Autores

Melo, J.O.M. (UEPA) ; Silva, M.D.B. (UEPA)

Resumo

De modo geral, o Ensino de Química é pautado na transmissão de conteúdo, sem se ater a discussões de aspectos sociais relevantes. Nesse cenário, a promoção de diálogos entre as relações étnico-raciais e o Ensino de Química possibilita a implementação de uma educação de saberes múltiplos e que vise superar as injustiças raciais. Desse modo, o presente trabalho teve como objetivo investigar os desafios e possibilidades referentes à inserção de relações étnico-culturais no ensino de Química. Para tanto, realizou-se uma revisão bibliográfica de artigos publicados nos anos de 2020 e 2021, que tratam sobre o tema. Com isso, observou-se a existência de possibilidades para um ensino plural, ao passo em que também foram diagnosticadas grandes dificuldades no processo.

Palavras chaves

Questões Étnico-Raciais; Ensino de Química; Diversidade e Inclusão

Introdução

Durante o percurso histórico do conhecimento científico, o continente europeu foi reconhecido como o berço da Ciência, tendo sido negadas as contribuições de povos ancestrais – a exemplo dos saberes produzidos no continente africano. Dessa forma, consolidou-se uma Ciência associada a imagem de sujeitos sociais hegemônicos, em detrimento da figura de todos os situados fora desse padrão (SILVA; PINHEIRO, 2019). Kato e Felicio (2019) apontam que a disciplina de Química é tradicionalmente pautada na transmissão de conteúdos próprios, excluindo discussões de aspectos sociais importantes para a implementação de uma educação que vise superar as injustiças raciais. Em contrapartida, os autores pontuam a importância da promulgação da lei nº 10.639/2003, que torna obrigatório o trabalho com o Ensino de História e Afro-Brasileira e Africana na educação básica, bem como o Parecer CNE/CP nº 03/2004, que estabeleceu as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Desse modo, os documentos oficiais citados representaram um avanço na legislação e na democracia. Nesse sentido, é de fundamental importância a realização de diálogos entre o processo de ensino-aprendizagem e as relações étnico-raciais, buscando promover uma educação de saberes múltiplos e diversos. Assim, o presente trabalho teve como objetivo investigar os desafios e possibilidades referentes à inserção de relações étnico-culturais no ensino de Química, como forma de garantir um ensino pautado na contextualização e no diálogo.

Material e métodos

A presente pesquisa consistiu em uma revisão bibliográfica, a qual Gil (2001) define como uma pesquisa baseada em material já redigido. Assim, os procedimentos metodológicos foram realizados em dois momentos. No primeiro momento, pesquisou-se trabalhos que versam sobre a utilização das Relações Étnico-Raciais no Ensino de Química. Para tanto, recorreu-se à plataforma de busca Google Acadêmico, utilizando operadores booleanos entre os termos “´relações étnico-raciais”, “questões étnico-raciais” e “ensino de química”, delimitando o período entre 2020 e 2021. Além disso, selecionou-se apenas artigos publicados em periódicos, totalizando 26 trabalhos publicados. No segundo momento, realizou-se a leitura dos resumos e palavras-chaves dos trabalhos, selecionando-se as pesquisas que foram desenvolvidas no âmbito da educação básica, resultando em um total de 3 trabalhos. As informações dos textos selecionados podem ser encontradas na tabela 1. Por fim, realizou-se a leitura completa dos textos, analisando especialmente as metodologias empregadas e os resultados obtidos.

Resultado e discussão

Mediante os dados analisados, observou-se possibilidades e dificuldades no que se refere a inserção de questões étnico-culturais no ensino de Química. No artigo A, os autores elaboraram uma estratégia de ensino guiada por contribuições epistêmicas africanas e afro-brasileiras, refletindo sobre a produção de sabão de cinzas, muito utilizado em religiões de matriz africana. Ademais, a mediação docente visou a desconstrução de preconceitos referentes a essas religiões, além de apresentar contribuições de povos africanos e afro-brasileiros para o campo experimental da química. Contudo, também se verificou a prevalência de preconceitos religiosos, mesmo após a execução das atividades. No artigo B, analisou-se três parâmetros: primeiramente, o currículo de química da escola participante, observando a inexistência de uma educação preocupada com as relações étnico-raciais; posteriormente, as aulas e concepções de um professor de química, o qual não abordou as questões étnico-raciais em nenhum momento, além de afirmar que esse papel não é da química, mas sim das ciências humanas; por fim, analisou-se as experiências de alunos quanto as relações étnico-raciais, verificando a inexistência desse tipo de abordagem na disciplina de química. Os autores do artigo C elaboraram uma proposta de ensino a partir da feijoada, um prato típico do Brasil e com origem africana. Nesse sentido, buscou-se discutir sobre as contribuições dos povos africanos à nossa alimentação, sendo essa um produto social e cultural, à medida em que foram explorados os conteúdos de Química. O trabalho em questão promoveu a apresentação de um ensino de Química que contempla a diversidade do saber, possibilitando a apresentação de povos invisibilizados na sociedade como agentes do conhecimento científico.

Tabela 1



Conclusões

Diante do exposto, é possível afirmar que a utilização das relações étnico- raciais no ensino de Química apresenta importantes contribuições, como a desconstrução de preconceitos, a promoção de visibilidade a povos historicamente excluídos do conhecimento científico e a reflexão acerca de questões importantes para a busca por uma educação que possibilite os múltiplos saberes étnicos, culturais e sociais. Contudo, muitas são as dificuldades vivenciadas, especialmente em razão da ausência ou baixa frequência dessas ações em sala de aula.

Agradecimentos

Referências

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