o contexto social e político. Este contexto interfere e interage fortemente com os problemas da sociedade em que está inserido, como é o caso da crescente importação de índices avaliativos.

Resultado e discussão

Considerado um país emergente e em desenvolvimento, o Brasil está abaixo dos padrões de ensino se comparados a outros países em desenvolvimento. Ou seja, apesar de ser a sexta maior economia do mundo, o ensino brasileiro ainda não está dentro dos padrões aceitáveis pelas organizações internacionais. As opiniões dos especialistas da área são semelhantes, existe um consenso geral que, para melhorar o ensino, é necessário aprimorar a qualidade das escolas e dos professores, bem como aumentar o fluxo escolar, uma vez que muitos alunos matriculados no ensino médio abandonam a escola. Em suma, as pesquisas feitas na área de ensino, durante este período em que o país tem apresentado um crescimento econômico, mostram que a educação no Brasil progrediu, contudo ainda será necessário um grande esforço e investimento para se alcançar padrões mundiais aceitáveis (GAMA, 2014, p. 22). Ao avaliar os relatórios do PISA, é possível notar a semelhança das competências descritas e apresentadas nos parâmetros curriculares nacionais, como também em outras formas de avaliações, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) e o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE). Deste modo fica explícita a tentativa do governo brasileiro de adequar-se às demandas internacionais relacionadas ao aprendizado. A defasagem no ensino de química e das outras ciências da natureza vem sendo analisada há bastante tempo. E, de fato, não é de hoje que o Brasil adota indicadores internacionais para nortear suas Políticas Públicas (PEREIRA, 2016), como o PISA. Apesar do progresso que teve até 2012, edição em que foram considerados 65 países, o Brasil ocupou o 55° lugar no teste de leitura e o 58° nos testes de matemática e ciências, o que pontua o baixo desempenho do país nesse tipo de avaliação (GAMA, 2014, p. 24). Além disso, os avanços observados até 2012 provavelmente não se deram pela melhora na escola, mas porque nesse período o país sofreu um crescimento como um todo, e isso se refletiu na educação. Considerando que a educação é a base de toda sociedade, a pergunta que fazemos é, como poderemos formar bons profissionais sem uma educação adequada, sejam estes professores, médicos, advogados, cientistas, entre outros? Os resultados do PISA ainda apontam que, os países que investiram na formação do docente em serviço, e que aumentaram seus índices de alfabetização científica em até 12%, sendo uma delas a formação docente continuada, reverteram esse quadro (RATIER, 2008). Um exemplo é o Reino Unido, que conseguiu aumentar em 12% o índice de alfabetização ao investir de forma significativa na formação do docente. Tal fato nos remete a questionar sobre o reflexo, causas e consequências desses indicadores no papel discente-docente, e a indagar se a atuação do professor pode ter uma ação determinante frente aos resultados de tais avaliações. Outro ponto importante são as condições das escolas públicas brasileiras, que não têm infraestrutura para fornecer aos alunos laboratórios dignos, item exigido pelo PISA. Para que o aluno tenha conhecimento adequado dos fenômenos, é necessário que o mesmo tenha um ambiente para experimentação à sua disposição. A tentativa de professores de reproduzir alguns experimentos em sala de aula é, muitas vezes, suprimida, devido ao cronograma restritivo pela grande quantidade de conteúdo que deve ser dada. Pesquisas revelam que mesmo o conhecimento rudimentar experimental pode contribuir para o processo de letramento científico. Evidencia também, a quase obrigatoriedade de que as pesquisas realizadas no ambiente universitário se tornem mais acessíveis, de forma a alcançar a população. Além de tudo o que já foi discutido, as avaliações discentes sobre os docentes sugerem a necessidade de que os pesquisadores/professores tenham habilidades e competências capazes de ensinar conceitos científicos de maneira didática e divertida. Segundo os mesmos, a grande maioria dos professores universitários não possuem tais competências. Evidentemente muitos fatores contribuem para o distanciamento e o pavor do aluno, no que concerne ao aprendizado de química dentre outras ciências exatas, que enfatizam a ineficiência do sistema de ensino. Em primeiro lugar, faz-se necessário combater o senso comum de que as ciências exatas - química, física e matemática - são disciplinas difíceis. Além disso, existem também problemas sociais, políticos, econômicos e culturais, que precisam ser pontuados e incorporados. Trabalhar em uma perspectiva interdisciplinar pode fazer parte do domínio de possibilidades, a priori, viáveis. Contudo, desenvolver a interdisciplinaridade não é algo trivial e envolve a colaboração de diversos professores (GONÇALVES, 2016).

Conclusões

Apesar de toda a disponibilidade e facilidade no acesso à informação, não é factível que todos alcancem o mesmo nível de conhecimento. O desempenho dos estudantes brasileiros torna explícito que é necessário mudar a forma como o ensino vem sendo ministrado, o método de ensinar “depósito-bancário” não está sendo eficiente, ele prima por um ensino conservador e enciclopédico, em que o aluno recebe as informações via professor como verdades absolutas, suprimindo assim a importância de mostrar a ciência como uma construção humana, evidenciando o seu caráter dinâmico, e deixar evidente que como uma construção do homem a ciência está sempre evoluindo. Assim, o modo como se deve trabalhar com os graduandos de licenciatura em química deve ser diferenciado. É necessário utilizar métodos de ensino-aprendizagem ao se ministrar os conteúdos de química no Ensino Superior, pois essa ação poderá consolidar e propagar o conhecimento discente-docente. Sendo assim, o futuro docente precisa aprender como organizar seu conhecimento. Ele deve não só ter a capacidade de desenvolver e fazer bem as tarefas, mas principalmente a de propor e criar novas soluções para as possíveis situações-problema. Em suma, de avaliar o mundo de maneira crítica, ter conhecimentos dos seus deveres e direitos como cidadão.

Agradecimentos

Ao GIEESAA.

Referências

GAMA, Victor Azambuja. Os efeitos da qualidade da educação sobre a acumulação de capital humano e o crescimento econômico no Brasil. 2014. Tese de Doutorado. Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz.

GONÇALVES, Ana Carolina Silva. O PAPEL DA EXPERIENCIAÇÃO NO ENSINO DE ELETROQUÍMICA: contexto e reflexões sobre a prática docente de uma licencianda em química. Rio de Janeiro, 2016. Trabalho de Conclusão de Curso (Licenciatura em Química) – Instituto de Química, Universidade Federal do Rio de janeiro, 2016.

MASSUNAGA, Marcelo Shoey de Oliveira; RUBINI, Gustavo; BARROSO, Marta Feijó. O resultado do Brasil nos itens de ciências do PISA. Reuniões da ABAVE, n. 8, p. 503-504, 2015.

PEREIRA, Gisele Adriana Maciel. O PISA como parâmetro de qualidade para as políticas educacionais no Brasil e na Espanha: pressupostos epistemológicos. 2016.

RATIER, Rodrigo. O caminho para a qualidade. Revista Nova Escola. 20 ed., setembro 2008.

SANTOS, Wildson L. P.; SCHNETZLER, Roseli P. Educação em Química: compromisso com a cidadania. 3ª. ed. 144 p. Ijuí (RS): Unijuí – (2003).